Constituição ferida

OAB reprova grampo em escritório de advocacia autorizado por Moro

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18 de março de 2016, 11h45

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil classificou como inadmissível a violação da comunicação entre advogado e cliente e ressaltou que o combate à corrupção não pode ferir a Constituição. Reportagem da revista eletrônica Consultor Jurídico revelou nesta quinta-feira (17/3) que o juiz Sergio Moro autorizou o grampo de 25 advogados do escritório que atende ex-presidente Lula. 

A banca Teixeira, Martins e Advogados teve seu telefone central interceptado e conversas dos advogados com mais de 300 clientes foram violadas. “É inadmissível no Estado Democrático de Direito a violação das ligações telefônicas entre advogados e clientes”, afirmou ainda na quinta à noite o presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia.

Ele destaca que a gravação de advogados e clientes, mesmo com autorização judicial, sem que os profissionais estejam sendo investigados, fere prerrogativa garantida pela Lei 8.906 de 1994, o Estatuto da Advocacia.

“A Ordem quer combater a impunidade e a corrupção. Defendemos a celeridade processual e o levantamento de sigilo destes processos em nome de um princípio maior, que é o da informação, mas não podemos permitir que isso seja feito ferindo a Constituição Federal”, ressaltou Lamachia.

O presidente afirmou que a Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas está à disposição de todos os profissionais que tenham sido feridos em suas prerrogativas e atuará prontamente na garantia dos direitos da advocacia e da sociedade.

Ação das seccionais
Os advogados Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins pediram que as seccionais de São Paulo e do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil tomem “todas as providências cabíveis em relação a esse grave atentado ao Estado Democrático de Direito”.

O presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, deferiu o pedido e determinou que sejam tomadas as “medidas necessárias para proteção e defesa das prerrogativas dos advogados”. O processo já foi autuado. Para o presidente da Comissão de Prerrogativas da entidade, Cid Vieira, é preciso tomar medidas enérgicas para que o Estado Democrático de Direito continue inabalável.

A OAB-RJ também manifestou seu repúdio à decisão de Sergio Moro que autorizou as escutas do escritório. “Tal expediente, além de violar frontal e inequivocamente prerrogativa do advogado acerca da inviolabilidade telefônica quando inerente ao exercício da advocacia (artigo 7º, inciso II, da Lei 8.906/94), atenta gravemente contra as bases do Estado Democrático de Direito”.

Dissimulação pelo grampo
Segundo reportagem da ConJur, a interceptação do número do escritório foi conseguida com uma dissimulação do Ministério Público Federal. No pedido de quebra de sigilo de telefones ligados a Lula, os procuradores da República incluíram o número do Teixeira, Martins e Advogados como se fosse da Lils Palestras, Eventos e Publicações, empresa de palestras do ex-presidente.

E Moro autorizou essa escuta por entender que ela poderia “melhor esclarecer a relação do ex-Presidente com as empreiteiras [Odebrecht e OAS] e os motivos da aparente ocultação de patrimônio e dos benefícios custeados pelas empreiteiras em relação aos dois imóveis [o triplex no Guarujá (SP) e o sítio em Atibaia (SP)]”.

Sete dias depois de autorizar o grampo no escritório, o juiz da operação “lava jato” acrescentou ao grupo dos aparelhos monitorados o celular de Roberto Teixeira, conhecido por defender o líder do PT desde os anos 1980. “Não identifiquei com clareza relação cliente/advogado a ser preservada entre o ex-presidente e referida pessoa [Roberto Teixeira]”, diz Moro, em seu despacho.

Nota não aponta distorção
O Ministério Público Federal divulgou nota contestando a reportagem da ConJur. Em resposta, os integrantes do MPF explicaram que cometeram o erro por se ter baseado na informação de um site privado, o FoneEmpresas.com, onde o número do escritório consta como sendo da Lils. A versão foi publicada na reportagem.

A ConJur checou que qualquer busca no Google com o número de telefone indicado trazia como resultado o escritório Teixeira, Martins. A redação também ligou para o número e ouviu a gravação que começa com a seguinte frase: “Você ligou para Teixeira, Martins e Advogados”. Durante a interceptação por pelo menos 30 dias, os investigadores parecem não ter percebido o engano.

Depois que a notícia já estava no ar, com a íntegra da resposta enviada pela assessoria da imprensa da Procuradoria da República no Estado do Paraná, a redação recebeu uma “nota à imprensa”, disparada pelos procuradores que se apelidam de “força tarefa”, acusando a ConJur de ter distorcido os fatos e de “criar factoides”. 

A nota do MPF, no entanto, não aponta em nenhum momento qual seria a distorção e repete tudo o que já foi publicado na notícia que mostra como as conversas de 25 advogados (além de empregados da banca) com pelo menos 300 clientes — que não eram investigados na “lava jato” — foram grampeadas a pedido do MPF.

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