Abuso no trem

Metrô não pode ser apenado por assédio sexual se socorreu vítima

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22 de junho de 2016, 18h42

O assédio sexual ocorrido dentro de ônibus ou trens não pode ser considerado descumprimento do contrato pela empresa de transporte, pois é um crime cometido por terceiro. Assim entendeu a juíza Tamara Hochgreb Matos, da 24ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao negar indenização por danos morais de R$ 789 mil a uma mulher que foi assediada sexualmente no Metrô.

metro.sp.gov.br
Mulher assediada dentro do vagão foi atendida pelos seguranças ao desembarcar.
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A autora da ação alegava que os servidores do Metrô não agiram rápido o suficiente para conter o assédio sofrido por ela, apesar de já estarem observando o criminoso. O autor do crime foi preso pelos seguranças e levado à delegacia. Já a empresa afirmou que não teve culpa no ocorrido e que auxiliou a vítima, mesmo sem que os seguranças tivessem sido solicitados por ninguém.

“Segundo a inicial e a testemunha da autora, esta ficou impassível e nada fez enquanto era tocada por terceiro, ocasionando a demora na intervenção dos seguranças da ré, que estavam no próprio trem e já suspeitavam da conduta do agressor, observando-o, mas precisavam de uma confirmação para agir. Se a autora tivesse expressado seu incômodo de forma inequívoca no início das agressões, os seguranças poderiam ter agido antes e evitado a situação”, explicou a juíza.

A testemunha do Metrô, um dos seguranças que deteve o assediador, afirmou que foram os agentes do Metropolitano que abordaram a vítima no desembarque do vagão para perguntar sobre o ocorrido. Disse ainda que a autora da ação demorou a confirmar o fato e aceitar ir até a delegacia para prestar depoimento e denunciar o criminoso.

“Assim, a conduta do terceiro rompe o nexo de causalidade entre o serviço de transporte prestado e o dano sofrido pela autora, notadamente no caso dos autos, em que a ré agiu prontamente e de forma eficaz assim que a autora manifestou seu incômodo com o fato praticado por terceiro”, complementou a juíza.

No caso ainda houve uma controvérsia sobre o criminoso ter mostrado seu pênis ou não, mas a julgadora não aceitou a inclusão dessa suposição nos autos. Embora uma testemunha tenha sugerido que o agressor colocou o pênis para fora da calça, esfregando-o na autora, tal versão não é afirmada nem na petição inicial, nem nos depoimentos prestados na Delegacia, nem pelo segurança do Metrô ouvido em audiência.

O processo contra o Metrô
A ação analisada pela juíza Tamara Hochgreb Matos ganhou repercussão na imprensa, pois a maneira com que o caso foi noticiado deu a entender que ela julgou um processo movido contra o criminoso, e não contra o Metrô, como realmente ocorreu.

“Segundo a própria autora informou na petição inicial, os agentes do Metrô estavam no mesmo vagão, já desconfiavam da conduta do autor do assédio, porém aguardavam algum sinal da autora para agir, pois como se sabe agentes do Metrô não podem abordar passageiros sem motivo para tanto, sob pena de serem responsabilizados pelos passageiros abordados, que podem alegar preconceito ou abuso de poder”, diz o TJ-SP.

A corte paulista afirma ainda que em nenhum momento foi dito que autor do assédio não deve ser responsabilizado, ou que a autora, por não ter reagido, foi culpada por ter sofrido assédio. “Também nunca foi afirmado que caberia à vítima evitar a situação, mas sim que, por ela não ter dado nenhuma evidência de que sofria assédio, os agentes do Metrô não puderam evitá-la, não tendo a empresa agido, portanto, de forma negligente.”

À Agência Brasil, um dos advogados da vítima, Ademar Gomes, chamou a decisão de “esdrúxula” e disse que vai recorrer. “Ela [juíza] tomou uma posição ridícula. Com isso, absolve o acusado e o Metrô e condena a vítima. Ela condenou a vítima ao dizer que esta não teve qualquer reação”, afirmou.

Gomes ressaltou que, em 45 anos de carreira, nunca tinha visto uma sentença como essa. “Essa pessoa que foi assediada no metrô, lotado de gente, entrou em pane. Cada um tem uma reação. Ela não sabia se a pessoa tinha uma arma na mão, um canivete, algo com que pudesse ser esfaqueada. O segurança percebeu que ela tinha sido assediada, disse que era do Metrô e perguntou se ela queria fazer queixa. Ela concordou e o rapaz [o abusador] foi detido na hora”, disse o advogado.

Clique aqui para ler a decisão.

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