Advocacia do Estado

"Procuradores trabalham em prédios interditáveis e sem suporte", diz Guzzardi

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12 de novembro de 2015, 8h00

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No próximo dia 17, a Associação dos Procuradores de São Paulo (Apesp) elegerá seu próximo presidente. O atual presidente da Apesp, Caio Cesar Guzzardi da Silva, concorre à reeleição.

Ele é formado em Direito pelo Mackenzie (2001) e também cursou Filosofia na FFLCH/USP. É especialista e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP. O procurador já atuou na Procuradoria de Assistência Judiciária (entre 2006 e 2007), na Procuradoria do Patrimônio Imobiliário (desde 2007) e foi chefe da 1ª Subprocuradoria daquela unidade (entre 2011 e 2013).

O presidente também integrou o Conselho Editorial da PGE entre 2008 e 2010. Na Apesp, foi membro do Conselho Fiscal (biênio 2010/2012) e diretor de prerrogativas (entre 2012 e 2013).

Leia a entrevista concedida por Guzzardi à ConJur:

ConJur — Qual é o papel da Apesp?
Caio Guzzardi — A Apesp tem por finalidade postular pelos interesses da classe; incentivar a solidariedade entre os associados; propugnar pela assistência e previdência social dos seus membros; desenvolver atividades culturais, recreativas e sociais; representar seus filiados, judicial e extrajudicialmente; propor as medidas judiciais cabíveis no interesse individual ou coletivo dos associados; e defender o interesse e o patrimônio públicos.

 

ConJur — Quais são suas principais propostas para a Apesp?
Caio Guzzardi — Seguir na construção do fortalecimento da advocacia pública, buscando a autonomia institucional com a aprovação da PEC 82/07 e a participação dos membros da carreira na escolha democrática do procurador geral do Estado (mediante o procedimento de eleição de lista tríplice). Além disso, promover, pelos meios administrativos ou judiciais, a defesa das prerrogativas dos procuradores do Estado e da advocacia pública, buscando melhores condições estruturais, materiais, de suporte humano e de divisão de trabalho na PGE. Continuar a promover o diálogo  constante e independente com o procurador geral do Estado, seu gabinete e os demais órgãos do governo e os demais Poderes, com combatividade necessária que devem ter as entidades de classe.

ConJur — Advogado público defende funcionário público acusado de improbidade?
Caio Guzzardi — Não está encartada entre as atribuições do procurador do Estado, e nem poderia estar sob pena de ofensa aos princípios da moralidade , da legalidade e da indisponibilidade do interesse público, a defesa de agentes públicos ou servidores públicos, quaisquer que sejam as funções que exerçam, se acusados de ato de improbidade.

Nos embates que antecederam a elaboração da atual Lei Orgânica da Procuradoria, o tema veio à tona com a pretendida inclusão de dispositivo prevendo a intervenção de procuradores do Estado, para fins de defesa, em caso de acusação da prática de ato de improbidade de agente público.

A diretoria da Apesp, à época presidida pela procuradora Marcia Semer, que eu também integrava, suscitou amplo debate sobre a matéria, posicionando-se contrariamente à medida por entender que tal determinação feria os princípios basilares que conformam a Advocacia Pública. Pela natureza do tema, a questão repercutiu na imprensa, fato determinante para a exclusão da regra no projeto encaminhado à Assembleia Legislativa.

 

ConJur — A PGE-SP está equipada e preparada para atuar pelo interesse público?
Caio Guzzardi — Embora os procuradores do Estado sejam profissionais de mais alta capacidade técnica e intelectual e, portanto, estejam absolutamente preparados para atuar pelo interesse público, a PGE-SP carece de estrutura adequada para que os procuradores possam desenvolver plenamente a advocacia pública. Os procuradores trabalham em prédios interditáveis e sem suporte material e humano suficientes ao adequado exercício de suas funções. Para solucionar esse problema, a Apesp tem buscado convencer o governo a investir na PGE. E para os próximos dois anos, a chapa “Avançar e Construir” propõe   um plano emergencial que ataca tanto a precariedade estrutural (com a regulamentação e expansão dos fundos de aparelhamento) quanto a carência de pessoal, mediante a rápida criação da carreira de apoio na PGE. 

ConJur — Depois de muito impasse, a nova Lei Orgânica da PGE passou a valer em agosto. Quais as mudanças mais relevantes, na sua opinião? Há problemas nas novas regras?
Caio Guzzardi — A superação do impasse gerado pelo trâmite da na nova Lei Orgânica da PGE dissociado dos novos ventos que arejam a advocacia pública impõe atenta vigilância quanto à efetivação de seus dispositivos, em especial, quanto à sua regulamentação.  Não se vislumbra avanço institucional em termos relevantes. A questão da autonomia da PGE, por exemplo, não mereceu da nova lei nenhuma alteração apta a ampliar a capacidade financeira, administrativa e orçamentária da instituição. É uma bandeira a ser empunhada com firmeza. Continuaremos nessa batalha. 

ConJur — Como vê o relacionamento entre a PGE e a Apesp na última gestão?
Caio Guzzardi — A Apesp e o procurador geral têm desenvolvido canais cada vez maiores de diálogo. A relação da Apesp com o gabinete do procurador geral nos últimos dois anos foi de construção de uma linha de diálogo direta, produtiva e independente, sem subordinação ou subserviência.

Nos pontos em que não houve convergência, a Apesp conduziu-se nos limites institucionais, levando as questões às vias administrativas ou judiciais, sempre com o propósito de buscar soluções  para temas controversos.

ConJur — Como está a infraestrutura atual para os serviços dos procuradores?
Caio Guzzardi — Muito ruim. A maioria dos procuradores em exercício na capital exerce suas funções em prédios que desatendem as normas de ergonomia e conforto estabelecidas pelo Ministério do Trabalho. No interior, a sobrecarga excessiva de trabalho e a carência de automóveis para os deslocamentos indispensáveis para realização de diligências e audiências em comarcas distantes impõem aos procuradores más condições de trabalho.

A isso se soma a carência de uma carreira de apoio aos Procuradores, que passam grande parte do tempo desenvolvendo atividades atípicas de natureza puramente administrativa, ao invés de se dedicarem exclusivamente à defesa do Estado e ao assessoramento jurídico e consultoria da Administração Pública.

A Apesp tem atuado fortemente, inclusive junto com o Ministério Público do Trabalho, para superar esse estado de coisas.

ConJur — Advogado público deve ter registro na OAB?
Caio Guzzardi — Sim. A Ordem dos Advogados do Brasil, por delegacão constitucional, regulamenta e fiscaliza a advocacia, tanto a privada quanto a pública. Assim, a inscrição na OAB é requisito para o exercício do cargo de procurador do Estado. Advocacia pública é espécie do gênero advocacia.

 

ConJur — Na sua opinião, procurador também pode advogar na área privada?
Caio Guzzardi — Em razão da necessária vinculação dos advogados públicos à OAB, delegatária exclusiva da regulamentação da profissão, cabe a esta instituição regrar a atividade da advocacia pública. A regra vigente no estatuto da OAB diz que é vedado o advogado público exercer a advocacia contra a Fazenda Pública que o remunera, regra bastante correta e protetiva dos interesses do Estado.

Esse assunto está sendo amplamente debatido pela carreira e fomentado pela Apesp, que tem o importante papel de ser o foro  próprio do debate, inclusive informando aos associados as tendências e realidades nos demais órgãos de advocacia pública do Brasil.

ConJur — Com a nova lei de arbitragem, está permitida de vez a arbitragem com administração pública. Isso tem aumentado o interesse dos procuradores pela prática?
Caio Guzzardi — Sim, os Procuradores têm buscado se preparar para a arbitragem. A Apesp, inclusive, esteve com o secretário para a Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça para tratar tanto deste tema quanto sobre mediação (Lei 13.140/2015), visando à viabilização de convênio para capacitação dos procuradores do nessas áreas que são fundamentais para consolidação da cultura do consenso.

ConJur — Faz sentido advogado público ganhar honorários de sucumbência?
Caio Guzzardi — Sim. Os honorários de sucumbência, inclusive nos termos do novo CPC, têm natureza privada e são verba privativa dos advogados (públicos ou privados). Assim, por não comporem orçamento do Estado, se destinam com exclusividade aos procuradores. Vale citar que a distribuição de verba honorária aos procuradores do estado de São Paulo atende a todos os critérios legais e respeita inclusive critérios de transparência, moralidade e razoabilidade.

ConJur — Procuradores do Estado podem participar de conselho de administração de empresa pública?
Caio Guzzardi — Sim, não há vedação legal.

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