Solução da crise está distante da busca pelo aumento da carga tributária
3 de março de 2016, 6h06
Já é pública a crise econômica que enfrenta nosso país nos últimos tempos. Tal fato nos leva a discutir a sustentabilidade do Estado Fiscal.
Isto porque, ao se falar em Estado Fiscal, nada mais estamos a dizer do que a dependência deste para sua manutenção — e naturalmente para continuidade de uma sociedade civilizada — dos tributos. Como afirma Casalta Nabais “Falar de Estado Fiscal é falar de impostos”. Aliás, já dizia Benjamin Franklin que “neste mundo nada está garantido senão a morte e os impostos”.
Com a crise econômica de um lado, gerando uma menor arrecadação de tributos, principal fonte de receita do Estado; de outra parte, o alto custo para o desempenho das atribuições estatais, principalmente, com o surgimento da Constituição brasileira de 1988, que estabeleceu um amplo rol de direitos e garantias, inclusive, de cunho social (previdência, saúde, educação, entre outros), temos notado como medida frequente e principal o aumento de tributos.
Em momentos de crise, não sendo diferente nos países europeus, é inegável que a majoração da carga tributária é uma das eventuais medidas a serem tomadas, todavia, há de se lembrar da frase do Juiz da Corte Suprema americana John Marshall no sentido de que “o poder de tributar envolve o poder de destruir”.
O que se pretende, portanto, é dizer que, embora não se negue eventuais alterações no sistema tributário, o caminho para a solução da crise está distante da singela, cômoda e ilegítima busca por um amplo aumento da carga fiscal.
De um lado, qualquer mudança na tributação, seja quanto ao aumento ou mesmo redução de incentivos fiscal em sentido amplo, há de ser realizada com ampla discussão democrática e dentro dos princípios e regras jurídicas que estão estabelecidas na Constituição Federal vigente, as quais dão suporte ao próprio Estado Democrático de Direito, daí porque é fundamental o respeito à legalidade, capacidade contributiva, anterioridade, irretroatividade, segurança jurídica, não confisco, proporcionalidade, entre outros, como medida de justiça fiscal.
Neste aspecto, a atual conduta do Governo Federal — podemos incluir os demais entes da Federação — tem preocupado, uma vez que as recentes alterações fiscais de majoração de tributos não têm cumprido tais regras e princípios jurídicos, podendo citar exemplificativamente o que houve com o PIS/Cofins quanto às receitas financeiras, extinção da alíquota zero da bens de informática e telefonia, entre outras.
Bem por isso, a verdadeira reforma deve estar direcionada para o cumprimento do princípio constitucional da eficiência e boa administração.
Ora, como é de conhecimento, a carga tributária brasileira é de aproximadamente 36% do PIB, porém, em contrapartida, nosso país, pelo 5º ano consecutivo, é o último no Índice de retorno de Bem Estar à Sociedade (IRBES).
É evidente, portanto, que o problema brasileiro tem solução no efetivo aperfeiçoamento e controle das despesas públicas em geral, desde gastos com pessoal até mesmo aqueles de cunho social (previdência, saúde, educação, cultura, entre outros).
Sendo assim, é preciso que se implemente um Estado Fiscal de legalidade com o cumprimento das determinações constitucionais e legais do ponto de vista das leis orçamentárias, inclusive, de responsabilidade fiscal.
Mais do que isso, o controle político, jurídico e social dos valores tributários arrecadados e sua destinação necessitam de maior efetividade, a partir da ampla transparência e publicidade de tais informações, que não devem se resumir ao mero acesso passivo e burocrático da atualidade. Convém ir além para que o Governo tenha o dever de implementar meios para que exista uma divulgação ampla, clara e ativa de tais dados, que, se inverídicos e equivocados, devem gerar responsabilidade política, administrativa e até mesmo criminal aos agentes públicos. Vale lembrar que tais pontos favorecem ou impedem outro elemento importante que o atual controle não sem sido eficaz, que é o combate à corrupção.
Com isso, teríamos um controle social mais efetivo e democrático, além de proporcionar, por via reflexa, o melhor funcionamento dos demais instrumentos já existentes tal finalidade, como os tribunais de contas, Controladoria Geral da União, corregedorias, Ministério Público, entre outros.
Não há dúvida, ainda, que caberá à sociedade, juntamente com o Estado, avaliar os gastos com direitos sociais, reduzindo-os, com observância ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade, a fim de que se façam ajustes, mas não leve um retrocesso social das conquistas alcançadas (que não se confundem com algumas distorções ou mesmo privilégios por exemplo na parte da previdência).
Em conjunto com tais fatores, é importante ainda uma maior eficiência na execução dos serviços públicos, em geral, de qualidade ruim e alto custo, não se olvidando ainda do combate à excessiva burocracia e complexidade no setor fiscal, pois, o Brasil é um dos campeões mundiais em custos de conformidade, ou seja, quanto se gasta para apurar e recolher os tributos.
Para encerrar, acreditamos que a implantação de tais medidas dependem, sobretudo, de uma mudança cultural, social e de conduta da sociedade brasileira no sentido de exercer uma verdadeira cidadania fiscal, na medida em que deve exigir, deveras, o cumprimento da Constituição e leis pelo Estado; por outro lado, também cabe refletir a respeito do fato de que não temos somente direitos, mas, também, deveres, de tal maneira que devemos nos pautar dentro da legalidade e ética, não praticando ilícitos e fraudes, além de ser fundamental refletirmos acerca do “tamanho” de Estado Social que pretendemos — e podemos — ter, pois não há direitos sem custos, e, assim, sem tributos na mesma proporção.
Somente assim teremos um Estado Fiscal sustentável e suportável.
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