Economia mista

Mesmo se Lula fosse dono do triplex, competência seria do MP-SP, diz defesa

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29 de fevereiro de 2016, 18h12

Mesmo se o triplex em Guarujá realmente fosse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a investigação deveria ser feita pelo Ministério Público de São Paulo, porque investigações envolvendo sociedades de economia mista são de competência da Justiça comum. O argumento está na peça levada ao Supremo Tribunal Federal pelos advogados de Lula para pedir que as investigações pelas órgãos estadual e federal sejam suspensas até que o STF decida quem é o responsável.

Os advogados Cristiano Zanin Martins, Nilo Batista e Roberto Teixeira citam decisão do próprio STF para embasar sua argumentação. Na Ação Cível Originária (ACO) 1.213, julgada em 2014, o ministro Roberto Barroso, relator, destacou a existência de duas súmulas da corte (517 e 556) que impedem a investigação de casos envolvendo sociedades de economia mista pelo Ministério Público Federal. A Súmula 556 delimita que a Justiça comum é a responsável por “julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista”, sendo complementada pelo dispositivo 517, que define exceção à regra quando “a União intervém como assistente ou opoente”.

Apesar de haver jurisprudência sobre o tema, o ministro lembrou que a possibilidade de conflitos de competência como esse serem analisados pelo Conselho Nacional do Ministério Público foi debatida pela corte, na ACO 1.394. “Na oportunidade, consignei, em síntese, que a competência do Supremo Tribunal Federal, por ser de direito estrito, não poderia ser ampliada. Menos ainda, em conflito tipicamente administrativo, que poderia ser resolvido intrainstitucionalmente pelo Conselho Nacional do Ministério Público”, diz Barroso.

Para o criminalista Fernando Augusto Fernandes, o Supremo tem o dever e atribuição constitucional de definir o conflito entre o Ministério Público Federal de Curitiba e o MP de São Paulo. O advogado aproveita para criticar o fato de Supremo ter adotado uma jurisprudência minimalista de sua competência enquanto o juiz federal Sergio Moro, responsável pela "lava jato" na 13ª Vara de Curitiba, "adota uma jurisprudência totalitarista em uma extensão ilimitada de poder".

Para o mestre em Direito do Estado e professor de Direito Constitucional Luiz Tarcísio Ferreira, o caso em questão nada mais é do que uma "nítida usurpação de competência por parte do MPF”. “Novamente o Supremo é chamado a coibir os abusos! Até quando abusará e fará pilhéria com o Estado de Direito?", questiona.

Fatos desconexos
Outro ponto ressaltado pela defesa do ex-presidente é que não há nenhum indício de relação entre as investigações sobre o triplex e as denúncias apuradas na operação “lava jato”. Nesse ponto, os advogados destacam que Lula nunca tomou nenhuma decisão relacionada à Petrobras, pois a empresa possui uma diretoria independente.

A peça cita o INQ. 4.130-PR , no qual o ministro Dias Toffoli, ao analisar a relação entre a gestão de empréstimos consignados pelo Ministério do Planejamento e os desvios em contratos da Petrobras, afirmou que não foram encontradas provas que ligassem uma prática à outra. “Não se trata de fatos que se imbriquem de forma tão profunda que justifique a unidade de processamento e julgamento”, disse à época.

"O simples fato de a polícia judiciária e o Ministério Público Federal denominarem de ‘fases da operação lava jato’ uma sequência de investigações sobre crimes diversos — ainda que a sua gênese seja a obtenção de recursos escusos para a obtenção de vantagens pessoais e financiamento de partidos políticos ou candidaturas — não se sobrepõe às normas disciplinadoras da competência”, diz o voto de Toffoli.

A defesa do ex-presidente afirma que não há relação entre o caso do triplex e a operação "lava jato". “Referida operação tramita perante a Seção Judiciária de Curitiba (PR), enquanto que as propriedades imobiliárias objeto das investigações e os fatos a ela relacionados estão vinculados ao estado de São Paulo (SP). Ambas as propriedades — que não pertencem ao Autor [Lula] — são privadas e as intervenções nelas realizadas também foram realizadas exclusivamente por agentes privados. Não há, em qualquer dos depoimentos ou diligências realizadas em ambos os procedimentos, qualquer indicação de vínculo entre tais propriedades — que não pertencem ao Autor [Lula] — e desvios no âmbito da Petrobras, muito menos que sejam competência da esfera federal.”

O professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e consultor jurídico Geraldo Prado complementa o raciocínio afirmando que o caso trata de "imputado sem imputação", conforme teoria do processualista penal italiano Gaetano Foschini . “Trata-se de uma espécie de processo penal de autor em que, ainda que não haja notícia de crime algum a investigar, há visível — e dúplice — obsessão por devassar a vida de uma pessoa, ao custo das garantias do estado de direito. Corretíssimo o caminho seguido [pela defesa de Lula]", elogiou.

Clique aqui para ler a petição de Lula ao STF.

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