Mudança cultural

Obrigar consumidor a tentar conciliar antes de entrar com ação gera polêmica

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20 de abril de 2016, 7h37

Não há consenso no Judiciário sobre a possibilidade de exigir que o consumidor só leve à Justiça uma questão após comprovar que tentou resolver com a empresa por meio de acordo. Para  desembargador Carlos Eduardo Richinitti, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, cabe à Justiça definir isso. Já para o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Paulo Dimas, não é possível criar qualquer obrigação que não esteja prevista em lei.

A discussão foi colocada em pauta nesta terça-feira (19/4), no evento chamado A Era do Diálogo, em São Paulo. Dimas ressaltou que a possibilidade de as pessoas acionarem o Judiciário deve estar sempre aberta. “O Código de Defesa do Consumidor é maravilhoso e temos que possibilitar a chance de o consumidor buscar seu direito, que muitas vezes ele nem sabe qual é”, disse Dimas.

Não que ele considere benéfico o litígio para resolver questões de consumo. O presidente do TJ-SP reiterou que é favorável à busca pela mediação e conciliação, apontando como um problema o excesso de judiciliazação. Mas, na posição institucional de comandante do maior tribunal do mundo, mostrou-se cauteloso e se afastou de uma tese que na prática limita o acesso da população à Justiça.

Fora da mesa, Dimas disse à revista Consultor Jurídico que a crise econômica agrava o excesso de judicialização em casos de consumidor contra empresa. “Já temos um aumento do número de falências e recuperações judiciais e isso se reflete em descumprimento de contratos e o final dessa cadeia é o serviço ruim ao consumidor, que entra com processo”, afirmou. Para ele, o novo Código de Processo Civil, ao privilegiar a conciliação, é mais uma ferramenta para que as "soluções venham da mesa de negociação".

A única resposta
Antecessor de Dimas na presidência do TJ-SP, José Renato Nalini — hoje secretário de Educação do estado de São Pauloconcorda que o CPC é uma ferramenta que vem para ajudar, mas que a questão é muito mais complexa e envolve a formação no curso de Direito.

“Precisamos investir mais na educação. Porque a formação do bacharel em Direito ainda é baseada na crença de que o processo judicial é a única resposta para a lesão ou ameaça a um interesse ou direito. É algo cultural que vai demorar algumas gerações para se eliminar ou reduzir substancialmente. É preciso uma educação no sentido mais amplo, a sociedade precisa se desarmar”, afirmou o desembargador aposentado Nalini.

Preço do descaso
O evento, feito em um hotel na cidade de São Paulo, teve como mote a frase “menos litígio, mais diálogo”. As palestras ocorriam de forma tranquila, com muitos representantes de empresas contando como tem feito para melhorar a relação com o cliente. O tom brando foi interrompido por Claudia Silvano, diretora do Procon do Paraná e presidente da Associação Brasileira de Procons.

Questionada sobre o motivo de tantos processos, ela foi contundente: “A judicialização é o preço do descaso. O consumidor procura o Judiciário devido à desídia da empresa”.

Claudia classificou como precária a atuação das empresas na hora em que são convocadas a se defender em caso no qual o Procon atua. “É uma barbaridade completa, uma falta de respeito. Os advogados parecem ser chamados no corredor do Procon para entrar e representar a empresa na audiência. Eles nem sabem o nome do autor da ação, não sabem nada do caso. Tem preço fazer a coisa certa?”. 

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