Danos póstumos

Nos EUA, homem negro processa policial que planejou suicídio para incriminá-lo

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16 de novembro de 2015, 7h38

Antes de se matar com um tiro na cabeça, o policial Charles Joseph Gliniewicz, da vila de Fox Lake, em Illinois (EUA), fez uma última maldade: armou uma cena para que seu suicídio parecesse um homicídio, em que o principal suspeito seria um homem negro que ele, um policial branco prometera prejudicar um dia.

O crime renderia pena de morte para Vernon Randolph III, 26, com anos no corredor da morte. Essa é a punição para quem mata um policial nos EUA, conforme definido pelo Conselho de Sentenças, nos estados que ainda têm pena de morte. Nos demais, vale a prisão perpétua.

Os problemas de Vernon Randolph III com o policial começaram em 2014, por causa de um desentendimento. Desde então, o policial o parava frequentemente na rua, para revistar seu carro e buscar drogas. O policial o ameaçava em todas as ocasiões, de acordo com os jornais.

Farsa
No entanto, os líderes da vila conheciam o histórico de má conduta do policial — e a polícia também. Com uma investigação mais apurada e com toda a tecnologia de hoje em dia, não foi difícil determinar que o caso era de suicídio. Nenhum dos três suspeitos poderia ter matado o policial.

Vieram à tona a vida pregressa do policial e a história do suicídio armado para parecer assassinato, para punir um desafeto. E, na sexta-feira (13/11), o advogado de Randolph, Kevin O'Connor, moveu uma ação civil contra a vila de Fox Lake e o espólio de Gliniewicz, por danos, em um tribunal federal.

Afinal, ele foi submetido a constrangimentos, seus direitos civis foram violados e foi tratado, por sua cor, como o principal suspeito de um crime que não existiu, por um Departamento de Polícia que conhecia o histórico de Gliniewicz e, apesar disso, o promoveu a tenente.

Plano
No dia em que Gliniewicz decidiu se matar, ele foi informado, por alguns líderes da vila, que sua carreira de mau policial (e de mau cidadão) iria chegar ao fim. Comprovou-se que ele roubara milhares de dólares de um programa para jovens que ele dirigia. O escândalo estava para estourar e ele seria denunciado, segundo o Chicago Tribune, o Daily Herald e outras publicações.

Na esteira dessa denúncia anunciada, iria emergir um histórico de mau comportamento do policial, como má conduta sexual, confusões decorrentes de embriaguez, alegações de ameaças e outros problemas que a polícia e os líderes da vila conheciam, mas encobriam.

Ele chamou a delegacia, por rádio, para avisar que estava perseguindo três homens perigosos, um negro e dois brancos, perto da velha fábrica de cimento da vila. Descreveu o homem negro com mais detalhes, para que seus colegas policiais não tivessem muitas dificuldades para identificá-lo e prendê-lo.

Perseguição
Depois que o corpo do policial foi encontrado, a polícia mobilizou 100 homens, incluindo agentes do Bureau do Álcool, Tabaco e Armas de Fogo, e iniciou uma caçada humana. O comércio foi fechado, estudantes foram colocadas em confinamento nas escolas e a população foi alertada a não sair de casa.

Com todo esse aparato, a polícia localizou Randolph, o “principal suspeito”, e seus dois supostos comparsas em pouco tempo. Dezenas de policiais cercaram e apontaram armas para Randolph e seu filho. Revistaram pai e filho e fizeram uma busca na casa de Randolph. Interrogaram duramente o “suspeito” e colheram material para um exame de DNA.

Na época, Gliniewicz ainda recebeu homenagens póstumas como herói, um homem de família e um modelo de vida para os jovens para os quais dedicava seu trabalho nas horas vagas, nos dias que se seguiram a sua morte.

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