Opinião

Em caso urgente, intimação pode ser feita por WhatsApp ou aplicativos do tipo

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27 de fevereiro de 2016, 7h30

Noticiou-se, recentemente, a realização de acordo em processo trabalhista via aplicativo WhatsApp. Realmente, a utilização das novas tecnologias apresenta grandes desafios à prática do direito no Brasil, ainda dominada por uma concepção antiquada, em que o processo judicial é formado por um conjunto de atos essencialmente escritos com papel e tinta, produzidos em audiências presenciais e comunicados às partes e a seus advogados de formas tradicionais (correio, oficial de justiça, diário), onerosas e lentas.

Do ponto de vista do direito processual civil, a utilização do WhatsApp para viabilizar a realização de acordo (transação) não parece oferecer maiores problemas legais, sobretudo quando as partes do conflito convencionarem a sua realização por esse meio. Com efeito, a transação é uma forma de autocomposição de conflitos em que as partes, por meio de concessões mútuas, encontram por si mesmas a solução do problema (Código Civil, artigo 840). Ora, se as partes podem dispor de seus direitos como meio de solucionar o conflito, certamente podem também determinar o procedimento mais adequado para alcançar esse objetivo: reuniões presenciais, intervenção de um terceiro (negociador, conciliador, mediador) ou mesmo troca de mensagens eletrônicas.

No campo do processo judicial, o novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015, com entrada em vigor no mês de março), em seu artigo 334, parágrafo 7º, prevê que a audiência inicial do procedimento comum, destinada unicamente à tentativa de conciliação ou mediação, possa ser realizada por meio eletrônico, “nos termos da lei”. Ora, de acordo com o artigo 1º, parágrafo 2º, inciso I, da Lei 11.419/2006 (que disciplinou a informatização do processo judicial no Brasil), considera-se meio eletrônico “qualquer forma de armazenamento ou tráfego de documentos e arquivo digitais”. Portanto, do ponto de vista estritamente legal, não se vislumbra nenhum empecilho à realização dessa audiência por meio de videoconferência, Facebook, Skype ou mesmo pela troca de mensagens eletrônicas via aplicativos como o WhatsApp.

Além disso, deve-se ter presente a possibilidade, prevista pelo artigo 190 do novo CPC, de que os litigantes de um processo judicial convencionem, de comum acordo, modificações nas regras de procedimento previstas em lei, adequando-as às especificidades da causa. Assim, a partir da entrada desse Código, parece ser perfeitamente possível, por exemplo, que as partes residentes em diferentes Estados da Federação, distantes entre si, estabeleçam a realização da audiência de conciliação ou mediação por meio da troca de mensagens eletrônicas entre os envolvidos.

No que se refere à comunicação oficial de atos do processo às partes ou a seus advogados (citações e intimações), a questão deve ser vista com reservas. Com efeito, a citação é um dos atos processuais mais importantes, pois dá ciência ao réu a respeito da existência da demanda judicial e oportuniza a ele o exercício do direito de defesa previsto na Constituição Federal (artigo 5º, LV). Por isso, o novo CPC (da mesma forma que o anterior) estabelece que a citação é formalidade essencial para a validade do processo. Já a intimação visa apenas a dar ciência a alguém a respeito dos atos e termos do processo.  

Sendo assim, a Lei 11.419/2006 admite que a intimação se dê por meio eletrônico, a qual será feita, como regra geral, por meio de acesso ao portal do Poder Judiciário mediante credenciamento prévio do interessado e sua identificação por assinatura eletrônica (artigos 5º e 2º, parágrafo 1º). Ou seja, é preciso ter a segurança de que o destinatário do ato processual dele teve ciência, o que se alcança por meio das exigências de prévio cadastramento e de identificação por meio de assinatura eletrônica. A mesma regra vale para a citação (artigo 6º).

Ora, o aplicativo WhatsApp não exige a inserção de nenhum tipo de assinatura eletrônica para sua ativação. Ademais, mesmo que o aplicativo em questão ofereça confirmação de entrega e de leitura da mensagem pelo destinatário, não há como saber quem efetivamente a acessou. Basta pensar em um celular furtado ou manipulado (devida ou indevidamente) por terceiro que não o seu usuário. Assim, pode-se concluir, como regra geral, que o WhatsApp não atende ao requisito de segurança exigido pela Lei 11.419/2006. Por isso, não parece ser adequada sua utilização como meio ordinário para efetivação de intimações e muito menos de citações.

Todavia, em se tratando de situações urgentes, o artigo 5º, parágrafo 5º da Lei 11.419/2006 prevê que a efetivação da intimação possa ocorrer por qualquer meio, desde que atinja sua finalidade (isto é, o conhecimento do ato processual), a critério do juiz. Aqui parece haver espaço para a utilização do WhatsApp e de outros aplicativos semelhantes como forma excepcional de comunicação de atos processuais, pois a urgência na efetivação da medida determinada pelo juiz ou na comunicação do ato fazem diminuir a exigência de segurança. A situação não é diferente do que vem ocorrendo há muito tempo com o fax e com o e-mail com confirmação de leitura, meios corriqueiramente utilizados para comunicar advogados de decisões judicias proferidas em regime de plantão (durante a madrugada ou nos finais de semana, por exemplo).

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