Não se pretende aqui afirmar que não existam abusos de poder e submissão de empregados a condições humilhantes e degradantes em razão do exercício da força contratual e da precariedade de condições econômicas a que se submetem boa parte dos trabalhadores, premidos pela necessidade de emprego e salário.
Um dos pressupostos do cumprimento do contrato de trabalho é a confiança recíproca entre as partes e uma vez ausente prevalece a fragilidade no conteúdo jurídico que pode comprometer a continuidade do contrato de trabalho. Deste modo, o exercício da relação trabalhista é feito de freios e contrapesos de ambos os lados, empregado e empregador, em linha de comprometimento constante onde deveria prevalecer a boa fé contratual. Quando se trata de contrato de emprego, é mais acentuada a boa fé em razão da finalidade social do próprio contrato e seus efeitos para o futuro da sociedade.
Todavia, o dia a dia dos contratos de trabalho revela peculiaridades de comprometimento e confiança que se renovam a cada fim de jornada. Assim, do lado dos empregados, a entrega da força de trabalho com promessa de pagamento pode ser considerada um elemento de confiança inquestionável. Para os empregadores, a confiança depositada na capacidade que o empregado tem de representar a empresa ou de nela contribuir para o resultado do objeto social e que envolve a participação interna no ambiente de trabalho e as relações externas que o empregado pode representar.
Em recente decisão, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, em voto da lavra do Ministro Alexandre Agra Belmonte (Processo TST-RR-1144-67.2010.5.03.0028), reformou decisão de primeira e segunda instâncias, para reconhecer a violação da intimidade do empregado submetido a revista com contato físico e que expunha o empregado diante dos demais colegas de trabalho. Diz o acórdão que “o empregado era revistado por seguranças armados que apalpavam todas as partes do seu corpo, chegando próximo às partes íntimas, podendo levantar a blusa e a bainha da calça e, inclusive, apalpar as nádegas para vistoriar o bolso traseiro. Ficou registrado, ainda, que o empregado, enquanto estava sendo revistado, poderia ser visto por outros colegas que ainda estavam sendo submetidos ao processo de seleção para a revista”.
A decisão assevera a colisão direitos do empregador, quanto à preservação do patrimônio, e do empregado, quanto à preservação de sua intimidade física e imagem, porque o trabalhador era apalpado em suas partes íntimas, atingindo assim a dignidade da pessoa humana agravada a ofensa porque sem “indícios ponderáveis de que teria sido lesado o patrimônio da empresa ou decaiu da fidúcia do empregador”. Quanto à preservação da intimidade física é um direito assegurado constitucionalmente e nem mesmo indícios de desvios de conduta justificariam a invasão de privacidade física. Todavia, não nos parece que mero controle patrimonial possa ser caracterizado como presunção de quebra de fidúcia relativamente ao empregado revistado.
Embora a decisão trate de conflito de direitos, efetivamente se trata de uma análise dos limites do cumprimento do contrato de trabalho em que a fidúcia é elemento essencial de sua subsistência.
Todavia, que não se conclua a partir da decisão que qualquer revista implique desconfiança ou indício de que o empregado esteja sendo colocado sob suspeita de ato de improbidade. Há limites para o empregador no exercício de seus poderes, mas a desconfiança na probidade não poderia servir como justificativa para a violação da intimidade do empregado. Se for assim, o contrato de trabalho não se sustenta e a rescisão deve ser imediata.