Opinião

PL sobre venda de imóveis contraria jurisprudência e beneficia construtoras

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6 de maio de 2016, 6h46

Indubitavelmente, o Brasil experimentou significativa expansão da atividade imobiliária nos últimos anos, o que agora provoca, em decorrência da instabilidade econômica, alto índice de distratos e devolução de imóveis adquiridos na planta perante construtoras e incorporadoras.

O que não nos causa estranheza, diante desse novo cenário nacional, é a apresentação do Projeto de Lei 774/2015, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), o qual dispõe acerca da devolução das prestações pagas em caso de desfazimento do contrato de promessa de compra e venda de imóveis.

Segundo a proposta do Senador, essas relações econômicas e sociais decorrentes das vendas de imóveis merecem especial atenção no intuito de evitar insegurança jurídica e distorções capazes de atingir a equação econômica na qual se estrutura a incorporação imobiliária.

No entanto, imperioso ressaltar que o referido projeto de lei pretende estabelecer cláusula penal pelo desfazimento do negócio no limite de 25% em casos de desistência do comprador e comissão de corretagem de 5% do preço de venda, além de prever a possibilidade de restituição da quantia no prazo de até três meses contados da data do desfazimento do contrato, o que representa verdadeiro retrocesso frente a jurisprudência dominante.

Nos resta límpido e cristalino que o PL reflete tão somente os interesses de uma categoria econômica, pois a possível norma provocaria real desequilíbrio contratual diante da orientação jurisprudencial dominante que tem estipulado cláusula penal no limite de 10% nos casos de inadimplemento do compromitente comprador, não se mostrando razoável o percentual fixado na proposta legislativa.

Entretanto, acompanhamos com entusiasmo e grande expectativa o recente voto proferido pela senadora Marta Suplicy (PMDB-SP), o qual sustenta ser a redação original do PL prejudicial aos consumidores, observando acertadamente que o limite de 10% fixado em reiteradas decisões judiciais é plenamente adequado, caracterizando o percentual estipulado no projeto original verdadeiro enriquecimento ilícito das construtoras, tendo em vista que o imóvel pode ser novamente negociado pelo preço médio de mercado sem qualquer depreciação.

Em sua análise, a senadora ainda destaca que o projeto não possui vícios de constitucionalidade ou juridicidade, mas que em seu mérito o texto prescinde adequações quanto ao percentual máximo e o prazo para ressarcimento do consumidor, pois o texto original possibilita que a referida quantia seja devolvida em até três parcelas mensais e subsequentes, contados da data do desfazimento do contrato.

Vale lembrar, por oportuno, que a natureza de referida cláusula penal ou multa, como preferem alguns, é fazer frente às despesas operacionais suportadas pela construtora ou incorporadora com a rescisão contratual, tendo em vista que o imóvel será devolvido e renegociado por valor igual ou até maior em casos de valorização do local onde situado, como pode ocorrer em bairros que recebam obras de infraestrutura (Ex: metrô, terminais de ônibus municipais, shoppings, etc.).

De uma singela análise, defendemos que a multa de 25% em casos de rescisão contratual por parte do comprador mostra-se abusiva e prejudicial, na medida em que os grupos imobiliários não perderão a oportunidade de revender o imóvel objeto do negócio jurídico, o que diferencia-se por exemplo de uma rescisão contratual por parte do consumidor em voo internacional onde a companhia aérea dificilmente conseguirá um novo cliente em substituição daquele “desistente”, a depender do prazo em que se manifestou.

Em nossa opinião, a discussão e normatização do tema aparece em boa hora, mas exige muita cautela para que não seja mais um instrumento de violação de direitos do consumidor diante de nítida relevância econômica que possui junto aos grandes grupos imobiliários, fazendo-se assim necessário o acatamento das observações realizadas adequadamente pela senadora Marta Suplicy.

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