Dívida de precatórios

Governo não quer que OAB participe de ação contra Brasil na CIDH

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1 de junho de 2016, 14h25

Alegando que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil é parte interessada em uma ação sobre a demora no pagamento de precatórios no Brasil, apresentada à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o governo federal afirmou que a entidade de classe não pode ser amicus curiae no processo.

“Levando-se em conta que o advogado tem direito aos honorários de sucumbência, definidos em cada um desses processos como valor fixo ou como percentual sobre o montante da condenação, fica claro que o litígio internacional em apreço está ligado aos expressivos interesses econômicos da classe representada pela OAB”, afirma.

O governo brasileiro também explica que, apesar de as instituições que atuam como amicus curiae sempre demonstrarem interesse na causa, a admissão de certas entidades em alguns casos é desvirtuada quando os interesses em jogo evidenciam a relação direta do postulante com a ação.

“No caso concreto, a OAB não parece estar em condições de contribuir para a decisão de mérito da CIDH por meio da principal contribuição que os amici costumam fazer: apresentar uma visão ampla das questões jurídicas subjacentes ao litígio, de modo a transcender os interesses particulares das supostas vítimas e do Estado.”

Questionada pela ConJur, a Ordem afirmou que a entrada no caso busca mostrar os problemas da mora do Estado Brasileiro com o pagamento das dívidas judiciais. "A OAB aguarda a decisão da Corte Interamericana e mantém o interesse em atuar no processo para defender a correta aplicação da lei".

Dívida de 1994
A discussão trata de uma reclamação apresentada por três advogados contra o Brasil na CIDH por causa da demora em receber precatórios devidos pela cidade de Santo André. Em 1994, 1,3 mil servidores públicos do município moveram ação pedindo a correção monetária dos salários pagos em anos anteriores, além de indenização.

A atualização de valores foi solicitada por causa das várias mudanças de moeda ocorridas nos anos anteriores e da forte inflação no período pré-plano Real. A Justiça paulista aceitou o pedido e decidiu que Santo André deveria ressarcir os valores.

Depois que a decisão transitou em julgado, os servidores pediram a execução do pagamento e os precatórios foi expedido, devendo ser pago até dezembro de 1999, o que não ocorreu totalmente. O descumprimento da decisão fez com que os servidores pedissem a intervenção do Tribunal de Justiça de São Paulo no caso.

O pedido foi acolhido em novembro de 2002, mas a participação do TJ-SP não foi decretada pelo governador paulista. Além do pedido de intervenção, foi solicitado, duas vezes, o sequestro de verbas de Santo André.

O primeiro foi indeferido por não apresentar o fundamento da ação e o segundo pedido, à época da apresentação da petição, estava com apreciação pendente, e, posteriormente, voltou a tramitar depois que o Supremo Tribunal Federal negou reclamação apresentada pelo Executivo municipal.

Segundo os profissionais que reclamaram junto à CIDH, a prática viola os direitos à preservação da saúde, ao bem-estar, ao trabalho, a uma justa retribuição e à Justiça. Argumentam também que o tempo para pagar os débitos afronta a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem por ser obrigação do Estado respeitar e garantir os direitos humanos e judiciais, além de proteger a honra e a dignidade.

Ressaltam também que a demora em pagar os precatórios viola o direito social relativo à alimentação, vestuário e habitação do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Até junho de 2014, o total, sem atualização monetária, devido com precatórios pelos entes da Federação, é de R$ 97,3 bilhões, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.

Sobre a indenização pretendida na ação, o governo federal argumenta que isso pode gerar mais dívidas aos já endividados estados e municípios, além de criar uma jurisprudência prejudicial ao Estado. “[…] Caso o Estado venha a pagar indenização por danos morais por espera excessiva na fila dos precatórios em decorrência de recomendação da Comissão Interamericana, a União, os estados e os municípios podem vir a ser demandados a arcar com o pesado ônus de pagar iguais indenizações a outros credores que se encontram na mesma situação […].”

Tempo certo
Indo contra a ideia de que o pagamento de precatórios no Brasil demora muito, o Estado brasileiro apresenta inúmeros argumentos para comprovar, pelo menos teoricamente, que o sistema de quitação de dívidas da Fazenda funciona. Cita ainda os grupos de trabalho criados por várias instituições, o CNJ entre elas, para dinamizar o modelo de quitação das dívidas da União com seus cidadãos e empresas.

“Estado brasileiro pondera que os interesses econômicos ligados ao sistema de precatórios possivelmente sejam a causa de boa parte das análises e estudos sobre o tema ser enviesada, incompleta e superficial […] Condenar o sistema de precatórios atual sem apontar alternativas viáveis e apropriadas é imprudente. Atualmente, em vista do nível de endividamento de várias entidades federativas no Estado brasileiro, inexistem remédios de efeitos repentinos e automáticos aptos a saldar de forma imediata toda a dívida dos precatórios no Brasil”, pondera.

O Brasil justifica que a demora nos pagamentos ocorre porque o processo envolve um alto número de credores (1.377) e que o valor devido (R$ 40,7 milhões) é muito alto para o ente federativo. Apesar disso, destaca que já foram pagos R$ 36 milhões do montante devido. “Todavia, ainda um saldo a pagar de aproximadamente R$ 153.000.000,00, em razão da atualização dos valores.”

Clique aqui para ler a peça apresentada pelo Brasil.
Caso 12.836

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