Opinião

Fisco paulistano desestimula exportação de serviços de softwares

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13 de agosto de 2016, 10h42

A Constituição Federal consagrou o princípio da não incidência tributária nas prestações de serviços destinadas ao exterior. E é certo que tal imunidade foi criada com o intuito de tornar o país mais competitivo no mercado internacional – o que, consequentemente, gera mais investimentos e empregos para o Brasil.

Nesse contexto, o setor de desenvolvimento de software desempenha papel crucial, não só porque a economia mundial tem sido pautada por constantes transformações tecnológicas, mas também porque integra as mais diversas cadeias produtivas. Paralelamente, o alto grau de dinamismo e pesquisa característico de tal setor enseja a criação de empregos de alta qualificação.

Empresas brasileiras que prestam serviços de desenvolvimento de software estão sujeitas ao recolhimento do Imposto sobre Serviços (ISS), cuja norma federal de regência, a Lei Complementar 116/2003, reforça a comentada imunidade tributária em seu artigo 2º, I, ao estabelecer textualmente que o imposto não incide sobre exportações de serviços para o exterior.

O parágrafo único do mesmo artigo estabelece que não se enquadram na regra da imunidade “os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior”.

Fundamentando-se equivocadamente na exceção acima transcrita, o Fisco paulistano tem autuado por falta de recolhimento do ISS inúmeras empresas estabelecidas na Cidade de São Paulo que exportam serviços de desenvolvimento de software para contratantes estrangeiros que, de fato, utilizam no exterior os programas de computador desenvolvidos em solo brasileiro.

Para sacramentar seu equivocado posicionamento, o Fisco municipal recentemente editou o Parecer Normativo SF 2, de 26 de abril de 2016, nos seguintes termos:

“Art. 1º Considera-se ‘resultado’, para fins do disposto no parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 13.701 , de 24 de dezembro de 2003, a própria realização da atividade descrita na lista de serviços do artigo 1º da Lei nº 13.701 , de 24 de dezembro de 2003, sendo irrelevante que eventuais benefícios ou decorrências oriundas dessa atividade sejam fruídos ou verificados no exterior ou por residente no exterior.
§ 1º O resultado aqui se verifica quando a atividade descrita na referida Lista de Serviços se realiza no Brasil.
(…)” (sem ênfase no original)

Como se vê, para a Prefeitura de São Paulo apenas haveria exportação de serviços quando estes são prestados presencialmente no exterior.

Contudo, à luz do princípio da territorialidade, uma operação de prestação de serviços ocorrida fora do Brasil nem sequer caracteriza exportação. A rigor, tal operação submete-se à legislação do local no exterior onde os serviços forem prestados. Fosse correta a interpretação do Fisco municipal, sequer seria necessária a citada imunidade tributária, o que tornaria letra morta tanto o texto constitucional como o da referida lei complementar.

O entendimento da Prefeitura de São Paulo ainda desestimula a criação de novos empregos no país, pois parte do pressuposto de que a mera e simples alocação de empregados para a execução dos serviços na cidade de São Paulo torna esses serviços tributáveis.

Sob ótica reversa, admitir por imunes ao ISS serviços prestados presencialmente no exterior consiste em estimular a geração de empregos no exterior.

Oportuno destacar que algumas das empresas autuadas pelo Fisco paulistano são multinacionais que optaram por instalar suas “fábricas de software” no Brasil – gerando aqui centenas de empregos -, e que utilizam no exterior os programas de computador desenvolvidos por suas subsidiárias brasileiras.

Indevidamente, a prefeitura considera “resultado” a própria atividade de prestação de serviços – a qual consiste em atividade meio, que tem como consequência o resultado a que se refere o parágrafo único do artigo 2º da Lei Complementar 116/2003.

Parece óbvio que a expressão “resultado” tem o significado de efeito (ou benefício) gerado pelo serviço prestado. Se assim não fosse, outra conclusão não haveria senão a de que, na prática, a figura jurídico-tributária da exportação de serviços não existiria.

Nos últimos anos, o setor de software tem crescido mais do que o PIB do país, e com certa frequência alguns candidatos à Prefeitura alardeiam a criação de ambiciosos planos de incentivo para a formação de um polo de tecnologia no município de São Paulo. 

Contudo, como diz conhecido provérbio: “o diabo mora nos detalhes”. Pouco ajudam programas de incentivo setorial se o Fisco paulistano espalha insegurança jurídica e afasta investidores ao tornar letra morta um incentivo a exportações que tem fundamento constitucional.

Não há dúvida de que as empresas de software multadas com fundamento na ausência de recolhimento de ISS sobre exportações jamais poderiam prever os transtornos e custos trazidos pelo infundado posicionamento da Prefeitura de São Paulo – até porque o objetivo primordial da norma constitucional, que instituiu a não incidência de ISS sobre exportações, parece ser mais do que cristalino.

Não se pode imaginar maior prejuízo a um ambiente de negócios do que autoridades fiscais punirem, sob precária e enviesada fundamentação, empresas que, de boa-fé, legitimamente buscaram beneficiar-se de incentivo tributário assegurado constitucionalmente.

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