Bodas de prata

Código de Defesa do Consumidor completa 25 anos nesta sexta com ajustes pontuais

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11 de setembro de 2015, 14h06

As relações de consumo exigem, tanto do consumidor quanto do fornecedor do produto ou serviço, cortesia, boa-fé e presteza, entre outras variáveis. Porém, quando esse relacionamento não funciona, é comum que a parte lesada na transação comercial busque a reparação de seus danos na Justiça. Para normatizar essa questão, há 25 anos foi promulgado o Código de Defesa do Consumidor.

Para as advogadas Maria Stella Gregori e Maria Inês Dolci, mesmo depois de duas décadas e meia de existência, não há nada no CDC que deva ser alterado, apenas aprofundado. “Eu acho um código bastante inovador e democrático, pois, na sua elaboração, ele contou com a participação da sociedade”, afirmou Maria Stella. Já Maria Inês diz que o código “representa um grande avanço” e que as atualizações feitas ao longo do tempo de vigência foram pontuais.

Sobre essas modernizações, atualmente três projetos de lei (281, 282 e 283) tramitam no Senado e buscam normatizar as relações de consumo na internet, sanar o problema do superendividamento e aperfeiçoar as ações coletivas motivadas por relações de consumo, mesmo em casos relacionados a direitos individuais de homogêneos.

Apesar disso, mesmo com projetos sobre problemas mais atuais, a lista do Procon de São Paulo com as práticas abusivas mais frequentes contra os consumidores ainda contém incongruências antigas. Veja abaixo a relação:

  • recusa do fornecedor de entregar o documento fiscal da compra do produto ou do serviço contratado;
  • obrigar o consumidor a contratar um serviço ou adquirir um produto para adquirir outro, a chamada venda casada;
  • impor limites de quantidade para aquisição de produto sem justa causa;
  • recusar venda de produtos ou prestação de serviços mediante pagamento, exceto se houver justo motivo;
  • enviar ou entregar produto ou prestar serviço ao consumidor que não tenha solicitado;
  • impor limite de valor mínimo para pagamento com cartão de crédito à vista ou débito;
  • executar serviço sem a prévia elaboração do orçamento e sem autorização expressa do consumidor;
  • praticar preços distintos para pagamento em dinheiro e cartão de crédito (em uma parcela) ou débito;
  • impor cobrança de multa pela perda do cartão de consumação em casas noturnas;
  • constranger o consumidor na cobrança de dívidas.

Efeitos no Judiciário
Para o advogado Francisco Antonio Fragata Júnior, os efeitos do CDC no Judiciário “foram devastadores”. Ele afirma que esses reflexos podem ser notados no aumento do número de processos e pela maneira simplória que o Poder Judiciário não se aprofundava em certas situações envolvendo as relações de consumo devido ao uso do Código Civil e do Código Comercial existente antes do CDC. “O início não foi muito bom para os consumidores. Depois, a situação se inverteu. E hoje em dia está se buscando o meio termo”, explica.

Já o advogado Luis Carlos Laurenço considera que o Judiciário não consegue assegurar uma prestação jurisdicional eficaz a consumidores e fornecedores. Segundo ele, muitas das questões suscitadas pelos fornecedores não são devidamente apreciadas. “Muitas vezes você apresenta provas documentais que não são analisadas de maneira minuciosa pela corte. Isso ocorre porque o Judiciário ainda é tendencioso a proteger de forma excessiva os consumidores”, relata.

Vulnerabilidade do consumidor
Além de congestionar o Judiciário, essas práticas abusivas também servem como argumento para classificar o consumidor como o elo mais fraco da cadeia de consumo. De acordo com a advogada Élida Lima Martins, esse entendimento é necessário. “O reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor é um dos maiores avanços do CDC”, afirma.

Maria Stella Gregori ressalta que esse noção de vulnerabilidade pode ser vista claramente na questão do superendividamento. Ela explica que os fornecedores de crédito devem fornecer melhor as informações, pois “cabe a eles a responsabilidade de dar educação para o consumo”.

De acordo com o Procon, em 2014, as instituições financeiras foram o segundo maior motivo de reclamações por consumidores, com mais de nove mil queixas, perdendo apenas para o ramo das telecomunicações (12 mil representações). Veja os segmentos mais reclamados:

Segmentos mais reclamados
Telecomunicações 12.150
Instituições Financeiras 9.281
Microcomputador / Produtos de Informática 3.920
Aparelho Celular 3.375
Produtos de Linha Branca 2.371

Excessos dos consumidores
O CDC é ligado diretamente às necessidades do consumidor, porém, essa parte da relação de consumo tem razão ao reclamar, ou muitas vezes se excede. Em um caso julgado neste ano, uma consumidora foi condenada a indenizar em R$ 2 mil uma empresa de móveis devido a ofensas infundadas no site Reclame Aqui. A cliente havia comprado alguns produtos do mostruário e, no ato de entrega das mercadorias, assinou termo de recebimento sem reclamar.

Porém, tempos depois, ela começou a criticar as aquisições feitas ao perceber que o tecido de uma das poltronas estava rasgado. Com as reclamações, a empresa se prontificou a trocar o produto, desde que a diferença de preços fosse quitada. Desse modo, a consumidora publicou críticas na internet. Ao analisar o caso, a Justiça lembrou que todos têm o direito a reclamar, mas que há limites para a prática.

Maria Inês Dolci concorda que o consumidor comete alguns excessos em certas ocasiões, mas que isso seria um efeito da falta de infraestrutura de atendimento dos fornecedores. “A empresa tem que responder ao consumidor rapidamente e capacitar os atendentes, justamente para evitar esses excessos”, diz. Élida Lima Martins segue esse mesmo raciocínio e diz que as empresas devem estar preparadas para atender um consumidor cada vez mais preparado, exigente e consciente. “O mercado deve aprimorar a comunicação da oferta.”

Já Luis Carlos Laurenço afirma que há casos em que o excesso no ato de reclamar decorre da falta de conhecimento do consumidor sobre seus direitos ou por má-fé. “Muitos consumidores vão ao Judiciário pleitear um direito que não têm. Muitas vezes, pleiteiam coisas absurdas”, diz. Segundo ele, isso também é resultado de uma “interpretação muito mais favorável aos consumidores” pelo Judiciário.

Francisco Antonio Fragata Júnior também considera que o CDC privilegia o apenas o consumidor. Segundo ele, existem poucas normas que regulam o abuso dos consumidores, entre elas o artigo 4º, inciso III, que determina a necessidade de haver harmonia entre os “interesses dos participantes das relações de consumo”. “Hoje em dia, temos decisões judiciais penalizando consumidores abusivos, mas ainda encontramos alguns com dezenas de reclamações e que praticamente vivem disso. Muito poucos, felizmente”, finaliza.

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