Opinião

Partidos devem responder por crimes dolosos de seus filiados

Autor

  • Rodrigo Felberg

    é advogado criminalista sócio do Hartmann e Felberg Advogados e professor de Direito Penal Direito Penal Econômico e Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. É mestre e doutor em Direito Político e Econômico pela mesma instituição e pós-graduado em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra.

8 de maio de 2016, 10h54

Em meio ao efervescente prisma de corrupção que, nos últimos anos, tem sido descortinado no Brasil e seus danos catastróficos à nação, em especial os prejuízos financeiros às empresas públicas, surge uma inevitável indagação: qual a responsabilidade dos partidos políticos na recomposição dos prejuízos financeiros que seus filiados causaram por práticas delituosas, no exercício de suas funções representativas, sob conivência da própria legenda?

A profusão de informações e consequente ampliação do horizonte de consciência dos brasileiros é um oásis pedagógico a ser destacado, neste cenário de caos político e financeiro que assola o país. O ganho de percepção política coletiva que, indubitavelmente, nos faz melhor hoje do que ontem, é fundamental à qualificação do exercício da cidadania, máxime na escolha de nossos representantes.

Há de se ter em conta, todavia, que os políticos representam uma unidade de ação servível a uma estrutura maior, dotada de diretrizes administrativas sob peculiar véu ideológico, indispensável para dar vazão à voz popular: os partidos políticos.

Os partidos são pessoas jurídicas de direito privado destinados a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo. No Brasil, ninguém pode ser eleito se não estiver regularmente filiado. Quando se vota em alguém não se escolhe apenas um candidato, mas também a legenda que o representa, como um coração que necessita de um corpo para pulsar.

Temos presenciado, neste sentido, uma distorção funcional preocupante, referente ao modo como os partidos têm lidado com seus membros “desviantes” que deveriam, sob uma perspectiva ideal, personificar a estimável delegação popular. É alarmante que supostos outorgados da sociedade têm encontrado em certas siglas partidárias o ambiente favorável para se distanciarem de suas nobres funções e que, em casos extremos, suas condutas criminosas são por estas estimuladas, sob a repulsiva expectativa de compartilhamento do produto financeiro ilegal.

É imperioso, portanto, que o Poder Judiciário reconheça, vivamente, que partidos políticos identificados com as práticas delituosas de seus filiados possam ser responsabilizados civilmente pelos danos que seus integrantes causarem a terceiros.

A manutenção da governabilidade e de projetos de poder tem sua face emblemática na concessão de cargos na máquina estatal ou em suas empresas públicas. Essa simbiose não é somente desfavorável às finanças públicas porque estimula a hipertrofia desnecessária do aparato público, mas também porque o atendimento aos conluios pessoais tende a comprometer a eficiência e qualidade dos serviços.

Esse caldo de cultura tem fomentado práticas ilegais sob supervisão disfarçada dos próprios partidos, caracterizadas, por exemplo, em fraudes em processos licitatórios em meio a serviços prestados às estatais, em propinas mascaradas de doações de campanhas, em pagamento de vantagens indevidas a agentes políticos e uma série diversa de práticas condenáveis que passaram não somente a ser disseminadas como, às vezes, tomadas por essenciais à expansão da própria estrutura partidária, o que tem exigido uma releitura modernizante sobre o papel que os partidos representam na penosa luta contra a imoralidade pública.

Neste contexto, a contribuição ao incremento da força motivadora de ação fiscalizadora e proativa dos partidos políticos em face de seus filiados é a disseminação, pelo Poder Judiciário, da responsabilização civil por atos específicos de seus filiados.

Comprovando-se o respaldo partidário nos atos criminosos de seus integrantes, no exercício de suas funções representativas, impõe-se que a sigla seja responsabilizada pelos prejuízos financeiros produzidos. Dever-se-á perquirir, ainda se, eventualmente, a legenda foi deliberadamente omissa no seu poder-dever de impor normas e métodos coibidores de tais práticas ou se permaneceu inerte em face de normas imperativas pré-existentes, contribuindo, desta forma, para assegurar seus próprios benefícios econômicos. Neste caso, abrir-se-á, igualmente, espaço à responsabilização financeira perante terceiros.

Daí a importância das legendas modelarem e cumprirem com seriedade um sólido compliance partidário. É obrigação de cada sigla adotar meios eficientes para garantir que os integrantes de seus quadros sejam cidadãos idôneos, estabelecendo densas regras de integridade, que abordem toda a dinâmica representativa, desde a filiação até a desfiliação, além de cumprir com zelo as diretrizes fiscalizatórias, visando a atuação insuspeita de seus filiados.

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    é advogado criminalista, sócio do Hartmann e Felberg Advogados e professor de Direito Penal, Direito Penal Econômico e Direito Processual Penal na Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. É mestre e doutor em Direito Político e Econômico pela mesma instituição e pós-graduado em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra.

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