Essencial à Justiça

Defensoria é obrigada a atuar em centro de concilicação, decide TJ-SP

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3 de agosto de 2016, 19h19

Uma vez que a advocacia é indispensável à promoção da Justiça, a Defensoria Pública de São Paulo está obrigada a atuar no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de Marília (SP). A decisão é do Tribunal de Justiça paulista.

A decisão só vai valer a partir do transito em julgado do caso, pois a Presidência do TJ-SP suspendeu os efeitos da tutela antecipada concedida em primeiro grau, ao reconhecer a impossibilidade de a Defensoria atender imediatamente no Cejusc de Marília. O entendimento foi ratificado por unanimidade pelo Órgão Especial da corte na execução de sentença 2173956-04.2015.8.26.0000.

A ação foi movida pelo Ministério Público de São Paulo, depois que denúncias sobre a falta de atendimento dos defensores nos Cejuscs foram apresentadas. Segundo o MP-SP, pessoas reclamaram que, ao pedir ajuda da Defensoria nas conciliações, são informadas que “não é necessária a representação processual da parte em audiências de conciliação”.

“Em um caso, conforme declaração anexa, a reclamante M.H.S.L. procurou a Defensoria Pública na cidade de Marília para solicitar um defensor que pudesse pedir o desarquivamento do processo […], quando a atendente informou para que recorresse ao Promotor de Justiça no foro local.”

Em outro ocorrido, continua o MP-SP, uma mãe foi fazer um acordo sobre a guarda de seus filhos com o pai das crianças, mas acabou consentindo a guarda definitiva sem ter completa ciência do fato. Ela contou ao órgão que a ideia era combinar com seu ex-parceiro a guarda provisória de um ano para reaver seus filhos depois de sanar problemas de saúde e financeiros.

“A requerida estava sem advogado e informou que compareceu até a Defensoria Pública para nomeação de advogado, sendo que lhe foi informado que para audiência de conciliação não seria necessária a nomeação de advogado, sendo que se não tivesse conciliação era para ela voltar na Defensoria Pública.”

O pedido do MP-SP foi concedido em primeiro e segundo graus. Em primeira instância, o juiz Walmir Idalêncio dos Santos Cruz destacou que o atendimento em atos extrajudiciais é previsto no artigo 134 da Constituição. “Note-se que o legislador valeu-se da expressão ‘integral’, por duas vezes, adjetivando o tipo de assistência jurídica devida aos que comprovarem insuficiência de recursos.”

“Não há como negar que a boa orientação jurídica é indispensável para que o assistido tenha melhores condições para transigir, no que diz respeito aos direitos e interesses em litígio e, assim, conciliar-se com a parte ex adversa”, complementou Walmir Cruz.

Em segunda instância, a ação foi julgada pela 3ª Câmara de Direito Público do TJ-SP. A Fazenda Pública e a Defensoria pediram a reforma da decisão alegando a inépcia da inicial. A administração do estado argumentou que o entendimento ia contra a autonomia institucional da Defensoria Pública e que há cerceamento de liberdade da entidade na prestação de suas atividades. Disse ainda que é imposto ao órgão um serviço que exige suplementação orçamentária, pois a defesa não seria prevista.

Porém, os pedidos foram negados. “Para que haja efetiva possibilidade de solução consensual de conflito, é indispensável que o assistido seja orientado juridicamente, com o esclarecimento dos direitos e interesses em litígios e possível sugestão do melhor desfecho do conflito, razão pela qual se faz imprescindível que, na audiência de conciliação, o assistido seja representado por defensor ou advogado nomeado.”

O relator do caso, desembargador Maurício Fiorito, destacou que a participação dos atores da Justiça na resolução extrajudicial de conflitos é um dos destaques do novo Código de Processo Civil. O artigo 3º, em seus parágrafos 2 e 3, ressalta que os métodos alternativos de resolução de demandas serão estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e promotores de Justiça.

“Não pode a Defensoria encobrir a ilegalidade sob o manto da autonomia institucional, inexistindo faculdade em furtar-se ao descumprimento da lei”, complementou o desembargador.

Em novo recurso, novamente negado, o relator negou seguimento por considerar que a via usada não é a adequada para o questionamento. “Nos termos do artigo 1.022 do novo CPC a cognição nos embargos de declaração limita-se ao reconhecimento de obscuridade, omissão, contradição e erro material, não se prestando a discussão de eventual erro de julgamento, matéria que deve ser veiculada na via recursal adequada.”

Em nota enviada à ConJur, a Defensoria diz que vai recorrer da decisão. Argumenta ainda que esse caso é isolado e que só ocorreu porque o órgão não tem pessoal suficiente para atender a demanda, pressionada também pelas audiências de custódia. “Como é notório, não há defensores públicos suficientes para atender a toda a demanda da população carente do Estado – o que gera a necessidade de identificação de demandas prioritárias.”

"Com relação aos Cejuscs, especificamente, a Defensoria tem mantido diversas parcerias em todo o Estado. Em Osasco, o Cejusc foi instalado e funciona dentro da própria unidade local da Defensoria Pública. Em São Vicente, o Cejusc também foi instalado dentro da sede da Defensoria e inicia suas atividades na próxima segunda-feira (8/8). Além disso, há um diálogo frutífero entre Defensoria Geral e o Tribunal de Justiça de São Paulo, com tratativas para ampliação de Cejuscs em outras unidades da Defensoria, além de promoção de mutirões e forças-tarefas com participação de defensores públicos em Cejuscs", explica a Defensoria.

Outros argumentos
Na peça apresentada ao TJ-SP, o MP-SP também cita que as atitudes da Defensoria descumprem Termo de Cooperação Técnica firmado com o TJ-SP para que a entidade auxiliasse os cidadãos hipossuficientes que utilizarem os centros. Questionada pelo MP, a defensoria respondeu que a nomeação dos defensores que atuarão nos Centros ainda não foi possível porque é preciso “que o novo sistema informatizado de centralização das solicitações de indicações esteja pronto, a teor do que prevê a Cláusula Quinta do Mesmo Termo de acordo”.

A cláusula citada define que “os partícipes nomearão seus representantes responsáveis pelo estabelecimento da relação institucional no decorrer da execução do presente termo. Poderão ser nomeados outros executores com a localidade em que os centros forem sendo inaugurados, em tratativas com seus coordenadores.”

O MP-SP afirma também que o artigo 36 do Código de Processo Civil de 1973 determina que a parte será representada em juízo por advogado habilitado. “Na audiência de tentativa de conciliação, por se tratar de processo iniciado, a parte incapaz, representada ou assistida pela genitora, ou outro representante tem direito à assistência de advogado designado pela defensoria, ou assistência de um defensor, o que na prática não acontece.”

Sobre a ausência do sistema, o MP afirma que o argumento é inadmissível. “A parte necessitada não pode sofrer prejuízos em razão de atrasos burocráticos na instalação de sistemas.”

Leia a nota enviada pela Defensoria Pública de São Paulo:

1) A Defensoria Pública de SP apoia todas as iniciativas que buscam evitar a judicialização de conflitos, em especial por meio de mediações e conciliações.

2) Com relação aos Cejuscs, especificamente, a Defensoria tem mantido diversas parcerias em todo o Estado. Em Osasco, o Cejusc foi instalado e funciona dentro da própria unidade local da Defensoria Pública. Em São Vicente, o Cejusc também foi instalado dentro da sede da Defensoria e inicia suas atividades na próxima segunda-feira (8/8).

3) Além disso, há um diálogo frutífero entre Defensoria Geral e o Tribunal de Justiça de São Paulo, com tratativas para ampliação de Cejuscs em outras unidades da Defensoria, além de promoção de mutirões e forças-tarefas com participação de defensores públicos em Cejuscs.

4) A Defensoria não atua diariamente em todos os Cejuscs exclusivamente pelo número insuficiente de defensores públicos e de recursos. Como é notório, não há defensores públicos suficientes para atender a toda a demanda da população carente do Estado – o que gera a necessidade de identificação de demandas prioritárias. De qualquer modo, a Defensoria realiza audiências de mediação e de conciliação em todas as suas unidades que atuam nas áreas cível e família. Isso significa que o público carente que é atendido pela Defensoria Pública possui sim acesso a mecanismos de desjudicialização de conflitos, inclusive com apoio de equipes multidisciplinares, que contam com psicólogos e assistentes sociais. Em Marília, no ano de 2015, foram realizadas 202 conciliações frutíferas, que resultaram em acordos.

5) Com relação ao processo apontado pela reportagem, a Defensoria aponta que a impossibilidade de a Defensoria manter um atendimento próprio e diário no Cejusc de Marília foi reconhecida em decisão da Presidência do TJ-SP, que suspendeu os efeitos das decisões daquele processo, quando do julgamento da suspensão de execução de sentença nº 2173956-04.2015.8.26.0000. A decisão foi mantida posteriormente pelo Órgão Especial do TJ-SP, por unanimidade.

6) Diante desses fatos, em atenção à decisão mencionada pela reportagem, a Defensoria irá recorrer ao STJ e ao STF, oportunamente."

Clique aqui para ler a decisão de primeiro grau.
Clique aqui para
ler o acórdão do Órgão Especial do TJ-SP que suspendeu a antecipação de tutela.
Clique
aqui para ler o voto do relator e aqui para ler o acórdão dos embargos de declaração.
Clique
aqui para ler a peça do MP-SP.

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