Candidato à reeleição

Felipe Santa Cruz quer criar portal da transparência para OAB-RJ

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13 de novembro de 2015, 15h34

OAB/RJ
OAB-RJ

Três anos foram poucos para o atual presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro, Felipe Santa Cruz. O advogado decidiu se candidatar à reeleição, no pleito marcado para o próximo dia 16 de novembro. E por um motivo simples: dar continuidade a um trabalho que, segundo ele, conta com a aprovação de 80% dos profissionais fluminenses.

Entre as propostas de Santa Cruz para o novo mandato, destaca-se a criação de um portal da transparência para a OAB-RJ. “Vou criar um portal de transparência na OAB do Rio de Janeiro, com as contas e as contratações. Esse é um projeto maior, que não conseguimos fazer nesta administração. Nós devemos dar o exemplo, nos antecipar”, disse o candidato, destacando que já colocou a medida em prática com relação à própria campanha, apesar de não haver regra expressa que o obrigue.

“Criei um CNPJ e deposito as contribuições de escritórios e de advogados na mesma conta para que, depois, a gente tenha um demonstrativo disso. Acho que poderia ser uma medida interessante”, frisou.

Em entrevista à ConJur, Santa Cruz diz o que pensa sobre a missão da OAB; os projetos de lei que visam extinguir o Exame de Ordem e submeter a entidade ao controle de órgãos como o Tribunal de Contas da União; a atuação de advogados estrangeiros no Brasil e reserva de mercado; a relação com os poderes Executivo e Legislativo; a crise econômica e política; e a eleição direta para a presidência do Conselho Federal, entre outros temas.

O candidato defendeu a construção de uma “Ordem viva”: crítica, mas também proativa no sentido de propor soluções. “Não podemos ter uma OAB que só faça comentários gerais e que viva de comentar jornais ou episódios da política. A outra [missão] é a defesa da Constituição. Nosso partido é a Constituição e nossa luta é a democracia e o Estado Democrático de Direito. Não é à toa que a advocacia foi constitucionalizada no artigo 133. A OAB e a advocacia brasileira são a gênese do sonho do constituinte em construir uma sociedade realmente com acesso à justiça”.

Leia a entrevista:

ConJur — Existe uma carta de intenções da chapa? O que ela prevê?
Felipe Santa Cruz —
Houve um documento na minha primeira campanha. Temos muita confiança no trabalho que a gente fez nestes três anos. Basicamente, nosso compromisso é seguir a mesma linha de trabalho que a advocacia já conhece e aprova. Há uma pesquisa do Ibope que mostra 80% de aprovação à nossa gestão. Esse é um índice muito expressivo. Achamos que essa aprovação é fruto de um trabalho que tem que ser mantido e ampliado.

ConJur — O que o senhor pretende ampliar?
Felipe Santa Cruz —
A Ordem ocupou um espaço institucional no Rio de Janeiro muito forte, principalmente a partir das manifestações de 2013. Temos um protagonismo na vida do Rio de Janeiro, que se dá de uma forma construtiva. Não somos uma entidade que ataca. Somos uma entidade independente que propõe alternativas e que busca ser parte da solução do problema ao promover o debate, trazer propostas, mediar conflitos. Vamos manter isso. Outra coisa é manter a linha de produção das comissões. Temos 92 comissões funcionando. O prédio da Ordem e das subseções estão sempre repletos de eventos e pessoas. Esse é um dos compromissos: manter Ordem viva, representando o conjunto da advocacia e servindo à sociedade.    

ConJur — Que projetos o senhor tem especificamente para os advogados?
Felipe Santa Cruz —
Fizemos grandes projetos, como o de inclusão digital. Vou focar agora na questão do novo Código do Processo Civil. Entendo que se nós não qualificarmos a advocacia para o novo CPC, poderemos colocar em risco as conquistas da advocacia e da cidadania que estão no texto da lei. Então, vamos preparar a advocacia para isso. Já temos um curso gratuito no site da OAB-RJ, além de seminários e debates em todo o estado. Esse, provavelmente, será o grande trabalho do primeiro semestre do ano que vem, no caso de reeleição, pois o código entra em vigor em março.

ConJur — O novo CPC é bem mais específico com relação aos honorários dos advogados. Qual é sua opinião sobre isso?
Felipe Santa Cruz —
Em relação ao novo CPC, eu ouvi de um juiz, em forma de crítica, que a lei é o "Estatuto da Advocacia parte dois". Sinceramente, recebi como um elogio aos advogados. Agradeço a deferência à advocacia e digo que tem que ser assim mesmo, já que este é o primeiro CPC do regime democrático. Todos os outros CPCs estão ligados ao autoritarismo, e a advocacia nunca se deu bem com o autoritarismo. Logo, se a lei é da democracia, tem que ser da advocacia, pois a advocacia é a verdadeira porta voz da cidadania. Então, agora temos que lutar pela aplicação das conquistas desse CPC, para que, verdadeiramente, tragam soluções, em especial para a morosidade em um momento de preocupação aqui no Rio de Janeiro com o Judiciário já perto do limite da responsabilidade fiscal e faltando serventuário e juiz. O modelo do Judiciário do Rio de Janeiro, de investir em grandes obras — algumas muito importantes, não nego, mas outras desproporcionais e excessivas — se esgotou. Hoje, o Judiciário do Rio de Janeiro precisa de mão de obra e não tem dinheiro, porque o Estado vive uma crise aguda. 

ConJur — O que a OAB-RJ pode fazer em relação à falta de pessoal no tribunal?
Felipe Santa Cruz —
Há concurso em aberto, com candidatos aprovados. A Ordem tem cobrado para que esses servidores sejam chamados. Nossos instrumentos para isso são os ofícios, as reuniões, a Tribuna do Advogado [informativo da entidade]. Temos usado a imprensa para mostrar esses casos, como os de Cambuci [no noroeste do estado], que estava há sete anos sem juiz, e Rio das Ostras [na Região dos Lagos], que tinha dois juízes para 200 mil habitantes. Não sou contra a um modelo que remunere bem o magistrado. Acho que magistrado e servidor têm que ser bem remunerados e valorizados. Isso é do interesse da advocacia. Só que temos escolhas a fazer no Rio de Janeiro. Entendemos que boa parte dos investimentos foram levados para a segunda instância, para os desembargadores. Acho, por exemplo, que é hora de discutir o voto de todos os juízes, porque isso vai permitir, do ponto de vista da política institucional, a atenção que a primeira instância vem merecendo. Às vezes, sinto que os dirigentes do tribunal até gostariam de investir mais na primeira instância, mas isso está demorando e precisamos de gente e que se resolvam os problemas. Claro, também temos que ser parte da solução, com a mediação, a conciliação, a arbitragem, por meio de uma advocacia qualificada, que afaste alguns problemas que temos no dia a dia. Também temos que fazer a nossa parte. Mas devemos estar muito conscientes que a situação é delicada, de crise econômica. Isso exige de todos nós muito diálogo e capacidade de negociação.

ConJur — Na sua avaliação, a OAB deve atuar diante da crise política atual? Como?
Felipe Santa Cruz —
Pode e deve. E acho que vem atuando. No Rio de Janeiro, sempre cobramos a reforma política e apoiamos a ação que acho que ataca o cerne do que está acontecendo, que é o fim do financiamento privado de campanhas. Hoje 0,5% das empresas brasileiras financiam 70% dos políticos. Criticamos o afastamento que a política tem da vida do cidadão. O carioca não sabe, muitas vezes, quem são os deputados da sua bancada, quem são seus senadores, o que eles fazem. Então, a Ordem critica isso e oferece soluções. É da Ordem a [iniciativa que resultou na Lei da] Ficha Limpa, que é um passo importantíssimo nessa caminhada de avanço institucional. A Ordem também tem iniciativas contra a corrupção. Somos uma entidade com pessoas de todas as origens. São 150 mil advogados no Rio de Janeiro que pensam de forma heterogênea, mas que têm o pensamento maior que é a defesa da Constituição e do Estado Democrático.

ConJur — Como o senhor vê o projeto de lei que cria um piso salarial para os advogados?
Felipe Santa Cruz —
Quando eu era dirigente de sindicato, fizemos um grande esforço para conquistar o piso estadual. Foi um avanço importante. O piso nacional é um patamar. Nosso problema é a hiperexploração. Devemos nos conscientizar de que uma audiência qualificada e valorizada na sua remuneração é o melhor modelo para todos.

ConJur — Qual sua opinião a respeito do projeto de lei que cria o advogado profissional individual?
Felipe Santa Cruz —
A OAB-RJ que desbravou a bandeira da inclusão do advogado no Simples, de forma a ajudar a estruturação de quem está iniciando. Também estamos trabalhando pela aprovação dessa lei. Tenho certeza que vamos sair vitoriosos.

ConJur — Como o senhor vê os projetos de lei em tramitação no Congresso que visam à extinção do Exame de Ordem?
Felipe Santa Cruz —
Das grandes alegrias que eu tenho é a situação política atual do deputado Eduardo Cunha. E falo isso com todas as letras. Não só por ele estar caindo em contradições, mas principalmente porque acho que ele levantou uma bandeira demagógica. Pergunta se o deputado Eduardo Cunha contrataria agora um advogado que não pudesse passar no Exame de Ordem? Eu conheço os advogados do deputado. São todos excelentes profissionais. Duvido que o doutor Eduardo Cunha esteja conversando com gente que não pudesse passar no Exame de Ordem. Isso só mostra que o exame é uma chancela para o cidadão. Quando o cidadão busca o seu direito, quer um bom advogado. E com o modelo de ensino que temos no país, só um bom exame. Existe um selo de qualidade hoje: o Exame de Ordem. Ele nos ajuda a saber quais são as deficiências do ensino e a evoluir na discussão das grades curriculares. Defesa do Exame de Ordem, para nós, é ponto central. Digo que daqui a 20 anos, tudo o que nós fizermos nesse período, como dirigentes da Ordem, vai merecer o julgamento dos colegas diante da perspectiva histórica. Mas a reformulação do Exame de Ordem, sem dúvida, será o mais importante. No Rio de Janeiro, tínhamos uma indústria de cursinhos. Tudo isso mudou nos últimos nove anos.

ConJur — Qual é a taxa de aprovação no exame?
Felipe Santa Cruz —
É de 8 a 12% no Rio.

ConJur — É uma boa peneira?
Felipe Santa Cruz —
É, mas se olharmos o período de doze meses, com três concursos promovidos, verificamos que de 40% a 50% dos candidatos acabam passando. O candidato que sai da faculdade pode até não passar no primeiro [exame], mas quase a metade acaba passando nos outros. É um exame de verificação de qualificação, que tem funcionado muito bem.

ConJur — Como o senhor analisa um outro projeto de lei que permite o estudante optar por fazer o Exame de Ordem ou um estágio de dois anos?
Felipe Santa Cruz —
Não existe estágio depois de formado. Até acho que deveríamos dar um período complementar de dois anos, por que há um vazio e o estagiário que está no escritório é cobrado a passar [no exame] quase que imediatamente. O deputado Sergio Zveiter teve uma iniciativa, mas acho que pelo nome foi mal compreendido, que foi o paralegal. Mas se nós pudéssemos ter um período complementar de formação, onde ele [o estagiário] pudesse, inscrito e sob a fiscalização da Ordem, ir complementando a formação com cursos e seminários na própria OAB e na ESA [Escola Superior da Advocacia], por esses dois anos até passar na prova… seria um processo de amadurecimento que respeitaria essa realidade de um exame mais seletivo. Acho que essa é uma solução aceitável.

ConJur — E ele continuaria no mercado.
Felipe Santa Cruz —
Na verdade, estará inserido no mercado, mas não vai virar um advogado de segunda mão. Então, vamos preservá-lo no mercado, possibilitando que, em um prazo razoável, se forme. Sinceramente, acho que em tempos como esses, temos que enfrentar as coisas com coragem. Não adianta ficar com as soluções de sempre. E acho que essa seria uma medida corajosa. As pessoas têm mais dificuldade com o nome do que com o instituto. É um estágio profissionalizante? É um estágio pós-faculdade? Tudo bem. Que se chame assim se isso der mais conforto. Mas sobre o que estamos falando? De um período adicional de formação profissional, sob supervisão de advogados, com a fiscalização disciplinar da Ordem, que possibilite uma ruptura menor. Muitas vezes, ele [o recém-formado] tem que sair do escritório porque acabou o período do estágio e ele já é bacharel. Então, há uma redução de direitos quando ele ainda está em um prazo, digamos assim, aceitável para passar no exame.

ConJur — O que o senhor acha das propostas que pretendem submeter a OAB ao controle externo, por órgãos como o TCU?
Felipe Santa Cruz —
O controle externo da Ordem foi proposto na ditadura militar. O maior defensor da independência administrativa da OAB se chama Raymundo Faoro, nome histórico da nossa entidade, um dos maiores presidentes da entidade. E por que Raymundo Faoro era defensor da nossa independência? Pela natureza da OAB. No Brasil, a Ordem não é um conselho ético e disciplinar, é a principal entidade da sociedade civil organizada. E para isso isso, tem que ter independência. Por isso que o Supremo, por unanimidade, entendeu que a Ordem é uma entidade sui generis, o que não significa que nós, como dirigentes da entidade, não devamos permanentemente avançar nos nossos instrumentos de transparência. Pelo contrário, devemos dar exemplo.

Na minha próxima gestão, vou criar um portal de transparência na OAB do Rio de Janeiro, com as contas e as contratações. Esse é um projeto maior, que não conseguimos fazer nesta administração. Nós devemos dar o exemplo, nos antecipar. A eleição desse ano, por exemplo, está muito mais razoável. Conseguimos criar regras para acabar com a insanidade que estava acontecendo, onde estávamos dando um mau exemplo com as cidades lotadas de bandeiras. Agora as campanhas estão perto dos fóruns e a [campanha na] internet é voltada para os advogados. Na última eleição, a página do meu opositor estava anunciando no El País, na revista Placar. Houve mais curtidas no Facebook do que votos. Não podemos fazer as campanhas para a sociedade. É uma campanha da advocacia.Isso mostra que a advocacia tem que corrigir a casa, cobrando-se a ter um processo democrático que nenhuma outra entidade tem. Que outra entidade reúne na segunda quinzena de novembro, a cada três anos, milhares de pessoas votando? No Rio de Janeiro, 100 mil advogados, pelo menos, vão às urnas. A democracia na entidade é transformadora.

ConJur — Na sua avaliação, o processo eleitoral na Ordem poderia servir de exemplo para o processo eleitoral político, inclusive com relação às doações?
Felipe Santa Cruz —
A chapa se mantém com o dinheiro da chapa. Mas o processo eleitoral da Ordem também sofre as influências do mundo em que vivemos. Então, é preciso limitação.

ConJur — Mas já não há regras?
Felipe Santa Cruz —
Tem um provimento do Conselho Federal, que evoluiu bastante. Por exemplo, proibiu o patrocínio. Mas o limite é não ser só proibitivo. Tem que permitir, até para que não haja uma desproporcionalidade entre os candidatos. Acho que temos que amadurecer um instrumento que preserve a classe, a eleição e seja democrático. Esse é o esforço.

ConJur — Na sua avaliação, o que precisa ser mudado no provimento?
Felipe Santa Cruz —
Temos que evoluir na discussão da prestação de contas. Não temos hoje um instrumento claro… Eu, no Rio de Janeiro, criei um CNPJ e deposito as contribuições de escritórios e de advogados na mesma conta para que, depois, a gente tenha um demonstrativo disso. Acho que poderia ser uma medida interessante.

ConJur — Esse procedimento consta em algum regulamento interno da OAB-RJ?
Felipe Santa Cruz —
Não, isso é da minha chapa. Temos um movimento no Rio, que já disputou eleições pela oposição e pela situação, que se chama Nova OAB. Essa vai ser a quarta eleição nossa pela situação, mas eu cheguei a coordenar, trabalhar e participar de chapas de oposição. Então, já temos uma certa cultura na Nova OAB. Mas essa é ainda uma cultura nossa. No próximo triênio, os dirigentes de Ordem vão discutir sobre como avançar ainda mais na regulação dos instrumentos de campanha.

ConJur — Qual é a sua opinião sobre a questão da propaganda na advocacia?
Felipe Santa Cruz —
Não podemos virar um modelo americano, que mostra o profissional no helicóptero, indo atender o cliente, em um banner no ônibus. Aquilo contradiz o que é a advocacia brasileira: uma advocacia de munus público, que tem forte compromisso com justiça.

ConJur — Com relação ao Código de Ética da Advocacia, que pontos, na sua avaliação, deveriam ser reformados?
Felipe Santa Cruz —
O grande ponto do código de ética vem da modernidade, a gente viveu, em dez anos, mil anos de evoluçã. Quando o estatuto nasceu, não tínhamos como pensar que o domínio do endereço de e-mail iria dizer se um escritório é nacional ou internacional. Essa é uma discussão que diz respeito à preservação do mercado nacional. Os outros países, não abrem o mercado para os brasileiros irem lá trabalhar. Nosso dever é defender o nosso mercado, dentro de determinados parâmetros. E isso se reflete no Código de Ética. Quanto à postura da advocacia nos instrumentos de comunicação, temos que acabar com essa figura do advogado 171, que é meio simbólico da malandragem. O advogado que vai ter no seu próprio escritório a mediação e a conciliação tem que ter uma autoridade moral inatacável. Para isso, precisamos tirar da advocacia quem não tem condições éticas.

ConJur — O que o senhor pensa da atuação dos advogados estrangeiros no Brasil?
Felipe Santa Cruz —
Devem ser consultores, como são, na legislação deles, os escritórios brasileiros. Sobre as relações com os escritórios internacionais, o provimento do Conselho Federal basta. Esse provimento é muito claro sobre as regras para a atuação dos escritórios estrangeiros no Brasil. Tanto que estamos agora, em São Paulo e no Rio, principalmente, cobrando ajustes dos escritórios que tenham montado estruturas diferenciadas, até antes do provimento, para que se ajustem a esse novo modelo.

ConJur — Que ajustes são esses?
Felipe Santa Cruz —
O escritório pode ter relação com outro internacional, mas não pode ser uma filial dele, não pode ter dinheiro dele. Os limites são claros no provimento. Pode ter relações, desse que se constituam parcerias.

ConJur — Tem que haver reserva de mercado?
Felipe Santa Cruz —
Acho que sim. Quanto mais agora, com o dólar a mais de R$ 4. Não tenho dúvida nenhuma [que a atuação de escritórios estrangeiros no Brasil] traria prejuízo. É normal que grandes escritórios internacionais aviltem o preço, venham para cá ganhar mercado. A advocacia é estratégica demais para estar na mão de estrangeiros. A advocacia tem que ter identidade com o país. Não que eu seja avesso à troca de experiência, participação e abertura do país para o mundo, mas a estratégia da advocacia tem que ser a preservação do mercado da advocacia nacional, que é importante para a própria soberania do país.

ConJur — O senhor defende a eleição direta nos tribunais, mas e com relação ao presidente nacional da OAB?
Felipe Santa Cruz —
O Rio de Janeiro sempre teve posição a favor da eleição direta. As grandes questões da advocacia são cada vez mais homogêneas. Veja o Simples [Nacional], a agenda da OAB no Congresso, o protagonismo no Supremo Tribunal Federal. As discussões do Conselho Federal são cada vez mais nacionalizadas. Para o futuro, precisamos que esse ator tão potencializado, que fala em nome de 800 mil advogados, tenha o voto desses 800 mil advogados. Isso não significa que a gente tenha que fazer uma transição maluca e expor nossa entidade a campanhas com influências partidárias ou de empresas. Acho que cabe a nós, como dirigentes e aos advogados estudar formas para que essa transição se dê de forma cautelosa e criteriosa, como estamos fazendo com a legislação eleitoral.

ConJur — O senhor acha que a advocacia pro bono deveria ser regulamentada?
Felipe Santa Cruz —
Não vejo por que criar grandes empecilhos à advocacia pro bono.

ConJur — Qual é sua opinião sobre os convênios da OAB com a defensoria pública?
Felipe Santa Cruz —
A OAB do Rio é patrona da defensoria, defendeu sua criação. O Rio de Janeiro tem a melhor defensoria pública do Brasil e o que nós cobramos sempre dos defensores é que eles exerçam a sua atividade fim, defendam o carente. O Brasil tem um cadastro nacional de pessoas em situação de fragilidade social. Esses deveriam ser os atendidos pela defensoria pública. Já defendi no Conselho Federal [a propositura de] uma lei que dissesse que os clientes da instituição são aqueles que realmente estão em estado de fragilidade social. Critico quando a defensoria se desvia para assuntos que não são da instituição. Isso sobrecarrega os cofres do Estado com assuntos que pertencem à advocacia privada.

ConJur — E é comum essa confusão?
Felipe Santa Cruz —
No Rio, temos poucos conflitos. Há um diálogo institucional muito bom.

ConJur — Na sua opinião, o advogado brasileiro é respeitado?
Felipe Santa Cruz —
A advocacia é menos respeitada que a entidade. Na televisão, o advogado ainda é mostrado como o esperto. Os anos 1990 foram terríveis para a advocacia. Houve um aumento do número de cursos, o que eu não sou contra, mas que não foi acompanhado da qualificação, então se aviltou o que é ser advogado. Existe um grande movimento para recuperar a advocacia, que passa pelo Exame, disciplina e qualificação. Agora, era mais fácil falar disso no cenário de crescimento econômico, porque quanto maiores as oportunidades, melhor seria, a advocacia e o papel do advogado passaria a ser respeitado na sua plenitude. Agora, na crise, vamos continuar unidos e trabalhando para fazer esse resgate. O advogado brasileiro sempre foi o herói na luta democrática e, agora na democracia, tem que ser um instrumento de acesso à justiça e de transformação.

ConJur — Qual é a missão principal da OAB?
Felipe Santa Cruz —
É a defesa intransigente dos advogados, do seu trabalho e das suas prerrogativas, por que isso também é defender a cidadania. Não podemos ter uma OAB que só faça comentários gerais e que viva de comentar jornais ou episódios da política. A outra [missão] é a defesa da Constituição. Nosso partido é a Constituição e nossa luta é a democracia e o Estado Democrático de Direito. Não é à toa que a advocacia foi constitucionalizada no artigo 133. A OAB e a advocacia brasileira são a gênese do sonho do constituinte em construir uma sociedade realmente com acesso à justiça e que retire o Brasil do que ele sempre foi: o país das oligarquias, das grandes maracutaias, da concentração de renda e das vantagens. E isso só vamos alcançar com um modelo institucional onde há autonomia no Ministério Público, uma advocacia pública eficiente e valorizada defensorias funcionando e um Judiciário célere. A OAB tem um papel, até por sua força simbólica. Se você coloca a OAB em uma pesquisa, a OAB está lá em cima. Para quem é dirigente, a responsabilidade é incrível. Cada fala tem que ser pesada a fim de se respeitar esse patrimônio histórico. Não temos o direito de sermos levianos. Aqui no Rio, eu divido com os especialistas e evito falar do que não seja do eixo institucional. Acho que o poder da fala do presidente da Ordem deve ser respeitado. Não a minha fala, Felipe, porque sou temporário. E queremos isso: que a oposição e a situação estejam insatisfeitas conosco, porque isso diz que estamos no nosso papel. Temos que ter coragem de ir lá e falar. Que outra entidade iria questionar o modelo de financiamento onde uma única empresa gasta R$ 300 milhões em uma campanha eleitoral?

ConJur — Que modelo o senhor defende?
Felipe Santa Cruz —
Sou a favor do financiamento individual. Pessoa física. O dono da empresa vai lá e doa no limite do imposto de renda dele, como qualquer cidadão.

ConJur — A tendência do Congresso é aumentar penas para resolver os crimes, principalmente os de corrupção. O senhor acha que esse é o caminho?
Felipe Santa Cruz —
De jeito nenhum.  A economia do Rio de Janeiro é a Petrobras e está tudo parado. E quem paga o preço são os mais pobres. Primeiro, tem que se afastar a sensação que pode haver uma subjetividade. Para isso, as leis têm que ter maior critério objetivo. Os Estado Unidos demoraram quase cem anos para isso. A delação e a leniência, nos EUA, foram implementadas no início do século XX, mas só passaram a funcionar em 1975, após alterações que lhes deram critérios objetivos. Então, por exemplo, se alguém descobre que na empresa dele houve pagamento de propina para determinada obra e faz a delação antes da denúncia ou qualquer tipo de investigação, a empresa não sofre dano nenhum ou multa. Há uma imunidade criminal para os dirigentes da empresa. O que é isso? Instrumentos que permitam que as empresas não se fragilizem, não quebrem e que a economia não pare, mas que possamos ter lisura nos procedimentos. Agora, depois desses problemas, o Brasil descobriu o que já se fala há anos: que as obras são mal licitadas, que os aditivos causam danos bilionários e que elas demoram a ser concluídas porque os projetos são mal feitos. O momento é de avançar no que interessa, fazer a economia funcionar e retomar o emprego.

ConJur — Que balanço você faz da sua gestão?
Felipe Santa Cruz —
Trabalhamos muito. Brinco que eu seria o pior vidente do mundo. No meu discurso de posse, o barril de petróleo era US$ 100 e tínhamos a euforia pré-Copa e Olimpíadas. Todo o meu discurso foi em cima do avanço do mercado e da qualificação da advocacia. Então passei a ser um presidente de crise a partir de março de 2013. Mas acho que nós vamos construindo na conjuntura. Basicamente, a ideia é seguir. A advocacia do Rio tem confiança do trabalho da gente, como mostra a pesquisa que nos dá 80% de aprovação. Estou entusiasmado em submeter meu nome aos colegas para mais três anos.

ConJur — Quem do mundo jurídico o senhor mais admira?

Felipe Santa Cruz — A gente sempre admira aquele professor, concorda? Destaco a Salete Maccalóz [desembargadora], que me ensinou Direito do Trabalho; Carlos Alberto Direito [ministro do STF, morto em 2009], que foi meu professor de Constitucional; e Adriano Pilatti [professor e jurista], que foi meu orientador de monografia. Acho importante valorizar as pessoas que tiveram esse papel chave na nossa formação.

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