Suprema Corte

Nos EUA, fim da presunção de inocência inviabiliza direito a julgamento rápido

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22 de maio de 2016, 10h35

A Suprema Corte dos EUA decidiu, na quinta-feira (19/5), que o direito constitucional do réu a julgamento rápido se esgota no mesmo momento em que a presunção de inocência se desfaz: isto é, quando o réu confessa a culpa, antes do julgamento, ou quando é condenado, ao final do julgamento.

O direito a julgamento rápido, previsto na Sexta Emenda da Constituição dos EUA, existe para proteger o réu presumidamente inocente — não o réu cuja culpa já foi estabelecida. Assim, se o réu se declara culpado em negociação com a Promotoria, para evitar o julgamento em troca de uma pena menor ou vai a julgamento e é condenado, o processo de proferimento da sentença, que vem a seguir, não é protegido por esse direito.

Essa distinção é importante nos EUA porque se a defesa conseguir estabelecer que o estado violou o direito do réu a julgamento rápido, o juiz tem de anular a condenação e a sentença e trancar o processo. E o réu, se não tiver outra condenação, é colocado em liberdade.

Segundo a decisão da Suprema Corte, o direito a julgamento rápido (speedy trial) só existe pelo período que vai da prisão do réu ao veredito do júri ou decisão do juiz, englobando todas as fases intermediárias, quando há julgamento. Não se aplica a qualquer procedimento depois da condenação.

Os ministros examinaram o caso de Brandon Betterman, de Montana, que se declarou culpado por haver desrespeitado as condições estabelecidas no procedimento de fiança, que lhe permitiu responder em liberdade a um processo em que fora acusado de violência doméstica: ele deixou de comparecer ao tribunal, em datas marcadas, e foi preso, quando encontrado.

A sentença só foi proferida 14 meses após a prisão. O atraso foi considerado “institucional” e atribuído a entraves burocráticos para marcar a audiência de sentenciamento. Betterman pediu ao Tribunal Superior de Montana que anulasse sua sentença, porque o atraso teria violado seu direito a julgamento rápido.

No entanto, o Tribunal Superior do estado rejeitou o pedido, no que foi apoiado pela Suprema Corte do país. “Seria uma sorte inesperada, injustificada, na maioria dos casos, remediar o atraso no proferimento da sentença com a anulação da condenação”, escreveu a relatora do voto unânime da corte, a ministra Ruth Ginsburg.

Os processos de violação das condições da fiança (bail jumping) e de violência doméstica correm separadamente, cada um com sua sentença e sua pena. Betterman, além de perder o dinheiro da fiança, foi condenado a sete anos de prisão, por não comparecer ao tribunal. Mas o juiz aplicou uma “suspensão” de quatro anos da pena.

Direitos do réu
A Sexta Emenda da Constituição dos Estados Unidos faz parte da “Declaração dos Direitos” dos réus em processos penais. Ela garante ao réu direitos como julgamento rápido e público, por um júri imparcial, no distrito em que o crime foi cometido, de ser informado sobre a natureza e a causa da acusação, de confrontar as testemunhas contra ele, de ter um processo obrigatório de obter testemunhas a seu favor e, finalmente, de ser representado por um advogado de defesa.

As funções do direito ao julgamento rápido são evitar detenção infundada por prazo excessivo (em respeito à presunção de inocência do réu), proteger a capacidade do réu de se defender das acusações (por exemplo, se há demora, provas podem desaparecer, a memória de testemunhas pode enfraquecer ou testemunhas podem desaparecer ou morrer) e, finalmente, aliviar sofrimento desnecessário provocado pela ansiedade, enquanto o réu espera o julgamento.

No entanto, a Constituição não define o que é um julgamento rápido, em termos de prazo — e a responsabilidade fica delegada a cada estado. E, como tudo nos EUA, é “cada cabeça (isto é, cada estado), uma sentença", cada estado tem sua ideia própria do que é um prazo razoável.

Na Califórnia, a Promotoria tem de levar o réu a julgamento em um prazo de dois meses. No estado de Nova York, em um ano. Mas existem outros fatores, que pesam na balança.  Alguns estados consideram que 30 dias é prazo suficiente para a Promotoria acusar um réu por um delito de pequena monta, se o réu estiver preso, e 45 dias, se estiver solto. E de 60 a 120 dias para um crime violento. Todo o julgamento de crime violento pode durar até um ano e meio em alguns estados.

Além disso, em alguns casos o atraso pode ser “justificável”. Exemplos: pode ser do interesse da defesa retardar o julgamento; as partes podem protocolar petições que atrasam o processo; o réu pode não estar disponível; o réu não tem um advogado para representá-lo em uma audiência.

Os direitos dos réus também são protegidos pela Quinta Emenda e pela 14ª Emenda. A quinta emenda garante ao réu o direito a um grand jury, proíbe que um réu seja julgado duas vezes pelo mesmo crime, o exime de autoincriminação (de forma que não precisa testemunhar, se não for conveniente) e dispõe sobre o devido processo, entre outros direitos. A 14ª Emenda detalha mais o devido processo e cria outros direitos.

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