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Impeachment de Dilma encerra "capítulo doloroso", mas não extingue crise, diz OAB

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31 de agosto de 2016, 18h40

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil afirmou nesta quarta-feira (31/8) que o impeachment de Dilma Rousseff “encerra mais um capítulo doloroso da história política brasileira”, mas não representa o fim da “crise ética” pela qual o país passa.

Em nota assinada pelo presidente Claudio Lamachia, a entidade opinou que esse momento só será plenamente superado se as pessoas adotarem no dia a dia “atitudes concretas para tornar o país melhor”. Além disso, a OAB conclamou os cidadãos a estudarem o histórico dos candidatos a cargos eletivos antes de votar.

Porém, a responsabilidade dos políticos pela crise é maior do que a da sociedade, pois eles devem “liderar”, afirma o documento. Segundo a Ordem, para se diferenciar do governo Dilma, a gestão de Michel Temer deve mostrar que se pauta em valores diferentes dos prezados pelos petistas.

Embora acredite que a mudança de governo traz perspectivas de melhoria, a OAB declarou “repudiar as tentativas de alterações casuísticas na Constituição” – como alguns apontam que ocorreu quando senadores destituíram Dilma, mas não a inabilitaram para exercer funções públicas.

A Ordem ainda garantiu que continuará a lutar contra a corrupção e pelo Estado Democrático de Direito.

Pedido de impeachment
Em março, a OAB apresentou pedido de impeachment de Dilma ao então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Na peça, foram usados como argumentos as transferências orçamentárias promovidas pelo governo federal para pagar programas sociais e compensar subsídios dados à indústria, as “pedaladas fiscais”, e a renúncia fiscal concedida às empresas que participaram de obras da Copa do Mundo de 2014.

No entanto, o pedido que foi levado adiante por Cunha foi o feito pelos advogados Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, focado nas pedaladas fiscais e na abertura de créditos suplementares sem autorização do Congresso.

Leia a nota:

“A condenação de Dilma Rousseff no julgamento realizado no Senado Federal, sob o comando do presidente do Supremo Tribunal Federal, inaugura um novo momento na política nacional.

O impeachment é legal, mas não resolve todos os problemas do Brasil. O impeachment encerra mais um capítulo doloroso da história política brasileira. É uma página a ser virada, mas não esquecida. Dela, é preciso extrair lições para o futuro, para que o país não reincida nos mesmos descaminhos que levaram ao descrédito grande parte da classe política.

A OAB lamenta que a presidente eleita não possa terminar seu mandato. Mas a Constituição é clara ao estabelecer que o impeachment é a punição correta para o chefe de Estado que comete crimes de responsabilidade. É preciso respeitar e aplicar a lei.

Toda a sociedade precisa contribuir para que o Brasil supere a crise ética. Não se pode reclamar das falhas dos políticos e dos poderosos sem adotar, no cotidiano, atitudes concretas para tornar o país melhor. A população não pode se mobilizar só quando as crises chegam a níveis insustentáveis. Cidadãs e cidadãos devem participar da vida pública, tomar consciência que o voto tem consequências. É preciso conhecer muito bem o histórico dos que se propõem a assumir cargos eletivos antes de votar. A eleição para prefeitos e vereadores deste ano é mais uma oportunidade para retirar das prefeituras e das câmaras municipais os políticos que não honram o voto recebido.

Apesar da grande responsabilidade das cidadãs e dos cidadãos, a responsabilidade da classe política é maior. Eleitos para liderar a sociedade, os políticos precisam apresentar bons resultados e bons exemplos.

O novo governo, que chega ao poder pela via constitucional e não por ter vencido uma eleição, precisa conquistar a confiança da população e se pautar por valores distantes daqueles que fizeram o governo anterior perder o apoio da sociedade, chegando a níveis de aprovação mínimos.

Não se pode mais confiar a condução da coisa pública a quem tem um passado repleto de desserviços à nação ou está sob investigação. Também não se pode mais ignorar as necessidades urgentes da sociedade, como a melhoria imediata dos serviços básicos de saúde, educação, segurança e acesso à Justiça. Retirar recursos dessas áreas significa jogar a conta dos problemas econômicos no colo da parcela mais vulnerável da população.

Neste momento, é preciso repudiar as tentativas de alterações casuísticas na Constituição. As perspectivas de melhoria são reais, mas dependem do respeito ao arcabouço legal e aos valores democráticos e republicanos.

Esses são os motivos que levam a OAB a exercer, de forma ativa, o papel que lhe foi atribuído pela Constituição: o de ser guardiã da própria Carta e também dos direitos e garantias individuais. Nesta quarta-feira, o Senado deu um bom exemplo ao decidir aplicar a penalidade estabelecida pela Constituição para manobras fiscais que esconderam da população a real situação do país e provocaram grande prejuízo econômico e institucional.

A OAB não se furtou a dar um parecer técnico mostrando a legalidade do impeachment. Ele foi elaborado em ampla consulta aos representantes legítimos da advocacia brasileira, eleitos pelo voto direto dos quase um milhão de advogados e advogadas do país. A Ordem dos Advogados do Brasil também não se absteve de apontar as falhas do governo interino, assim como pediu formalmente o afastamento do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e a cassação do ex-senador Delcidio do Amaral. Agora, a OAB continuará vigilante para que a Constituição e os direitos dos cidadãos sejam respeitados.

Sem política, não há democracia. Não é hora de ressentimentos ou revanches. É preciso um consenso em torno do bom senso, que ponha em debate todo o sistema eleitoral. É hora de clamar aos representantes da nação para que, acima das divergências político-ideológicas, essência do regime democrático, se unam em torno do desafio comum de reformar a política, tornando-a mais em consonância com a nobre missão que tem, de ser o fio condutor do Estado democrático de Direito.”

Claudio Lamachia, presidente nacional da OAB”

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