Execução provisória

Uma operação policial não pode depender da subversão do sistema processual penal

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14 de junho de 2016, 19h18

O editorial do jornal O Globo desta terça-feira (14/6) tem como título Lava jato corre perigo em julgamento no Supremo Tribunal Federal. O fim da lava jato nada me significa, e nada pode significar para o Supremo Tribunal Federal. O que não pode acontecer é o fim do sistema penal brasileiro, este sim é o maior perigo que vivemos.

Se a operação lava jato depende da decisão do Supremo Tribunal Federal dizendo inconstitucional o artigo 283 do Código de Processo Penal, que se dane a operação lava jato. Ela não pode ser maior que o nosso sistema penal, que nosso sistema processual e, enfim, que nossa Constituição.

O artigo 283 do Código de Processo Penal estipula a impossibilidade da execução provisória da sentença penal condenatória. Difícil o mundo e o país em que o sucesso de uma ação penal dependa da supressão de garantias individuais.

Os argumentos a favor da execução provisória da sentença penal condenatória nada têm de jurídicos. Dizem respeito apenas teses viciadas, de pouca relevância ou sustentação jurídica.

O primeiro grito sempre vem: Os recursos Especial e Extraordinário não possuem efeito suspensivo!

 Muito bem, o recurso especial não possui efeito suspensivo, está na lei 8.038/90. Ocorre que direito é sistema e que não existem, como sempre dizia o ministro José de Jesus, “palavras inúteis na lei”[1]. Tem-se então, uma lei que diz que o recurso especial não possuí efeito suspensivo (Lei Geral) e uma lei que diz que independentemente de haver ou não o tal do efeito suspensivo, para matéria penal, necessário o trânsito em julgado (Lei Especial). Desnecessário dizer de conflito aparente de normas e de sua melhor solução. Óbvio que, para matéria criminal, impossível a execução provisória da sentença penal condenatória.

Mas este artigo não pretende discutir normas jurídicas. O que se tem que analisar é a imprestabilidade dos argumentos extrajurídicos.

“Vai acabar com a lava jato!” Uma operação policial, como já dito, não pode subverter o sistema legal, que não prevê a hipótese de execução provisória. Interessante que foi na vigência do anterior posicionamento do Supremo Tribunal Federal que nasceu e cresceu a operação, fato que prova a total dissociação entre um fato e outro.

Mas o raciocínio efetivado é pior, pois o editorial do jornal O Globo traz a percepção daquilo que os operadores do Direito já viram: o uso da coerção e da tortura psicológica como elemento apto à colheita de provas. Se as delações só ocorrem mediante pressão, então que se pressionem os investigados.

Rematado absurdo!

Talvez só não seja absurdo menor do que levantamento estatístico trazido à imprensa pelo ministro Luís Roberto Barroso. Disse ele que poucos recursos são providos no Supremo Tribunal Federal, logo, desnecessária e dispendiosa a garantia ao princípio da não culpabilidade. Coroando o absurdo, o ministro explicita que a maioria dos casos, inclusive, poderia ser resolvidos por meio de Habeas Corpus.

Não sei qual dos argumentos é pior. O Habeas Corpus foi expurgado dos tribunais superiores, por decisão do Supremo Tribunal Federal, na qual foi acompanhado de forma inconteste pelo antigo tribunal da cidadania. Hoje ninguém mais se atreve a formular Habeas Corpus.

Mas horrível, mesmo, é o argumento estatístico. Pessoas, vidas e a liberdade não podem ser medidos em porcentagens. Quantos presos injustamente valem um preso culpado? Não é matemática que rege o Direito.

Nesta quadra, o Supremo Tribunal Federal tem a oportunidade de resgatar uma das mais caras garantias Constitucionais, mesmo que para tanto, custe – não custará – o sucesso de uma operação policial, proveitosa em certos aspectos, mas muito danosa ao sistema legal brasileiro. Afinal, a liberdade de um inocente, não vale a prisão de mil culpados.


[1] (STJ – EDcl no AgRg no Ag: 35649 SP 1993/0008245-0, Relator: MIN. JOSÉ DE JESUS FILHO, Data de Julgamento: 30/06/1993,  T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 09.08.1993 p. 15227).

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