Opinião

Criminalização de ofensa a prerrogativas é ponto positivo do pacote anticorrupção

Autor

  • Alberto Zacharias Toron

    é advogado criminalista mestre e doutor em Direito Penal pela USP ex-diretor do Conselho Federal da OAB; ex-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (95/96); membro fundador do Instituto de Defesa do Direito de Defesa e professor de Processo Penal da Faap.

2 de dezembro de 2016, 15h48

O Ministério Público Federal tinha pressa na aprovação da proposta legislativa. Posicionar-se contra era sinônimo de ser contra a "lava jato.

Jogada de marketing? O fato é que as audiências públicas na Câmara deixaram claro que não se tratava "apenas" de 10 medidas, senão de uma profunda modificação no sistema punitivo e, portanto, muito além dos casos de corrupção.

Sabiamente não se castrou o secular Habeas Corpus. Queria-se torná-lo um instrumento estéril, que não questionasse abusos processuais e nem as nulidades que fulminaram operações anteriores como "castelo de areia", "boi barrica" etc.

Também se baniu a esquisitice da "prova ilícita de boa-fé". Por outro lado, as hipóteses de prisão preventiva não foram ampliadas para se permitir a reedição tupiniquim da prisão por dívida.

O famigerado "teste de integridade", pela subjetividade e arbitrariedade que poderia gerar, foi rejeitado.

Mas a corrupção ganhou o rótulo de crime hediondo. Estão banalizando a expressão utilizada pela primeira vez no Tribunal de Nuremberg, que julgou os nazistas.

O aumento das penas e a nova qualificação da corrupção terão o mesmo efeito que a Lei dos Crimes Hediondos de 1990 teve sobre os sequestros, estupros e tráfico: não diminuiu nenhum dos crimes, mas encarcerou por mais tempo. Há prova empírica disso.

Dois pontos aprovados merecem atenção: criminalização da ofensa às prerrogativas dos advogados e previsão do crime de abuso de autoridade para juízes e membros do Ministério Público.

São importantíssimos. A Suprema Corte já acentuou pela voz do decano, ministro Celso de Mello, que a pedra angular do sistema republicano é a responsabilização de todos os agentes públicos, inclusive juízes e promotores.

Todavia, a delicadeza do tema e sua importância reclamavam discussões mais profundas e menos acaloradas.

Apenas para exemplificar, proceder de modo incompatível com o decoro e a dignidade das funções passa a ser crime. Isso é muito vago e pode ensejar arbitrariedades. Ficaria melhor se reservado ao campo administrativo. Propor "ação temerária", isto é, sem base legal, contra agente público se torna crime.

Ocorre que o terreno é pantanoso e pode gerar muitas dúvidas –consequentemente, arbitrariedades. Não se vê, porém, criminalização da conduta de violar sigilo de conversa telefônica interceptada, os vazamentos.

Por fim, em boa hora, aprovou-se a criminalização da ofensa às prerrogativas dos advogados. Estas, ao contrário do que possa parecer, não traduzem privilégio. Destinam-se a garantir a eficácia da atuação do profissional que fala em nome do cidadão dentro e fora dos tribunais.

Como advertiu Celso de Mello: "O respeito às prerrogativas do advogado constitui garantia da própria sociedade e das pessoas em geral, porque o advogado, nesse contexto, desempenha papel essencial na proteção e defesa dos direitos e liberdades fundamentais".

É verdade que desde 1979 na Lei de Abuso de Autoridade de 1965 já trava do assunto, mas sua atualização traz novidade: a OAB passa a ter legitimidade para propor a ação penal em caso de pedido de arquivamento por parte do Ministério Público. Equilibra-se o jogo.

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    é advogado criminalista, mestre e doutor em Direito Penal pela USP, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e membro fundador do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.

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