Opinião

Reforma previdenciária e desvinculação de recursos das contribuições sociais

Autor

  • Gustavo Filipe Barbosa Garcia

    é livre-docente e doutor pela Faculdade de Direito da USP pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla professor advogado e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e membro pesquisador do IBDSCJ. Foi juiz procurador e auditor fiscal do Trabalho.

24 de junho de 2016, 16h29

Vemos ressurgir a conhecida discussão sobre reforma previdenciária e exigência de idade mínima para a aposentadoria, sob o argumento da necessidade de equilíbrio financeiro nas contas públicas.

Primeiramente, é relevante notar que as aposentadorias por idade e por tempo de contribuição são modalidades distintas.

No Regime Geral de Previdência Social, do INSS, a aposentadoria por idade exige 65 anos, se homem, e 60 anos de idade, se mulher. Para a aposentadoria por tempo de contribuição, por sua vez, atualmente são necessários 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos de contribuição, se mulher.

Deve-se salientar que a idade mínima já é exigida na aposentadoria por tempo de contribuição no Regime Próprio de Previdência Social, ou seja, dos servidores públicos estatutários, sendo necessários 60 anos de idade e 35 de contribuição, se homem, e 55 anos de idade e 30 de contribuição, se mulher.

Ainda no regime próprio, a aposentadoria por idade ocorre aos 65 anos, se homem, e 60 anos de idade, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição.

Cabe esclarecer que no Regime Geral de Previdência Social existe a incidência do fator previdenciário, o qual pode reduzir o valor da aposentadoria por tempo de contribuição, por exemplo, de segurado com idade não elevada, justamente como forma de desestimular a sua ocorrência.

A chamada “fórmula 85×95”, por seu turno, recentemente instituída, possibilita ao segurado que preencher os seus requisitos optar pela não incidência do fator previdenciário no cálculo da aposentador por tempo de contribuição.

Em verdade, a respeito do suposto déficit da Previdência Social, quando se alega a insuficiência de recursos para o custeio e a manutenção de direitos sociais, como os benefícios previdenciários, chegando-se a defender a sua redução e restrição, deve-se examinar com maior rigor a questão orçamentária envolvida, com destaque à desvinculação de recursos das contribuições sociais, o que certamente acaba gerando desequilíbrio financeiro na Seguridade Social.

Nesse enfoque, as contribuições sociais arrecadadas deveriam integrar o orçamento da seguridade social, para o pagamento das respectivas prestações sociais, mas, com isso, acabam direcionadas ao orçamento fiscal, o qual é voltado às despesas gerais do poder público.

É imperioso considerar, ainda, que no Estado Democrático de Direito incide o princípio da vedação do retrocesso social, impondo-se o progresso na garantia dos direitos fundamentais sociais, como se interpreta da Constituição da República Federativa do Brasil (artigos 1º, 3º, 5º, 6º, 7º, 170 e 193).

O Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, promulgado pelo Decreto 591/1992, é expresso ao determinar a necessidade de progressividade, por todos os meios apropriados, do pleno exercício dos direitos sociais (artigo 2º).

Por fim, embora não menos importante, antes de se propor restrições a direitos sociais destinados a assegurar a dignidade humana e o mínimo existencial, como as prestações da seguridade social, notadamente os benefícios previdenciários do regime geral, exige-se coragem para a eliminação de eventuais privilégios financeiros de certos setores mais favorecidos da sociedade, bem como maior rigor na administração do orçamento da seguridade social, como requisitos para a legitimidade democrática de qualquer proposta de reforma previdenciária.

Autores

  • é livre-docente e doutor pela Faculdade de Direito da USP, pós-doutor e especialista em Direito pela Universidad de Sevilla, professor, advogado e membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e membro pesquisador do IBDSCJ. Foi juiz, procurador e auditor fiscal do Trabalho.

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