Cultura do litígio

Falta de espaço para negociação dificulta recuperações no Brasil, dizem professores

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9 de abril de 2016, 6h44

O Brasil não é um solo propício para a recuperação judicial. A falta de uma etapa pré-judicial, onde os envolvidos no reerguimento da empresa deveriam negociar, impede que se encontre soluções novas para velhos problemas. “Não temos ainda a cultura de preparação para recuperação judicial”, explica o professor, Universidade do Estado do Rio de Janeiro Maurício Menezes .

Em sua fala no 6º Congresso Brasileiro de Direito Comercial, o professor usou a reorganização da General Motors (GM) pós-crise de 2008 para exemplificar como uma organização anterior ao contato com o Judiciário pode resolver muitos entraves e reduzir, ou até inibir, a litigiosidade. O evento ocorreu em São Paulo, no prédio da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), nesta sexta-feira (8/4).

No caso da GM, o maior credor da empresa foi o governo dos EUA, que aportou US$ 30 bilhões na empresa em parcelas, e, no fim de todo o processo, recebeu US$ 39 bilhões. Todo o trâmite judicial demorou 40 dias, mas as negociações se arrastaram da metade do segundo semestre de 2008 até os primeiros meses de 2009.

O caso mostra como o financiamento de empresas em recuperação pode ser positivo e até lucrativo, sem esquecer de que o credor sempre buscará o maior ressarcimento possível. “Enquanto não entendermos isso, continuaremos batendo cabeça”, criticou o professor.

O professor da FGV-Rio Marcio Guimarães explicou que para haver um ambiente fértil à recuperação judicial é necessário confiança entre devedor e credores, além de acesso a crédito pela empresa recuperanda. “Mas não temos isso hoje”, ponderou.

Nos Estados Unidos e em alguns países na Europa, por exemplo, começa a ganhar força uma modalidade de fornecimento de crédito para essas empresas, o DIP financing (debtor-in-possession financing), que seria uma espécie de financiamento do devedor.

Mauríco Menezes, da Uerj, defendeu a tese de que é necessário conceder benefícios a quem financia o plano de recuperação judicial das empresas, mas ponderou que o fortalecimento dessa prática merece atenção. Isso porque os credores também buscam exercer influência em todo o processo para terem mais garantias de que receberão a quantia devida. “É necessário haver pesos e contrapesos”, disse. Ele destacou que a falta de legislação que trate de incentivos a empresas em recuperação dificulta ainda mais a manutenção da atividade produtiva.

“Nosso sistema oferece mais risco”, sintetizou o professor Franciso Satiro, da Universidade de São Paulo. Como exemplos dessa insegurança, listou o crédito caro, pois o banco precisa manter quantia similar ao valor emprestado contingenciado; a demora na venda de bens para quitação de dívidas; e a falta de transparência.

Menos orgulho
Em sua fala, Marcio Guimarães deu uma dica para os advogados. Ele afirmou que os profissionais do Direito, ao apresentarem uma petição pedindo a recuperação, esquecem de detalhar os problemas — o que seria essencial para os credores e devedores da companhia auxiliarem na sua recuperação. "Falam tanto do passado glorioso e dos pontos positivos das companhias que nem parece ser um caso de resgate da situação financeira".

Menezes complementou, dizendo que muitos procuram a Justiça esperando que o sistema resolva os problemas da recuperação, mas o sistema deve servir como garantidor e fiscalizador das atitudes que serão tomadas.

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