Opinião

Concorrência na era do Big Data para o bem-estar do consumidor

Autor

  • Vicente Bagnoli

    é professor do Insper Direito da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie pesquisador visitante do Instituto Max Planck de Inovação e Concorrência — Munique e presidente da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP.

13 de novembro de 2015, 6h25

Artigo produzido por especialistas do Insper. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

O termo Big Data refere-se aos conjuntos de dados cujo tamanho está além da capacidade de uma ferramenta tradicional de banco de dados capturar, armazenar, gerenciar e analisar, representando a próxima fronteira para inovação, concorrência e produtividade. Diz respeito aos dados tão grandes em volume, tão diversos em variedades e movimentando-se em tal velocidade, que os meios tradicionais de captura e análises são insuficientes ou economicamente inviáveis. Caracterizado comumente pelos 3V’s, que em inglês são: volume (great volume), variety (various modalities, types of data) e velocity (rapid generation, processement of data), com o tempo outros V’s passaram a identificar o Big Data: value (valor), veracity (veracidade) e validation (validação). O Big Data, portanto, caracteriza-se pelos 6 V’s.

Concorrencialmente, pode-se entender Big Data a capacidade de coletar, processar e analisar um grande volume e uma vasta variedade de dados em espaço de tempo suficiente para a obtenção de informações que conferem ao seu detentor capacidade para estabelecer estratégias empresariais e, em algumas situações, caracterizando-se uma facilidade essencial, um poder de mercado e até mesmo uma posição dominante para unilateralmente interferir no funcionamento do mercado. 

Conforme observa a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em seu relatório The Digital Economy (2012; p. 5), a concorrência em mercados digitais tem características próprias, incluindo tendências como “winner takes all”, os efeitos de rede, mercados de dois lados (two-sided markets), ritmo acelerado de inovações e altas somas de investimento. A natureza cíclica da concorrência significa que plataformas digitais bem-sucedidas tendem a adquirir poder de mercado significativo, porém transitório. A economia digital também se caracteriza e tem como essencial a concorrência dinâmica, baseada em ciclos contínuos de inovação, desenvolvimento e rupturas.

O Big Data, compreendido como um fenômeno tecnológico e a sua vasta variedade de potencial de uso para a análise de grandes volumes de dados, exige reflexões acerca da eficiência das leis atuais e dos padrões éticos da sociedade para proteger a privacidade, assegurar a concorrência e o bem-estar do consumidor. 

Ao analisar o Big Data pelo viés concorrencial, acaba-se entrando em temas relacionados à defesa do consumidor e proteção de dados. Significa dizer que respostas para questões relacionadas ao Big Data no tocante à livre concorrência, consumidor e proteção de dados, podem ser dadas em conjunto.

Muito se discute acerca de medidas pontuais de defesa dos consumidores e proteção de dados. Na era da informação digital os indivíduos estão interligados pela internet. A rede, portanto, inclui os indivíduos, que passam a fazer parte de uma comunidade global, sem fronteiras. Para fazer parte desta comunidade o indivíduo deve se interligar com outros indivíduos que utilizam emails, redes sociais, aplicativos, e na maioria das vezes a única moeda aceita pelos provedores desses serviços são as informações pessoais do indivíduo.

Ocorre, que enquanto o foco for apenas o consumidor a visão do tema permanecerá míope. Deve-se preocupar com o bem-estar do consumidor, sobretudo, a partir do viés concorrencial. Isso porque, a concentração econômica, via de regra, limitadora dos agentes que concorrem no mercado, faz com que os consumidores estejam envolvidos no efeito rede. Se por um lado, quanto mais usuários torna um serviço mais atraente ao interligar as pessoas, por outro, o consumidor acaba obrigado a aderir a tal serviço, sujeitando-se as exigências ou contrapartidas impostas pelo agente econômico, caso contrário estará fora da rede, vale dizer, fora do mundo.

Essa concentração econômica, sobretudo por dizer respeito aos mercados de dois lados ou até mesmo multiplataformas, também afeta a competição de agentes menores, que em assimetria de informação dificilmente conseguem competir com agentes que atuam em diversos patamares do mercado e processam o Big Data ao seu favor.

Na era do Big Data, os benefícios trazidos por esta revolução só serão efetivos ao consumidor com a implementação de medidas de proteção de dados, mas, sobretudo, com a existência de um ambiente necessariamente competitivo, onde a livre concorrência será capaz de conter eventuais abusos do poder econômico.

Autores

  • é professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, presidente da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP e conselheiro do IBRAC.

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