Medida equivocada

Gilmar Mendes critica proposta do MPF para colocar limites ao Habeas Corpus

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30 de agosto de 2016, 17h26

A proposta do Ministério Público Federal de restringir o julgamento de Habeas Corpus não resolve o problema do Judiciário e, se aprovada, deve ser derrubada pelo Supremo Tribunal Federal, pois vai retirar direitos do cidadão. Foi o que afirmou o ministro Gilmar Mendes, na noite dessa segunda-feira (29/8), no final de aula proferida na sede paulista do Instituto de Direito Público.

A ideia do MPF, incluída nas chamadas 10 medidas contra a corrupção, é proibir a concessão do HC de ofício, em caráter liminar e sem prévia requisição de informações ao promotor natural. Além disso, o instrumento não poderia mais discutir nulidade, trancar investigação ou processo criminal em curso. Para todos os casos, haveria exceção apenas para evitar a continuidade de prisão manifestamente ilegal.

Carlos Humberto/SCO/STF
Gilmar Mendes falou sobre desafios do Judiciário em aula do IDP, em São Paulo.
Carlos Humberto/SCO/STF

“Não vejo com bons olhos nenhuma restrição ao Habeas Corpus”, declarou Gilmar Mendes à revista eletrônica Consultor Jurídico. “E é muito provável que, se vier por lei alguma restrição, o Supremo derrube.”

Ele afirma que a própria corte criou obstáculos à análise de pedidos de HC antes do julgamento em outras instâncias — como fixa a Súmula 691, aprovada em 2003 —, mas a medida nem sempre é seguida na prática. “Com todas as dificuldades, ainda assim o Supremo aceita 30% dos pedidos.”

O ministro palestrou sobre os problemas enfrentados pelos tribunais superiores, porém disse que os HCs não representam parcela significativa desse cenário. “Não é aí que está a nossa crise. Até porque, em geral, estamos atualizados com Habeas Corpus [no STF]. O problema nosso, basicamente, é a quantidade de Recursos Extraordinários.”

Para ele, um dos temas prioritários seria discutir o número necessário de ministros para aprovar a repercussão geral desses recursos. Atualmente, só são rejeitados casos com manifestação de dois terços, ou seja, oito membros do STF. Gilmar Mendes avalia que a oposição de quatro ou cinco ministros já deveria ser suficiente, pois “hoje a corte admite mais do que tem capacidade para julgar”.

Ele voltou a considerar “absurda” outra proposta do MPF, que torna aceitáveis provas ilícitas quando “o agente público houver obtido a prova de boa-fé ou por erro escusável” e “usada pela acusação com o propósito exclusivo de refutar álibi”.

No evento, Gilmar Mendes disse ainda que o Superior Tribunal de Justiça não conseguiu cumprir o objetivo de aliviar o STF, reconheceu que os juizados especiais criminais deram errado e definiu o Brasil como “república corporativa” — quando presidiu o Conselho Nacional de Justiça, ouviu críticas de defensores públicos a projeto de estudante para ouvir presos de baixa renda.

Destacou ainda que o Plenário do Supremo já conseguiu se desafogar de alguns temas, mandando para as turmas processos sobre extradição e as ações penais que têm réus com prerrogativa de foro por função.

Impeachment e cenário eleitoral
O ministro também considerou “jogo de retórica” o argumento de que é um golpe o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), pois todo o rito foi regulado pelo STF e é presidido pelo presidente do tribunal, ministro Ricardo Lewandowski. “A própria presença da presidente no Senado invalida essa tese”, afirmou.

Questionado se é favorável à saída definitiva de Dilma, Gilmar respondeu que mais importante é que “a situação se defina”, porque “esse quadro de indefinição custa muito ao país”. E defendeu que “não há mais como fugir à reforma política”.

Também presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ele calcula que apenas depois das eleições municipais a corte conseguirá julgar casos de abuso de poder econômico, já que o tempo de campanha tornou-se mais enxuto.

Um ouvinte da aula no IDP perguntou se o ministro tem planos de ser candidato, num cenário de rejeição do eleitoral aos políticos tradicionais. “Pelo amor de Deus!”, respondeu rapidamente.

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