Julgamentos controversos

STF interrompeu avanço das liberdades fundamentais no país, diz Celso de Mello

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25 de fevereiro de 2016, 16h43

Ao permitir que condenados em segunda instância sejam presos, mesmo antes do trânsito em julgado, e que o Fisco quebre o sigilo fiscal de contribuintes sem autorização judicial, o Supremo Tribunal Federal deu uma guinada “regressista” à sua jurisprudência e interrompeu a tendência de assegurar liberdades fundamentais aos brasileiros.

Luiz Silveira/SCO/STF
Para o ministro Celso de Mello, em suas últimas decisões, STF deu uma guinada "regressista" à sua jurisprudência.
Luiz Silveira/SCO/STF

Com essa opinião, o decano da corte, ministro Celso de Mello, voltou a criticar os rumos que o STF está tomando. Na semana passada, ele havia dito que o Supremo adotou uma posição “conservadora e regressista” ao autorizar a execução da pena antes que todos os recursos tenham se esgotado.

“Votarei vencido neste caso [quebra de sigilo fiscal pela Receita], que se soma aos dois julgamentos realizados na semana passada em cujo âmbito registrou-se — e digo isto com todo o respeito — preocupante inflexão hermenêutica, de índole regressista, em torno do pensamento jurisprudencial desta suprema corte no plano sensível dos direitos e garantias individuais, retardando, em minha percepção, o avanço de uma significativa agenda judiciária concretizadora das liberdades fundamentais em nosso país”, lamentou o magistrado.

Em seu voto no Recurso Extraordinário 601.314, que tratou sobre o sigilo fiscal, o ministro afirmou que essa garantia visa proteger a privacidade das pessoas de atos arbitrários da administração pública. Por isso, o segredo tributário só pode ser afastado após autorização judicial, avaliou.

Segundo Celso de Mello, apenas o Judiciário tem poder para analisar conflitos entre princípios constitucionais e legais. Assim, “não tem sentido” atribuir tal função a órgãos da administração tributária, os quais “não guardam, em relação ao contribuinte, posição de equidistância”, destacou, alegando que o Fisco não pode deixar de cumprir o caminho indicado na Constituição para obter dados das pessoas — aquele que depende de autorização judicial.   

“O procedimento estatal da administração tributária que contrarie os postulados consagrados pela Constituição da República revela-se inaceitável, senhores ministros, e não pode ser corroborado por decisão desta suprema corte, sob pena de inadmissível subversão dos postulados constitucionais que definem, de modo estrito, os limites — inultrapassáveis — que restringem os poderes do Estado em suas relações com os contribuintes e com terceiros”, argumentou.

Devido ao fato de o sigilo fiscal e bancário ser considerado um direito fundamental, o membro mais antigo do STF ressalta que ele só deve ser quebrado “em caráter de absoluta excepcionalidade, quando existentes fundados elementos que justifiquem, a partir de um critério essencialmente apoiado na prevalência do interesse público, a necessidade da revelação dos dados pertinentes às operações financeiras ativas e passivas resultantes da atividade desenvolvida pelas instituições bancárias”.

De acordo com o ministro, a atribuição exclusiva dessa prerrogativa ao Judiciário não compromete “a efetividade da ordem jurídica, a eficácia da atuação do aparelho estatal e a reação social a comportamentos qualificados pela nota de seu desvalor ético-jurídico”.

Com isso, Celso de Mello acompanhou a divergência do ministro Marco Aurélio e negou a extensão de poderes ao Fisco. Porém, como todos os demais membros do STF votaram pela possibilidade de a Receita usar diretamente os dados dos contribuintes, eles ficaram vencidos.

Clique aqui para o voto de Celso de Mello sobre a quebra de sigilo fiscal.
RE 601.314

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