Quebra de decoro

Celso de Mello nega pedido de Delcídio para suspender processo de cassação

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16 de março de 2016, 9h53

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, negou na madrugada desta quarta-feira (16/3), o pedido de liminar feito pelo senador Delcídio do Amaral para suspender o curso de representação para abertura de procedimento disciplinar contra ele no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado. O Conselho de Ética deve analisar nesta quarta-feira (16/3) se abre o processo de cassação do senador.

De acordo com o ministro, é pacífico o entendimento no Supremo Tribunal Federal que a interpretação e aplicação de normas regimentais, no caso o Regimento Interno do Senado Federal e o Regimento Interno do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, constituem matéria de interesse interno, sendo vedada a sua apreciação pelo Judiciário.

A representação contra Delcídio do Amaral foi protocolada pelo Partido Popular Socialista (PPS) e pela Rede Sustentabilidade, “a fim de apurar suposta quebra de decoro parlamentar, pretensamente praticada pelo ora impetrante”. O pedido foi feito dias depois de o senador Delcídio ter sido preso acusado de atrapalhar as investigações da operação "lava jato", que apura um esquema de corrupção na Petrobras.

No Mandado de Segurança impetrado no Supremo Tribunal Federal nesta segunda-feira (14/3), Delcídio afirma que vem sofrendo constrangimento ilegal pelos procedimentos adotados no âmbito do Conselho de Ética. O pedido do senador é baseado em três argumentos principais.

Leitura do relatório
O primeiro trata da decisão do presidente do Conselho de Ética do Senado, de negar o pedido dos advogados de Delcídio, para a suspensão da leitura do relatório prévio de admissibilidade de representação antes da análise da Comissão de Constituição e Justiça, que teria o prazo regimental de 15 dias úteis para a emissão de parecer.

Segundo a petição inicial, a representação não poderia ser aceita no Conselho de Ética e deveria ter sido convertida em diligência e encaminhada à CCJ, por envolver matéria constitucional — no caso, a contestação de provas relacionadas a escutas ambientais clandestinas que tornariam a representação inconstitucional.

Ao analisar a fundamentação do presidente do Conselho de Ética para negar o pedido, o ministro Celso de Mello entendeu que a decisão se deu com base em interpretação do Regimento Interno do Senado e do próprio Conselho de Ética, o que impede a análise por parte do Judiciário.

Em sua decisão, o ministro fez questão de ressaltar que o Supremo Tribunal Federal pode interferir em atos da Câmara e do Senado quando estes apresentarem desvios constitucionais, mesmo quando surgidos no contexto de processos políticos. "Nenhum Poder da República tem legitimidade para desrespeitar a Constituição ou para ferir direitos públicos e privados de seus cidadãos", afirmou.

No entanto, segundo o ministro, neste caso específico o ato foi praticado dentro dos limites de competência e apoiado em fundamentos exclusivamente regimentais, sem qualquer conotação de índole jurídico-constitucional, o que impede a análise pelo Judiciário.

"Não custa enfatizar, a interpretação incidente sobre normas de índole meramente regimental, por qualificar-se como típica matéria interna corporis, suscita questão que se deve resolver, exclusivamente, no âmbito do Poder Legislativo, sendo vedada sua apreciação pelo Judiciário”, explicou o ministro.

Declarações à imprensa
No segundo motivo apresentado no Mandado de Segurança, Delcídio questiona o fato de o relator da representação no Conselho de Ética, senador Telmário Mota (PDT-RR), ter feito declarações à imprensa, pelas quais, segundo alega, teria deixado “transparecer indisfarçável predisposição condenatória, além de um juízo de (des)valor sobre” o parlamentar.

Para o ministro Celso de Mello, o fundamento também não é plausível. O ministro aponta que o próprio Regimento Interno do Senado Federal somente prevê uma única hipótese de suspeição de Senador, estabelecendo, a esse respeito, em seu artigo 306, que a incompatibilidade desse integrante do Senado para votar dar-se-á “quando se tratar de assunto em que tenha interesse pessoal”.

O ministro destacou que nos procedimentos parlamentares de cassação de mandatos eletivos, inclusive do próprio presidente da República, não se aplica as regras de impedimento/suspeição previstas na legislação processual. Segundo o ministro, esse entendimento foi recentemente reafirmado em dois casos analisados pelo Supremo: na ADPF 378, na qual a corte discute o rito do impeachment, e no MS 34.037, que analisa o processo disciplinar contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.

Licença médica
A terceira razão pela qual a defesa de Delcídio pediu a suspensão do curso da representação no Conselho de Ética é o fato de senador estar sob licença médica. “Tal condição impede que ele possa ser julgado, implicando o necessário sobrestamento do feito”, afirma na ação, por considerar que o parlamentar não tem como se defender plenamente e exercer plenamente o direito ao contraditório. 

Para o ministro Celso de Mello, o senador também não tem razão quanto a este argumento. Para o ministro, a licença para tratamento de saúde não impediu o senador de exercer, ainda que na fase introdutória do procedimento instaurado perante o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, o direito de defesa, "mesmo porque não se lhe exigiu, até o presente momento, o comparecimento perante aquele órgão do Senado da República, circunstância que afasta qualquer alegação de ofensa ao seu direito de presença".

Processo de cassação
Na tarde desta quarta-feira (16/3), o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar se reunirá para votar o relatório preliminar do senador Telmário Mota (PDT-RR).

Na semana anterior, o relator apresentou o documento, que aprova a abertura de processo de perda de mandato contra o senador Delcídio no Conselho de Ética. Telmário viu indícios suficientes para a cassação de Delcídio, por quebra de decoro e abuso das prerrogativas parlamentares. O relatório preliminar será apreciado em votação nominal e aberta.

Caso seja acolhida a abertura de processo, o Conselho poderá determinar diligências, depoimentos de testemunhas, inclusive do representado, e qualquer outra instrução probatória. Não há prazo definido para que isso ocorra, o andamento ficará por conta do próprio colegiado. Depois, o parecer final do relator tem de ser votado pelo Conselho.

Se aprovado, esse parecer é depois enviado à CCJ, para exame dos aspectos constitucional, legal e jurídico, o que deve ser feito no prazo de cinco sessões ordinárias. Depois de admitido pela CCJ, o parecer será encaminhado para votação no Plenário do Senado, onde a votação também será aberta e nominal. A cassação do mandato só ocorrerá se houver apoio da maioria absoluta dos senadores, ou seja, pelo menos 41 votos. Todavia, tanto o Conselho quanto a CCJ podem recomendar o arquivamento da representação.

Clique aqui para ler a decisão
MS 34.064

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