Opinião

Assédio moral, a cultura da agressão que não faz bons líderes

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5 de junho de 2016, 6h48

Hodiernamente, fala-se muito em liderança, principalmente pelo viés motivacional que o conceito carrega. Porém, há também um aspecto destrutivo que permeia a prática de liderança corporativa nas relações de trabalho, onde, não raro, se confunde autoridade com agressão.

É comum o relato de trabalhadores que suportam assédio moral praticado por seus superiores em grandes corporações, sendo submetidos a políticas empresariais reprováveis, degradantes e ilegais.

Nesse contexto, destaca-se a figura do ijime, assédio moral caracterizado pela imposição no cumprimento de metas excessivas a qualquer custo, como forma de ascensão funcional, imprimindo rigor significativo no tratamento dos subordinados.

Ijime (que significa maltratar, judiar) é o vocábulo utilizado no Japão para descrever ofensas e humilhações, como também pressões em grupos empresariais com o objetivo de “formar” profissionais ou reprimir aqueles que não se adaptam. Caso o indivíduo não faça as tarefas determinadas com perfeição, é castigado por meio do ijime.

Esse sistema de “liderança” funciona como lavagem cerebral que gera no vencedor a indevida noção de que a ascensão funcional pressupõe subordinação à tratamentos e exigências descabidas e, não raro, ilegais. E isso, mediante pressões psicológicas das mais diversas (ameaças, isolamento, discriminação, cobrança de metas excessivas etc.), em detrimento da dignidade de tais trabalhadores.

No âmbito do comércio varejista, por exemplo, é comum a prática da chamada venda casada, proibida pelo Código de Defesa do Consumidor), quando vendedores são instruídos a se valer de artifícios maliciosos para enganar clientes na venda de serviços acessórios (garantias e seguros), embutindo valores adicionais na venda da mercadoria comercializada, sem a anuência do cliente, se preciso for.

E isso, por imposição hierárquica, com excessiva cobrança no cumprimento de metas, mediante severa pressão psicológica. De tal feita, empregados se veem constantemente em situações contrárias aos bons costumes, sendo “motivados” pelo empregador a maquiar a venda de serviços na conta, sem a anuência do cliente.

E tudo isso como forma de incentivo à ascensão funcional e melhores salários. Em muitos casos, a garantia do emprego de tais profissionais do ramo depende de bons resultados na “arte” da venda casada.

Qual profissional em plena consciência não seria resistente a tais imposições de um sistema de sucesso de práticas ilegais e desonestas?Inseridos nesse modus operandi, tais profissionais acabam por sofrer lesão a direitos fundamentais de aspectos mais íntimos da personalidade humana, como a honra e imagem.

A tutela jurídica desses bens está expressa na Constituição Federal de 1988, que não só proclama a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito, como que são invioláveis “a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”, assegurando o direito a indenização por danos morais decorrentes de sua violação.

Portanto, além de retrógrado e ineficiente, o exercício de liderança empresarial que substitui autoridade por agressão não é nada lucrativo. Pelo contrário, o prejuízo econômico será inevitável quando ações judiciais desencadearem avalanches de indenizações em favor de trabalhadores lesados.

E é justamente nesse momento que, pelo efeito pedagógico de uma condenação judicial, o empresariado chega à conclusão de que a cultura da agressão não faz bons líderes.

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