Opinião

Postura das autoridades justifica aprovação de projeto que coíba abuso

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13 de dezembro de 2016, 14h50

A sociedade brasileira conectada viveu recentemente uma guerrilha virtual de insinuações, alardes e sentenças apocalípticas sobre o projeto de lei, emendado ao pacote anticorrupção, que melhor tipifica o abuso de poder tanto no ato de julgar quanto no ato de se perquirir criminalmente um cidadão. 

A mídia imediatamente replicou a tensão social.  A base da discórdia foi a profunda resistência que setores do Ministério Público tiveram diante do projeto de emenda, feita em momento cabível, mas atacado como inoportuno. O que seria natural de um jogo político, perdeu os contornos de normalidade quando procuradores — reconhecidos pelo trabalho na "lava jato" — adotaram posturas nada heterodoxas e, ao invés de trazerem luz a um debate que uma hora ou outra o Brasil terá que enfrentar (os limites dos poderes), em verdade cercaram o tema com insinuações sombrias e tecnicamente, surreais. 

Levantaram a operação "lava jato" como escudo, insinuando que se “passassem” as novas propostas para os tipos de abuso de poder, seria o fim da operação, que já conta com diversos condenados cumprindo suas respectivas penas. Esse bunker argumentativo não tem vez na aplicação do Direito, pelo simples fato que a lei penal não retroage. Essa regra é de conhecimento geral. Ora, ao se usar o argumento de anulação da "lava jato", ou se desconhece por completo o Direito Penal (o que seria mais assustador ainda vindo de quem veio) ou foi linguagem foi usada com segundas intenções, de maneira a se desviar do necessário debate sobre o problema legislativo em questão. 

O que deixou juristas (advogados, magistrados, professores, membros do MP em todo o Brasil, delegados de polícia etc.) realmente boquiabertos foi a ameaça de se “renunciar” às investigações, especulando que, se abandonarem o “cargo”, a operação irá findar. Além de institucionalmente desconhecida, essa figura de se abandonar um ofício tem implicações administrativas sérias, quiçá penais. Um touché no Parlamento, mas mais ainda no direito posto. Sem falar, claro, na extrema descortesia com os outros procuradores da república de todo o país (no sentido de que ninguém mais seria capaz de tocar a operação) e uma profunda deselegância com os delegados de Polícia Federal à frente da operação, que têm desempenhado um trabalho — em equipe — primoroso. 

No tempo que se discute a regulamentação do lobby no Brasil, não se tem dúvidas sobre para quem vai o Emmy do lobista do ano. De tudo já se foi falado sobre a sua postura: desde uma imensa e condensada infantilidade até a introspecção, por osmose, de como se articular para ganhar tudo e o tempo todo.

O fato é que o nebuloso conceito de democracia demonstrado, o abuso da percepção individual em detrimento da institucional e a lambuzada técnica usada no ataque à emenda legislativa assustaram as pessoas de bem, ainda mais ao se considerar o imenso poder que esse estamento possui. Isso tudo só reforça a necessidade de se ter uma lei que clarifique os limites de atuação dos que representam o Estado na esfera processual, para que o cidadão comum, que é a individualização do povo, tenha o mínimo de defesa.  

Por fim, temos como certo que a proposta apresentada pela OAB no projeto das “10 medidas”, de criminalização da violação às prerrogativas dos advogados que, na verdade, destinam-se à proteção dos cidadãos, deve ser inserida no projeto, garantindo-se a necessária paridade de armas entre acusação e defesa e, ao mesmo tempo, o devido respeito das autoridades públicas aos direitos da advocacia.  

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