Processo Familiar

Relações amorosas atestam as diferenças entre homens e mulheres

Autor

  • Rodrigo da Cunha Pereira

    é presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) doutor (UFPR) e mestre (UFMG) em Direito Civil autor de vários artigos e livros em Direito de Família e Psicanálise e advogado em Belo Horizonte.

8 de março de 2015, 8h00

“Que diferença da mulher e homem tem?” Muitas. Como já cantou Gonzagão, em sua música, magnificamente interpretada por Gal Costa e o próprio Gonzagão em um disco de 1989, embora tenha brincado que “tem pouquinha diferença”. Fato é que, as tais diferenças continuam equacionando a igualização de direitos entre os gêneros. O velho bordão feminista “viva a diferença, com direitos iguais”, continua atual e nos instigando a continuar pensando muito mais na diferença do que na igualdade de direitos. A igualdade é fácil. Ela já está posta na lei. O difícil mesmo é lidar com as diferenças, pois são biológicas, físicas e químicas. Não é à toa que o tempo para aposentadoria da mulher é menor que a do homem.

O discurso da igualdade é importante e já ajudou a diminuir injustiças nas relações jurídicas e sociais, como a pensão alimentícia compensatória. Mas tão importante quanto a igualdade é a instigação a pensar as diferenças entre gêneros.

Freud dizia que há um abismo entre homens e mulheres. E a diferença fundamental está muito além da anatomia. Até porque anatomia é o destino dizia ele. Vejo isto em minha “Clínica do Direito”. Por exemplo: ainda povoa o imaginário feminino que o pai, ou outro homem (marido ou companheiro) irá sustentá-las. Felizmente, e para o próprio bem delas, os tribunais têm se recusado cada vez mais a conceder pensão alimentícia para mulheres jovens, saudáveis e com capacidade laborativa. Por outro lado, e embora seja recente o número de mulheres que sustenta seus maridos ou companheiros, é raríssimo pedirem pensão às ex-companheiras.

Uma das diferenças significativas, e confirmando o abismo entre o universo masculino e feminino, estão nas modernas e atuais relações amorosas. Uma das tormentas que os tribunais brasileiros têm enfrentado é decidir se determinada relação é namoro ou união estável. De um namoro não decorre nenhuma consequência jurídica. Mas se caracterizada a união estável pode haver partilha de bens adquiridos na constância da relação e até mesmo pensão alimentícia. Os elementos objetivos que distinguiam uma relação da outra já não existem mais: não é necessário cinco anos para caracterizar a união estável; não é preciso mais morar juntos ou ter filhos; e relações sexuais é um ingrediente saudável e desejável tanto no namoro quanto na união estável. Diante destes confusos, e difusos, elementos caracterizadores de um núcleo familiar, não se pode nem mais namorar em paz. E eis aí uma diferença fundamental: os homens sempre acham que estão só namorando. Mas as mulheres pensam que aquela mesma relação é além de um namoro. No final da relação, o amor, que muitas vezes vai parar na justiça, para um terceiro (juiz) dizer se ali já havia se constituído um núcleo familiar, ou se tratava apenas de um namoro e que portanto não há consequências jurídicas e patrimoniais. Tudo por conta desta diferença do olhar masculino e feminino.

Foi a resignação histórica das mulheres que proporcionava os casamentos durarem eternamente. Tinham que aguentar a qualquer custo, até que se começou a respeitar e a considerar, que as mulheres, assim como os homens, são sujeitos de desejo e de direitos. Daí o movimento feminista, que influenciou a quebra do princípio da dissolubilidade do casamento, permitindo que se instalasse o divórcio no Brasil (1977). Aliás, o movimento feminista foi a grande revolução do século XX e interferiu drasticamente nos ordenamentos jurídicos com a proclamação da igualdade formal entre homens e mulheres. Na evolução desta revolução feminista é que surgiram várias outras leis par ajudar a consolidar o principio da igualdade de direitos dos gêneros masculino e feminino.

Todas as atuais leis que ajudaram a fazer o Direito de Família evoluir são consequências da proclamação da igualdade de direitos. Até mesmo a Lei da guarda compartilhada, embora seja fruto da luta dos pais que eram impedidos de conviver com seus filhos igualitariamente, vem na esteira da evolução do movimento feminista. Com a guarda compartilhada as mulheres podem dividir responsabilidade e tempo com os pais de seus filhos. Obviamente terão mais tempo para si mesmas.

Cerca de 80% da iniciativa dos divórcios e dissoluções de uniões estáveis é por parte da mulher, mesmo que tenha sido o homem a estabelecer uma relação extra conjugal. Por mais que as mulheres tenham aumentado sua taxa de infidelidade, com a conquista de um lugar de sujeito de direitos e de desejo, ainda é um índice muito pequeno se comparado aos dos homens. Elas estão muito mais interessadas em uma relação com mais qualidade afetiva: eis aí uma outra diferença entre o mundo masculino e o feminino. Os homens, com o seu raciocínio muito mais no campo da objetividade, estão mais preocupados e ligados a aspectos patrimoniais, enquanto as mulheres continuam sonhando com o amor perfeito, mesmo sabendo que é perfeitamente impossível.

As mulheres sabem mais sobre o amor. Neste aspecto temos que aprender com elas. Talvez assim as diferenças deixem de ser tão abissais e nos aproximemos um pouco mais da quase impossível resposta à pergunta feita por Freud: o que querem as mulheres?

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    é presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), doutor (UFPR) e mestre (UFMG) em Direito Civil, autor de vários artigos e livros em Direito de Família e Psicanálise e advogado em Belo Horizonte.

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