Responsabilidades pela tragédia

Três anos após incêndio, processo da boate Kiss reúne 63 volumes e 27 anexos

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27 de janeiro de 2016, 16h00

As quase 20 mil páginas que compõem os 63 volumes e 27 anexos do processo 027/2130000696-7 ajudam a contar uma das páginas mais dolorosas da história gaúcha e traduzem a dimensão e a complexidade que alcançou a principal ação que apura as responsabilidades pela tragédia da boate Kiss, em Santa Maria.

Exatos três anos depois do acidente que deixou 242 mortos e mais de 600 feridos, o desfecho do processo criminal está próximo. Acusação e defesa têm até o final de abril para apresentar alegações finais. Depois, o juiz Ulysses Fonseca Louzada decidirá, entre quatro opções, como será o ato seguinte: levar os réus a júri popular, se presentes a materialidade e indícios suficientes de autoria com animus necandi (vontade de matar); impronunciar, caso não se convença de que houve crime ou indício de autoria; absolver; ou, por fim, desclassificar a infração, levando o caso a julgamento monocrático, se verificar a ocorrência de qualquer outro crime que não seja da competência do Tribunal do Júri.

São réus no processo Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, ex-sócios da boate, e Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos, músico e ajudante de palco da banda Gurizada Fandangueira. Eles respondem por homicídio qualificado pelo motivo torpe e emprego de fogo, asfixia ou outro meio insidioso ou cruel que possa resultar perigo comum (242 vezes consumado e 636 vezes tentado).

Juízo técnico
Depois de ouvir mais de 201 pessoas desde abril de 2013, entre vítimas (115), testemunhas (68) e peritos (18), além dos próprios réus, o juiz Louzada avalia que os quase três anos de andamento do processo não são exagerados, mas consequência da complexidade do caso e da exigência da técnica processual.

"O Judiciário do Rio Grande do Sul está muito bem, porque conseguiu fazer com que o processo corresse da melhor forma possível e sem ferir qualquer tipo de princípio do contraditório", assegura o magistrado, que entre agosto e dezembro passados cuidou exclusivamente do caso.

Outras ações
Cinco outras ações têm como ponto de partida a tragédia, tanto na esfera cível como criminal. Nelas, são solicitadas indenizações e apuradas acusações de falsos testemunhos, fraudes em documentos, falsificação de assinaturas e improbidade administrativa.

027/2130006199-2
Inicialmente, os réus desse processo eram apenas Elton Cristiano Uroda e Volmir Astor Panzer, que respondem pelo delito de falso testemunho. Em dezembro de 2014, houve um aditamento à denúncia, e outros nove acusados foram incluídos como réus: Angela Callegaro, Cintia Flôres Mutti, Marlene Teresinha Callegaro, Alexandre Silva da Costa, Eliseo Jorge Spohr, Elissandro Callegaro Spohr, Jackson Heitor Panzer, Mauro Londero Hoffmann e Tiago Flores Mutti. Atualmente, o processo está em fase de resposta à acusação.

07/2130006197-6 (criminal)
Ex-chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros de Santa Maria, o major Gerson da Rosa Pereira foi condenado a seis meses de detenção pelo delito de fraude em documentos relacionados ao inquérito policial que apurou as causas do incêndio na boate Kiss. A pena foi convertida em prestação de serviços à comunidade, e o réu pode apelar da sentença em liberdade. A decisão do juiz de Direito Ulysses Fonseca Louzada, da 1ª Vara Criminal da Comarca, é de 27 de outubro de 2015. Como a defesa de Pereira apelou da sentença, o recurso foi remetido ao Tribunal de Justiça.

027/2.14.0000773-6
Já o bombeiro Renan Severo Berleze teve extinta sua punibilidade em outubro do ano passado, ao cumprir com todas as condições da suspensão condicional do processo.

27/2140011071-5 (criminal)
Nova acusação encaminhada pelo Ministério Público, em dezembro de 2014, sobre a suspeita de falsificação de assinaturas e outros documentos para a abertura da boate Kiss. A denúncia contra 34 pessoas foi recebida pela Justiça em 30 de janeiro do ano passado.

Após a atualização dos antecedentes, o MP ofereceu suspensão condicional do processo a 24 réus: Adão Jose Figuera, Valmir Rodrigues Cezar, Maria Rebeca Brites Acosta, Christian Weber, Gladis das Chagas Guimarães, José Gilmar Chagas, José Carlos Santos de Oliveira, Lenir Maciel Flôres Mossate, Itamaraju Soares Xavier, Mario Cesar da Silva Dutra, Rodrigo de Moraes Capa, Katia Daiane Martins Cabreira, Erick Albertani Pampuch, Renise Haesbaert Fernandes, Lothar Heinz Stoever Junior, Luiz Felipe Ribas Niederauer, Tânia Elizabete Basso dos Santos, Samir Almeida Hajar, Volnei Trevisan, Ana Carla Soares Bueno, Enoilso Cocco, Felipe da Luz Ferreira, Diego Guerreiro Fontella e Dani Luisa Passoello.

Desses, 13 aceitaram a suspensão condicional, sendo determinada pelo juiz Ulysses Fonseca Louzada a cisão processual, gerando o processo 027/2.15.0014747-5, que serve, em síntese, para fiscalizar o cumprimento das condições impostas. Estão nessa lista Valmir Rodrigues Cezar, Volnei Trevisan, Adão Jose Figuera, Christian Weber, Enoilso Cocco, Gladis das Chagas Guimarães, José Carlos Santos de Oliveira, José Gilmar Chagas, Itamaraju Soares Xavier, Katia Daiane Martins Cabreira, Erick Albertani Pampuch, Renise Haesbaert Fernandes e Lothar Heinz Stoever Junior.

Portanto, dos 34 réus originais, o processo principal (027/2.14.0011071-5) tramita somente em relação a dez acusados: Cintia Flôres Mutti, Dani Luisa Passoello, Eliseu Jorge Spohr, Elissandro Callegaro Spohr, Elton Cristiano Uroda, Felipe da Luz Ferreira, Marco Aurelio Ribas Guimarães, Samir Almeida Hajar, Santiago Mugica Mutti e Tiago Flores Mutti. Encontra-se em fase de resposta à acusação.

Os 11 réus restantes não foram encontrados para citação pessoal sobre a proposta de suspensão condicional: Alexandre Silva da Costa, Maria Rebeca Brites Acosta, Jose Elizeu Campos, Marco Antônio Pereira Duarte, Lenir Maciel Flôres Mossate, Ana Carla Soares Bueno, Diego Guerreiro Fontella, Luiz Felipe Ribas Niederauer, Tânia Elizabete Basso dos Santos, Rodrigo de Moraes Capa e Mario Cesar da Silva Dutra.

Assim, tiveram suas citações procedidas por meio de edital, após o que houve nova cisão, resultando no processo 027/2.15.0014746-7.

027/1130004136-6 (cível)
Ação coletiva indenizatória ajuizada pela Defensoria Pública do estado e pela Associação dos Parentes de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria contra Angela Aurelia Callegaro, Marlene Teresinha Callegaro, EJS Participações e Assessoria Empresarial LTDA, Eliseo Jorge Spohr, Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero Hoffmann, Novaportal Comércio de Autopeças Ltda, Santo Entretenimentos LTDA ME, município de Santa Maria e estado do Rio Grande do Sul. Tramita na 1ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública da Comarca de Santa Maria e é conduzida pela juíza de Direito Heloísa Helena Hernandez de Hernandez.

Em maio de 2013, Heloísa determinou, em liminar, que os réus efetuassem o pagamento de verbas alimentares às pessoas a quem as vítimas fatais do evento os devia, bem como o pagamento de pensão correspondente à importância do trabalho àquelas vítimas que tiverem a sua capacidade laboral tolhida ou diminuída.

Os réus recorreram ao Tribunal de Justiça, que suspendeu a decisão de primeiro grau. Inconformada, a Defensoria Pública do estado interpôs Recurso Especial junto à 3ª Vice-Presidência do TJ, com vista ao Superior Tribunal de Justiça. O recurso foi admitido pela 3ª Vice-Presidência do TJ-RS em abril de 2015 e encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça.

Tramitam ainda na 1ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública duas ações cautelares referentes ao bloqueio de bens dos réus na ação de indenização coletiva. Elas prosseguem em segredo de Justiça.

0271130010831-2 (cível)
Ação civil pública movida pelo Ministério Público contra os bombeiros Alex da Rocha Camilo, Altair de Freitas Cunha, Daniel da Silva Adriano e Moiséis da Silva Fuchs. Tramita na 4ª Vara Cível de Santa Maria e é conduzido pelo juiz Rafael Pagnon Cunha.

Trata-se de ação por improbidade, pela qual os réus são acusados de utilizar apenas um programa de computador para o processamento de licenciamentos em detrimento dos demais procedimentos previstos em lei para tal finalidade.

Situação: vencida a etapa de exame de questões processuais (nulidade, prescrição), a fase de instrução será iniciada com a chamada para depoimentos de réus e testemunhas.

Também um número impreciso (provavelmente centenas) de ações individuais de indenização correm na Comarca de Santa Maria. Algumas delas foram julgadas em setembro de 2015. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-RS.

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