Opinião

Populistas atacam advogados e querem acabar com direito de defesa de acusados

Autor

10 de junho de 2016, 12h19

Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo nesta sexta-feira (10/6) com o título "Ataque ao direito de defesa".

A advocacia foi, ao longo da história, respeitada como instituição dedicada à defesa da liberdade, do Estado democrático de Direito, da cidadania. Essas prerrogativas foram inquestionáveis, sobretudo porque sempre se soube que, sem elas, os abusos seriam inevitáveis diante da tendência quase natural do poderoso Estado subjugar indivíduos sob sua autoridade.

Mesmo em períodos de exceção, a advocacia brasileira foi reconhecida como voz livre e independente, a serviço de infelizes assombrados por acusações de toda sorte.

Hoje, por outro lado, em pleno Estado democrático de Direito, o discurso populista e repleto de pudor quer suprimir dos investigados o direito de se defender, sonegando-lhes o próprio direito a um advogado, como se estivéssemos a revitalizar a máxima inquisitorial de que o inocente não precisa de advogado, enquanto o culpado não o merece.

Pior, o Estado repressor já não se satisfaz com a punição justa do acusado, apurada após o processo em que se lhe assegure o contraditório e a amplitude de defesa com os meios a ela inerentes, inclusive o direito de não fazer prova contra si mesmo.

Com naturalidade preocupante, a histeria própria dos justiçamentos tem transformado o advogado em alvo preferencial de investigações. Não são apenas tentativas de minar a defesa técnica com a relativização de direitos constitucionais do cidadão, a banalização da utilização de instrumentos violadores da intimidade, a supressão do direito a certos meios de provas ou a interposição de recursos a pretexto de que sejam protelatórios.

Agora atacam o próprio advogado, impedindo-o de orientar seu cliente, de com ele conversar reservadamente, de construir suas justificativas e seus argumentos.

Nas interceptações telefônicas, querem ouvi-los em conversas que deveriam ser resguardadas pelo mesmo sigilo que orienta as confissões aos ministros religiosos e as revelações íntimas aos médicos.

Querem ouvir o acusado confessar o crime àquele a quem ele pede ajuda. Ou, então, querem que o próprio advogado sucumba e, sem alternativa, faça seu constituinte confessar a tese do acusador ou firme acordo de delação premiada.

Afinal, se o investigado não confessar o crime, a construção de uma versão defensiva que não se ajuste ao modelo de fato preconcebido pelo acusador ou a simples seleção dos meios de prova que a defesa ousar usar em favor do investigado serão consideradas mentiras urdidas que se opõem à busca da "verdade".

É preciso alertar a sociedade para o perigo de chegarmos ao dia em que a única voz ativa seja a da acusação; dia em que os advogados, tão subjugados quanto os próprios investigados, não serão mais a voz livre e independente de infelizes assombrados por acusações criminais.

Dia em que o linchamento sumário da opinião pública não vexará em destituir investigados e seus advogados do que até então era básico: o simples direito de defesa.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!