Defesa da classe

Em nota, OAB repudia "crescente escalada" de quebra de sigilo em escritórios

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1 de julho de 2016, 20h28

Grampos em escritórios, excessos em busca e apreensão em bancas, relativização do princípio da inocência e conduções coercitivas sem motivo são algumas questões que viraram tema de intensos debates, principalmente no meio jurídico, por causa da operação “lava jato”. Em um primeiro momento, a Ordem dos Advogados do Brasil, salvo exceções, deu respostas evasivas quando membros da classe reclamavam dos abusos. Agora, uma reação mais dura parece começar a tomar forma.

A diretoria do Conselho Federal da OAB e o Colégio de Presidentes de Seccionais divulgaram nota em conjunto repudiando as práticas e pedindo a tomada das medidas cabíveis. As entidades afirmam que apoiam todas as iniciativas de combate à corrupção, porém, “acreditam que o fortalecimento da democracia e o combate às atividades criminosas não tornarão a sociedade mais ética e justa se violadas garantias constitucionais e os direitos do cidadão”.

“A OAB repudia a crescente escalada de quebra de sigilos das comunicações entre clientes e advogados, porquanto essa é a garantia básica do exercício da advocacia, sem a qual a ampla defesa não se concretiza. Não se deve criminalizar o exercício do direito de defesa, sendo inadmissível que órgãos de investigação realizem interceptações telefônicas sem autorização judicial, e que magistrados autorizem a gravação de conversas entre advogados e clientes sem que o profissional esteja envolvido em irregularidades”, afirma o comunicado.

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Advogado de Lula, Roberto Teixeira teve o telefone de seu escritório grampeado mesmo sem ser investigado.Reprodução

Em março, o juiz Sergio Moro determinou uma série de grampos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso se estendeu até mesmo a Roberto Teixeira, advogado do petista. O grampo foi no ramal central do escritório, e a interceptação atingiu todos os 25 advogados da banca.

Moro inicialmente disse que não sabia que autorizou grampo no escritório, mas reportagem da revista Consultor Jurídico mostrou que o documento da operadora de telefone apresentava o número como sendo do escritório. O juiz disse que só soube que o número era do escritório após ler a ConJur

Condução coercitiva
O comunicado também trata da questão da condução coercitiva. Em março, a Polícia Federal aplicou a medida contra Lula, mesmo ele tendo atendido a todos os chamados para depor. A prática da PF contrariou inclusive o despacho de Moro sobre o caso, que deixou claro que a condução coercitiva só deveria ser adotada se ele se recusasse a ir de forma voluntária quando chamado. “Mandado só deve ser utilizado e cumprido, caso o ex-presidente, convidado a acompanhar a autoridade policial para depoimento, recuse-se a fazê-lo”, escreveu Moro no despacho.

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Mesmo tendo atendido aos chamados da Justiça para depor, Lula foi conduzido coercitivamente em marçoReprodução

“A substituição das intimações para prestar depoimentos, por conduções coercitivas automáticas, viola o devido processo legal, somente podendo ser utilizada depois da recusa ou não comparecimento do investigado para prestar depoimento”, afirma agora a OAB.

Acesso aos autos
Em junho, o Conselho Nacional do Ministério Público determinou que a Procuradoria da República no Distrito Federal justifique o motivo para rejeitar pedido apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A OAB também falou sobre o tema, mas, como nos outros pontos, não mencionou caso específico: “O acesso pleno dos advogados aos processos e diligências deve ser imediato, sem embaraços e com antecedência suficiente para acompanharem as audiências de seus clientes.”

Para finalizar, a OAB ressaltou que o princípio da inocência, consagrado pelo texto constitucional, não deve ser relativizado e falou da violação de escritórios. “A OAB repudia, também, o uso indiscriminado de buscas e apreensões em escritórios de advogados, com emprego de amplo e desnecessário aparato policial, porquanto, nos termos da lei, os escritórios ou locais de trabalho dos advogados são invioláveis. Buscas e apreensões midiáticas desservem à formação do processo justo, e quando desrespeitada a inviolabilidade do escritório profissional caracterizam nulidade absoluta.”

Como tomada de medida, a Ordem pede que Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, as corregedorias e os tribunais apurem “celeremente todas as violações de garantias individuais dos cidadãos e de prerrogativas dos advogados, que impliquem em desrespeito ao devido processo legal, visando assegurar equilíbrio entre acusação, defesa e poder jurisdicional”.

Leia a nota:

A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL e o COLÉGIO DE PRESIDENTES DE SECCIONAIS na sua missão histórica de defesa da Democracia, do Estado Democrático de Direito e da Constituição Federal, em razão do atual momento pelo qual passa o País, vem reafirmar seus compromissos com os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, transparência e eficiência, que devem orientar a Administração Pública, bem como com os direitos e garantias fundamentais, especialmente dignidade, liberdade, livre manifestação, inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem, do sigilo da correspondência e das comunicações telefônicas e de dados, ampla defesa e devido processo legal, destacando que:

1) A OAB apoia todas as iniciativas de combate à corrupção, concitando ao equilíbrio entre o interesse público baseado no princípio da moralidade e o respeito às garantias individuais e direitos fundamentais, conquistados democraticamente pela nação brasileira. A OAB acompanha o cenário de crise política, ética e financeira em que o Brasil vive, e acredita que o fortalecimento da democracia e o combate às atividades criminosas não tornarão a sociedade mais ética e justa se violadas garantias constitucionais e os direitos do cidadão;

2) Por isso a OAB repudia a crescente escalada de quebra de sigilos das comunicações entre clientes e advogados, porquanto essa é a garantia básica do exercício da advocacia, sem a qual a ampla defesa não se concretiza. Não se deve criminalizar o exercício do direito de defesa, sendo inadmissível que órgãos de investigação realizem interceptações telefônicas sem autorização judicial, e que magistrados autorizem a gravação de conversas entre advogados e clientes sem que o profissional esteja envolvido em irregularidades;

3) A OAB repudia, também, o uso indiscriminado de buscas e apreensões em escritórios de advogados, com emprego de amplo e desnecessário aparato policial, porquanto, nos termos da lei, os escritórios ou locais de trabalho dos advogados são invioláveis. Buscas e apreensões midiáticas desservem à formação do processo justo, e quando desrespeitada a inviolabilidade do escritório profissional caracterizam nulidade absoluta;

4) O advogado é indispensável à administração da justiça e como tal deve ter respeitadas todas as suas prerrogativas;

5) A quebra dos sigilos telefônicos e de dados dos cidadãos, nos termos do que prevê a lei, somente deve ser realizada após esgotados os outros meios de investigação e não como a primeira diligência investigatória;

6) O acesso pleno dos advogados aos processos e diligências deve ser imediato, sem embaraços e com antecedência suficiente para acompanharem as audiências de seus clientes;

7) A substituição das intimações para prestar depoimentos, por conduções coercitivas automáticas, viola o devido processo legal, somente podendo ser utilizada depois da recusa ou não comparecimento do investigado para prestar depoimento;

8) O princípio da inocência, consagrado pelo texto constitucional, não deve ser relativizado;

9) O Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, as Corregedorias e os Tribunais, em suas missões constitucionais, devem apurar celeremente todas as violações de garantias individuais dos cidadãos e de prerrogativas dos advogados, que impliquem em desrespeito ao devido processo legal, visando assegurar equilíbrio entre acusação, defesa e poder jurisdicional;

10) A OAB reafirma a sua missão de defesa da advocacia brasileira como forma de efetivação da cidadania, externando que atuará em todas as instâncias do Poder Público, em defesa das prerrogativas dos advogados para que possam eles defender com liberdade, independência e dignidade seus constituintes.

Diretoria do Conselho Federal da OAB
Colégio de Presidentes de Seccionais

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