Atividade ilícita

Policial que pratica descaminho responde por improbidade administrativa

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11 de março de 2015, 12h11

Policial que aceita transportar mercadorias sem pagar impostos, a mando de terceiros, mesmo não estando em serviço, comete ato de improbidade administrativa, pois a conduta atenta contra os deveres de honestidade, legalidade e lealdade às instituições. Por isso, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve, por unanimidade, sentença que condenou uma agente da Polícia Rodoviária Federal do Paraná, flagrada com o carro cheio de mercadoria vinda do Paraguai. Para a turma, ficou caracterizado o descaminho, já que a agente importou produtos com fraude no pagamento de impostos.

Nos dois graus de jurisdição, ficou entendido que a agente utilizou-se da sua condição de policial para tentar assegurar a prática criminosa. Ela acreditava que passaria facilmente pelo posto policial sem levantar qualquer suspeita acerca da existência de mercadorias dentro do veículo que conduzia — cedido por quem encomendou o ‘‘frete’’.

Segundo o relator da Apelação, desembargador Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, se a Lei de Improbidade Administrativa (8.429/92) considera ímproba a conduta do servidor que simplesmente ‘‘tolera’’ a prática de um crime ou de qualquer outra atividade ilícita, com maior razão veda a conduta daquele que não apenas tolera, mas concorre para a consumação do crime ou o prática efetivamente, como no caso denunciado à Justiça pelo Ministério Público Federal.

A defesa alegou que, como a agente não recebeu o pagamento pelo serviço, não houve enriquecimento ilícito. Entretanto, segundo o relator, não foi a primeira fez que ela fizera o transporte para o mesmo interessado. Logo, já havia recebido vantagem patrimonial pela prática do mesmo crime, caracterizando enriquecimento ilícito.

A ré, que estava há 14 anos na PRF paranaense, foi condenada à perda dos bens e valores acrescidos ilicitamente ao seu  patrimônio, à perda da função pública e ainda teve suspensos os seus direitos políticos por oito anos. Ela terá de pagar multa civil de 20 vezes o valor da remuneração percebida como policial. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento do dia 25 de fevereiro.

A denúncia do MPF
O flagrante aconteceu em junho de 2010 quando a Polícia Rodoviária Federal interceptou, no Posto de Fiscalização do município de Santa Terezinha de Itaipu (PR), o veículo Citröen C4 Pallas lotado de máquinas fotográficas e de artigos de informática, conduzido pela policial rodoviária. Os agentes da PRF também apreenderam uma pistola Glock, carregada, além de munição — tudo sem registro.

A policial negou que fosse dona da mercadoria — avaliada em quase R$ 220 mil —, informando que estava transportando para terceiro até o município de Céu Azul (PR). No áudio da abordagem, anexado ao processo na fase de instrução processual, ficou evidenciado que ela tinha consciência de que transportava mercadoria ‘‘descaminhada’’, tanto que pediu uma ‘‘chance’’ a seus colegas, tentando se liberar do flagrante.

Em face do ocorrido, o Ministério Público Federal do Paraná a denunciou por improbidade administrativa, já que sua conduta se amoldou aos artigos 9°, caput, e 11 da Lei 8.429/92 —  que regula as sanções aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício do cargo. 

Citada, a policial apresentou contestação. Afirmou que não houve o alegado  ‘‘enriquecimento ilícito’’ e, por conseguinte, lesão ao patrimônio público, já que não recebeu nenhuma vantagem ilícita. Sustentou que não agiu de má-fé, pois se encontrava acometida de doença mental grave (transtorno depressivo-compulsivo), o que exclui sua  culpabilidade. Referiu, ainda, que não atentou contra quaisquer princípios da Administração Pública. Logo, propôs o reconhecimento de inexistência do ato de improbidade suscitado pelo MPF.

Em  contramanifestação, o MPF informou que a denunciada não alegou transtorno mental quando processada pelo mesmo fato na esfera penal. Aliás, a sentença condenatória por descaminho foi confirmada pela 7ª Turma do TRF-4, que julga recursos criminais. Por isso, pediu o indeferimento de perícia médica — no que não foi atendido pelo juízo da 2ª Vara Federal de Foz do Iguaçu (PR).

Entretanto, constatada a inexistência de incapacidade mental, o juízo determinou o regular prosseguimento da ação de improbidade. Deferiu, por outro lado, a utilização de ‘‘prova emprestada’’ na Ação Penal 5002871-60.2010.404.7002.

Em suas alegações finais, a ré argumentou que não poderia ser processada por improbidade porque, no momento da abordagem, estava sem farda, não se encontrava no exercício da função, nem usava veículo ou arma da corporação. Assim, por encontrar-se de folga naquele dia, era só uma simples ‘‘particular’’.

Sentença procedente
Preliminarmente, juiz federal Rony Ferreira derrubou esta última alegação, já que a inicial relata fatos relacionados ao cargo, uma vez que era dever da policial justamente reprimir esta conduta. Também corrobora para a tese o fato de a ré ter respondido a processo administrativo-disciplinar que redundou na aplicação da pena de demissão dos quadros da Polícia Rodoviária Federal. Ademais, segundo jurisprudência da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, ‘‘mesmo quando a conduta é perpetrada fora das atividades funcionais, se ela evidenciar incompatibilidade com o exercício das funções do cargo, por malferir princípios basilares da Administração Pública, é sim passível de punição na esfera administrativa, inclusive com a pena máxima de demissão’’.

Na análise de mérito, o juiz entendeu que as provas, os documentos e os depoimentos que embasaram os autos levam à procedência da denúncia, nos moldes em que formulada pelo parquet federal. Nos trechos do interrogatório feito com a ré, destacados pelo julgador, esta admite que passava por problemas financeiros e de saúde, pois tinha quadro de depressão. Diante da situação, disse que foi convidada por um de tal de ‘‘Polaco’’ para trazer mercadorias do Paraguai, recebendo US$ 500 por viagem. Era sua segunda viagem.

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