Retrospectiva 2016

Brasil registrou alta produção legislativa, apesar da crise política e econômica

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29 de dezembro de 2016, 7h37

Pelo menos quatro episódios tinham potencial para influenciar negativamente a produção legislativa em 2016: a) as revelações da “lava jato”, b) o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, c) a eleição municipal e d) a cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha.

Apesar da intercorrência desses fatos e episódios, que poderiam levar à completa paralisia do processo decisório no âmbito do Legislativo, a Câmara e o Senado continuaram deliberando, mesmo com a citação de parlamentares influentes nos escândalos atualmente sob investigação do Ministério Público e da Polícia Federal.

É uma demonstração cabal de que as instituições no Brasil continuam funcionando, a despeito da crise política e até dos embates entre autoridades do Legislativo e do Judiciário e do Ministério Público. É curioso notar que, apesar de toda essa confusão, no período pós-impeachment parece ter havido uma sintonia de atuação dos três Poderes em favor de teses fiscais e liberalizantes, com cada Poder assumindo uma dimensão dessa agenda.

Os poderes e os recursos do Estado, que antes eram majoritariamente destinados para combater desigualdades, proteger os mais necessitados e promover programas de inclusão social, se voltam no pós-impeachment mais para garantir o direito de propriedade, contratos, honrar os compromissos com os credores e contratar serviços no setor privado.

O Poder Executivo, por exemplo, passou a priorizar os aspectos fiscais (corte de despesa e aumento de receitas extraordinárias), conseguindo a transformação em norma jurídica da PEC da DRU (Desvinculação de Receita da União), da PEC do novo regime fiscal ou do congelamento do gasto público, em termo reais, por 20 anos, da lei da repatriação de capitais, da lei com mudanças nas regras de concessões para facilitar leilões, serviços públicos e ainda enviou ao Congresso a proposta de reforma da Previdência.

O Poder Legislativo, por sua vez, tratou da chamada melhoria do ambiente de negócios, facilitando a vida da iniciativa privada, com leis como as que: 1) tratam das parcerias público-privada, 2) abrem o pré-sal para o capital estrangeiro, 3) instituem um novo estatuto jurídico para as empresas estatais, 4) propõem nova governança nos fundos de pensão, 5) reveem o marco regulatório da energia elétrica, além do projetos modificando a lei de licitações, das agências regulatórias, das telecomunicações, entre outras normas.

No Senado, o presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB/AL), foi o principal mentor e impulsionador das medidas em favor do mercado, tanto quando lançou a chamada “Agenda Brasil” quanto quando instalou a Comissão Especial de Desenvolvimento Nacional, na qual nasceram as principais proposições em tramitação na linha da melhoria do ambiente de negócios.

Na Câmara dos Deputados, sob a presidência do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), um parlamentar de origem fiscalista e liberal, a agenda do ajuste fiscal ganhou prioridade, notadamente as proposições que cortam gastos com pessoal, saúde, educação e Seguridade Social, bem como o enxugamento do aparelho do Estado.

O Poder Judiciário, por intermédio do Supremo Tribunal Federal, deu sua contribuição na dimensão fiscal, proibindo a possibilidade de desaposentação e determinando o desconto dos dias paralisados em caso de greve de servidor público, e na revisão da legislação trabalhista, autorizando a prevalência do negociado sobre o legislado em casos específicos, eliminando a chamada ultratividade da norma (que proíbe a vigência de acordo ou convenção além do período de validade) e dando quitação plena aos planos de demissão incentivada, revogando súmulas do Tribunal Superior do Trabalho que asseguram tais direitos.

Produção legislativa
A produção legislativa em 2016, entendendo-se como tal a transformação em norma jurídica de proposições legislativas entre 1º de janeiro e 15 de dezembro, surpreendeu em quantidade e qualidade, considerando as características atípicas deste ano, anteriormente apontadas.

No período foram aprovadas e transformadas em norma jurídica 136 proposições, sendo 129 leis ordinárias, cinco emendas à Constituição e duas leis complementares. Desse total, 58 foram sancionadas ou promulgadas na gestão Dilma e 78 no período Michel Temer. Esses números são equivalentes à produção legislativa, no mesmo período, nos anos de 2013 a 2015, quando a crise política foi menos intensa. Em 2013, foram 117; em 2014, 115; e 2015, 136, resultando numa média de 122.

Quanto à origem, das 129 leis ordinárias: a) 59 foram de iniciativa do Poder Executivo, sendo 36 oriundas de MPs, 13 de Projeto de lei do Congresso Nacional (que trata da matéria orçamentária) e dez de projeto de lei; b) 60 foram de iniciativa de parlamentares e comissões, sendo 36 da Câmara e 24 do Senado; c) oito do Judiciário; d) uma do Ministério Público; e) uma do Tribunal de Contas da União.

Em relação às Emendas à Constituição e às leis complementares, das cinco emendas constitucionais, quatro são de iniciativa de parlamentares, sendo uma da Câmara e três do Senado, e uma do Poder Executivo, e as duas leis complementares são de iniciativa de parlamentares.

Do total de proposições transformadas em norma jurídica (136), somente 14 foram votadas conclusivamente nas comissões das Casas, sendo as demais votadas nos plenários da Câmara e do Senado.

Do ponto de vista qualitativo, conforme mencionado anteriormente, a produção legislativa, especialmente após a chegada de Michel Temer à Presidência da República, priorizou as questões fiscais e os aspectos relacionados à melhoria do ambiente de negócios, notadamente na revisão de marcos regulatórios nas áreas de concessões públicas e na busca de ampliação de privatizações e parcerias público-privadas como forma de atrair investimentos do setor privado da economia.

Além das proposições já transformadas em lei até esta data, há três dezenas de proposições aguardando sanção e pelo menos mais 20 em estado adiantado de tramitação, a maioria das quais nesse mesmo diapasão de controle do gasto público, da “simplificação” administrativa e desburocratização, com redução de cargas burocráticas para facilitar os negócios, com foco nas reformas trabalhista e previdenciária.

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