Cortes à vista

Ministérios públicos estaduais acendem alerta para gastos com pessoal

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14 de outubro de 2015, 8h07

O crescente aumento dos gastos públicos sem que haja a correspondente ampliação das receitas públicas afeta não somente os governos estaduais, que têm feito malabarismos para arcar com seus compromissos sem ultrapassar os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000). Os ministérios públicos estaduais estão de alerta ligado.

A lei estabelece que nesses órgãos a despesa com pessoal não ultrapasse 2% da Receita Corrente Líquida do estado. Por enquanto, nenhum MP atingiu essa marca, mas dois estão bem próximos, acima do limite prudencial de 1,9%: Rio Grande do Norte (1,98%) e Sergipe (1,92%). Devido a isso, esses MPs já devem adotar uma série de medidas previstas na lei, como por exemplo o corte em reajustes salariais e o congelamento de contratações.

Além desses dois MPs, em outros seis a despesa com pessoal está acima de 1,8%, considerado o limite de alerta: Acre, Amapá, Ceará, Maranhão, Minas Gerais e Paraná. E a tendência é que os gastos aumentem até o fim do ano. De acordo com os relatórios de gestão fiscal publicados em setembro, somente Maranhão, Rio de Janeiro e Paraná reduziram o percentual de gastos com pessoal no último quadrimestre.

Limite prudencial
Preocupam os dois casos em que o limite prudencial foi atingido. Apesar dos cortes já efetuados no primeiro quadrimestre de 2015, quando foi constatado que ultrapassaram o limite de 1,9%, os ministérios públicos do Rio Grande do Norte e de Sergipe apresentaram novo aumento no segundo quadrimestre.

No RN, o procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, explica que o aumento na porcentagem de gastos com pessoal se deve à situação econômica do estado, que está ruim. "Há um crescimento vegetativo da folha, devido aos anuênios e progressões, entre outros. Por outro lado, temos um decréscimo da receita. Isso faz com que nosso percentual aumente", afirma.

Segundo ele, diversas medidas já foram tomadas, como a paralisação das nomeações e o reajuste dos servidores abaixo da inflação. O objetivo, segundo o procurador-geral, é não ultrapassar o limite de 2%. "Agora, se a receita continuar caindo, é possível que a gente atinja essa marca. Com isso, teremos que fazer cortes mais drásticos, conforme estipula a lei", conta.

A Lei de Responsabilidade Fiscal determina que, ao atingir o limite máximo, os MPs adotem uma série de medidas para reconduzir os gastos aos limites da lei. Entre essas providências está a redução de pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança, além da exoneração de servidores não estáveis.

Em Sergipe, a redução de despesas com pessoal começou em dezembro de 2014. Entre as medidas adotadas estão os cortes de diárias e passagens, redução de terceirizados e a não designação de servidores para substituir, durante períodos de férias ou licenças, outros que exercem cargos em comissão. Essas medidas geraram uma economia de mais de R$ 10 milhões. 

Apesar disso, o percentual de gastos com pessoal em relação a receita do estado aumento. Eduardo Barreto d'Avila Fontes, procurador-geral de Justiça em exercício, explica que a economia, assim como acontece no RN, é uma das causas para o Ministério Público de Sergipe ultrapassado a marca de 1,9%.

"Sem sombra de dúvidas, há relação entre a crise econômica e o aumento das porcentagem dos gastos com pessoal, haja vista que mesmo que as despesas permaneçam inalteradas e a receita corrente líquida venha caindo, situação atual do país, esse fator automaticamente reflete no aumento desse percentual", diz.  

Medidas preventivas
Com a tendência de crescimento dos gastos com pessoal, alguns ministérios públicos já adotaram medidas preventivas e começaram a cortar gastos antes da imposição da lei. Em Goiás, onde o percentual está em 1,55%, o Ministério Público adotou medidas de redução das despesas com vigilância armada, estagiários, concessão de diárias para os integrantes e na aquisição de insumos em geral.

Em Minas Gerais, uma resolução suspendeu a realização de concursos públicos, nomeação de novos membros, servidores e de cargos em comissão. Ao todo, foram 12 medidas adotadas para redução de gastos. Todas foram publicadas no Diário Oficial do dia 19 de setembro.

Em Rondônia, para evitar um aumento na folha de pagamento de pessoal, as contratações de servidores estão suspensas, liberadas apenas nos casos de substituições. Além disso, de acordo com o secretário-geral do MP-RO, promotor Jesualdo Eurípedes Leiva de Faria, este ano não está previsto qualquer tipo de reajuste para os servidores, inclusive os 5% que foram concedidos a funcionários de outros poderes, como Tribunal de Justiça e Tribunal de Contas.

No Amapá, o procurador-geral de Justiça, Roberto da Silva Alvares, publicou ato normativo no dia 30 de setembro estabelecendo uma série de medidas, entre elas a suspensão da contratação de estagiários e terceirizados. Além disso, o ato veda a cessão de servidor que onere o MP-AP e suspende as licenças para tratar de assuntos particulares e as autorizações para pagamento de horas extras. Até mesmo os serviços de buffet em encontros e reuniões foi proibido. Só sobrou água e o cafezinho com açúcar.

Fiscalização dos gastos
A responsabilidade por fiscalizar se os gastos do Ministério Público estadual estão em conformidade com a lei é do Tribunal de Contas do estado. Além dele, cabe também ao Conselho Nacional do Ministério Público a fiscalização administrativa, financeira e disciplinar dessas instituições e de seus membros.

"O CNMP tem como uma de suas atribuições acompanhar e controlar tanto a parte administrativa quanto a parte financeira de cada MP", explica Flavio Rubinstein, professor de Direito Tributário e Finanças Públicas da FGV. Segundo ele, cabe ao CNMP tanto o papel de orientar e advertir os ministério públicos que estiverem próximos ao limite, como também de impor providências. "Pode, por exemplo, ao perceber que tem um problema de gastos, proibir novos concursos e contratações de pessoal, bem como determinar que sejam tomadas medidas para readequação desses gastos aos limites legais."

O professor explica ainda que seria possível responsabilizar o procurador-geral do MP estadual em uma eventual ação de improbidade ou até mesmo de apuração de crime de responsabilidade. No entanto, isso só se justificaria em caso de inércia do procurador-geral. "O fato de extrapolar, em si, não implicaria automaticamente responsabilidade do procurador-geral. O crime de responsabilidade, em especial, pressupõe uma conduta dolosa", diz. 

Assim, explica Rubinstein, se ele tomou as medidas necessárias para correção do problema, não haveria responsabilidade pessoal. O professor e advogado faz questão de destacar ainda que parece improvável uma eventual responsabilização de algum procurador-geral. "Não consigo pensar que haja algum procurador que não tome as medidas que estejam ao seu alcance para respeitar os limites de gastos com pessoal. São pessoas muito preparadas e que ascenderam na hierarquia das instituições que chefiam, as quais cumprem um papel constitucional de defesa do interesse público. Os procuradores-gerais em especial, e os demais membros dos ministérios públicos em geral, costumam levar essa questão da lisura muito a sério", complementa.

Veja a evolução das despesas com pessoal nos MPs estaduais:

 

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