Poder dos Juízes

Estreitamento de recursos em busca de celeridade fortalece autoritarismo

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12 de março de 2015, 15h47

Entre as inovações do Código de Processo Civil está a enumeração taxativa das hipóteses de agravo de instrumento. Pelo artigo 1.015 do Novo Código, estas são:

"Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
I – tutelas provisórias;
II – mérito do processo;
III – rejeição da alegação de convenção de arbitragem;
IV – incidente de desconsideração da personalidade jurídica;
V – rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;
VI – exibição ou posse de documento ou coisa;
VII – exclusão de litisconsorte;
VIII – rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;
IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;
X – concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;
XI – redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º;
XII – conversão da ação individual em ação coletiva;
XIII – outros casos expressamente referidos em lei"

O propósito de celeridade já havia sido contemplado ao se retirar o efeito suspensivo do agravo. No Brasil criou-se a errada ideia de que a morosidade deve-se à demasia de recursos criando-se assim mecanismos de massificação dos julgamentos e, por conseguinte, concedendo-se poder cada vez maior aos juízes. Muitas vezes a estrutura do Poder Judiciário, conjuntamente com o fato do Estado ser o maior litigante, são a causa do "entupimento judiciário". Neste sentido, infelizmente foi mantido, no artigo 496, o recurso de ofício nas causas em que for proferida sentença contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.

Verificando as hipóteses de agravo de instrumento acima, constatamos que nada há sobre a decisão que recusa o reconhecimento da conexão ou continência. Este é apenas um exemplo para salientar como o legislador, sempre que enumera hipóteses em lugar de assentar um preceito universal, como é no Código de 1973, pelo qual de toda decisão interlocutória cabe agravo, deixa de prever tudo o que deveria.

Acertadamente, no parágrafo 3º do artigo 55 está disposto que "serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles". O problema com relação aos recursos cabíveis continua: se num processo há possibilidade de decisão conflitante com outro, existindo ou não continência/conexão, nenhum recurso será possível contra a decisão do juiz que assim não entender, salvo suscitá-lo como preliminar de apelação, consoante o parágrafo 1º do artigo 1009 da nova redação:

"§ 1º As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões."

Eis que no problema do qual tratamos neste artigo, de nada adiantará, pois, se o que se deseja é impedir decisões conflitantes, já haverá uma decisão final dado que apenas sobre esta se apela. O que se faria neste caso? Ordenar, na decisão da apelação, ao juiz do outro processo, que não decida diferentemente? Isto seria uma piada.

Não condenamos a nova lei adjetiva civil. Ao contrário, há muitos dispositivos que reequilibram o processo. Todos aqueles, no entanto, que se encaminham pelo estreitamento de recursos à guisa de celeridade perigam funcionar como instrumentos da chamada "jurisprudência defensiva", pela qual, entre outras coisas,  os tribunais evitam conhecer das questões que lhes são submetidas mediante todo tipo de expediente de inadmissibilidade de recursos. E muitas vezes sob a forma mais desonesta possível.

Escreveremos verbete sobre o tema na Enciclopédia Jurídica Soibelman.

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