Prisão indevida

Estado é condenado por erro grosseiro
de identificação na fase indiciária

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13 de outubro de 2015, 20h14

Prisão indevida e injusta, causada por equívoco grave e imperdoável dos agentes do poder público, enseja danos morais na modalidade in re ipsa, que independe de comprovação, por presunção de sofrimento. Por verificar essa situação, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que condenou o estado a pagar R$ 30 mil a um homem que, confundido com traficante de mesmo nome, permaneceu preso por seis dias em abril de 2010. Ele ainda seria detido por algumas horas 15 dias depois de ter a sua prisão relaxada, após verificado engano, porque o mandado judicial constava como ‘‘pendente de cumprimento’’ na delegacia.

O autor só conseguiu sua liberdade após contratar advogado, que juntou ao inquérito policial a certidão negativa de antecedentes. Com isso, juiz e promotor que atuaram no caso perceberam que ele não poderia ser a mesma pessoa que vinha sendo investigada por coautoria dos crime de tráfico e associação para o tráfico por meio de instruções e ordens transmitidas de dentro de uma penitenciária.

Nos dois graus de jurisdição, houve entendimento unânime de que todo o equívoco ocorreu pela desconsideração do que prevê o artigo 6º, inciso VIII, do Código de Processo Penal. O dispositivo diz que, tão logo tome conhecimento da infração penal, a autoridade policial deve identificar o indiciado pelo processo papiloscópico (por meio de impressões digitais) e ainda juntar aos autos a folha de antecedentes. Se isso tivesse sido observado, teria ficado claro que o autor não se tratava do criminoso interceptado nas ligações telefônicas, pois não tinha qualquer registro policial contra si e, por decorrência, jamais esteve preso. Bem ao contrário de seu homônimo, apurou-se mais tarde, que continua preso na Penitenciária Estadual do Jacuí — o verdadeiro alvo da investigação.

O juiz Ivan Fernando de Medeiros Chaves, da 2ª Vara Cível de São Leopoldo, escreveu na sentença que a confusão seria perfeitamente evitável se os agentes públicos incumbidos pela persecução penal, no âmbito de suas respectivas competências, averiguassem e fiscalizassem o adequado cumprimento dos pressupostos legais de uma segregação cautelar. ‘‘Entretanto, o que se observa dos autos é que nem o Ministério Público nem o estado-juiz observaram o descumprimento da Lei Processual Penal pela autoridade policial. A falha cometida apenas foi sanada com a atuação da defesa do então réu’’, destacou Chaves.

O relator da apelação, desembargador Carlos Eduardo Richinitti, escreveu no acórdão que a situação vivida pelo autor evidencia ‘‘erro grosseiro’’ que, embora originada na polícia, se estendeu aos demais agentes da persecução penal. E a situação só não foi mais grave porque, após a intervenção do advogado, o próprio membro do Ministério Público admitiu o erro na identificação da pessoa ouvida nas interceptações telefônicas.

Para Richinitti, esse erro na fase indiciária maculou a imagem e a boa fama que o autor mantinha no meio social, tanto que sua prisão foi noticiada pela imprensa. E até que fosse confirmado o equívoco estatal, discorreu no voto, a sua reputação sofreu prejuízo de difícil reversão. ‘‘Tanto assim que, segundo a prova testemunhal, o autor acabou tendo sérias dificuldades para se reinserir no mercado de trabalho após o evento lesivo’’, concluiu. O acórdão foi lavrado na sessão de 30 de setembro.

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