Exceção à regra

Para STF, foro especial nem sempre é automático quando réu assume cargo

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14 de março de 2016, 7h19

O Supremo Tribunal Federal costuma deslocar a competência de processos a partir do momento em que investigados ou réus assumem cargo com foro por prerrogativa de função — a jurisprudência é comum nos casos de prefeitos e parlamentares, ainda sem precedentes sobre ministros que tenham sido denunciados, como seria a situação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se fosse em frente medida em análise no Palácio do Planalto.

A corte, porém, pode abrir exceção se constatar fraude processual, como já fez no sentido inverso. Embora geralmente transfira o processo para tribunais locais quando a autoridade com prerrogativa de foro renuncia, houve exceção no caso do ex-deputado federal Natan Donadon (sem partido-RO), em 2010.

Na ocasião, o Supremo considerou que ele tentou cometer fraude processual ao renunciar ao mandato na véspera do julgamento. Assim, os ministros decidiram julgá-lo assim mesmo.

O desembargador federal aposentado Vladimir Passos de Freitas afirma, em sua coluna na revista eletrônica Consultor Jurídico, que é preciso verificar se a finalidade da nomeação foi deturpada para atingir objetivo diverso do simulado. Se isso for constatado, o ato administrativo pode ser considerado nulo, aponta.

Além disso, os ministros já consideraram que a mera posse não torna a transferência simplesmente automática. Em 2014, o STF decidiu não ser competente para ficar com recurso do ex-deputado federal Valdivino José de Oliveira (PSDB-DF), pois quando ele entrou na Câmara o julgamento já havia começado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, adiado por pedido de vista.

O desembargador revisor apresentou seu voto dois dias depois da posse. Mesmo assim, Oliveira foi condenado a 4 anos, 10 meses e 10 dias de prisão por irregularidades em ordenamentos de despesas quando foi secretário distrital da Fazenda, no governo Joaquim Roriz.

A defesa considerava a decisão nula, já que no intervalo entre os votos o cliente virou deputado. Porém, o relator do caso no STF, ministro Luís Roberto Barroso, disse que “julgamento é ato uno” e, “fixada a competência de um órgão colegiado pelo início do julgamento, eventual alteração fática no que se refere à perda do foro por prerrogativa de função não conduz ao deslocamento do processo, tendo em vista a natureza unitária do acórdão”.

Barroso apontou ainda que Oliveira não exercia mais mandato parlamentar em 2014. Assim, o ministro entendeu que de qualquer maneira não caberia ao Supremo ficar responsável pela ação penal.

A tese venceu por maioria de votos. Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que concediam Habeas Corpus de ofício para anular o julgamento em sua totalidade. Para eles, a diplomação de Valdivino no cargo de deputado federal não poderia ser ignorada, ainda que ele não estivesse mais na Câmara, com base no princípio de que o juiz natural é absoluto.

Parâmetros
Barroso já propôs um critério objetivo sobre o deslocamento de competência: ele sugeriu que, uma vez recebida a denúncia, o processo continuaria com o Supremo mesmo se a autoridade renunciasse depois.

Os ministros discutiram parâmetros em 2014, quando enviaram à Justiça de Minas Gerais processo sobre o ex-deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB), no chamado “mensalão mineiro”. No entanto, como não houve entendimento sobre outros marcos temporais, a corte deixou a definição “para outra oportunidade”, que até agora não chegou.

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