Juízo de admissibilidade

Mudança do CPC deve aumentar recursos que chegam ao STJ, criticam ministros

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19 de maio de 2015, 18h26

Ministros do Superior Tribunal de Justiça estão de olho nas mudanças que o novo Código de Processo Civil vai trazer ao tribunal. Uma das maiores preocupações é a ausência do dispositivo da admissibilidade de recursos — que pode comprometer a eficiência e celeridade da corte.

O juízo de admissibilidade é a análise que os tribunais de origem dos processos fazem para decidir se os recursos têm os critérios técnicos necessários para tramitarem no STJ. No novo CPC, porém, esse “filtro” é suplantado, fazendo com que todo recurso seja encaminhado direto ao tribunal superior (artigo 1.030, CPC).

STJ
Ministro Sebastião Reis diz que mudança pode sacrificar celeridade.
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Para os ministros Sebastião Alves dos Reis Júnior, presidente da 6ª Turma, e Mauro Luiz Campbell Marques, presidente da 2ª Turma, a ausência do dispositivo permitirá que cheguem ao STJ mais recursos que não devem ser julgados pela corte. Eles falaram sobre o tema nesta segunda-feira (18/5) no VI Seminário sobre o STJ promovido pela Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp).

Segundo Campbell Marques, dados do tribunal apontam que aproximadamente 48% dos pedidos de recursos são barrados com o dispositivo a ser extinto no novo CPC, em março de 2016. “Só o fato de ser suprimida a admissibilidade de recursos e que tudo subirá contabilmente já haverá um reflexo de quase 100% do acervo que chega ao STJ”, afirma.

Já o ministro Sebastião Alves dos Reis Jr. lembrou que apesar de o CPC tentar garantir maior debate das partes a partir dessa e outras medidas, a ausência de admissibilidade pode sacrificar a celeridade do Judiciário. “São aparentemente soluções que irão garantir o maior contraditório, o maior debate, mas me pergunto até que ponto isso não vai atravancar o andamento do processo”, afirma.

Apesar da crítica, o ministro defende que a solução do obstáculo ocorra dentro do próprio STJ. “Não podemos ir contra a vontade do legislador. Nós tivemos contato com relatores, encaminhamos nossas emendas, mas elas foram rejeitadas e agora vamos trabalhar com que temos.”

Enquanto a falta do dispositivo de admissibilidade de recurso foi tratada com ressaltava e preocupação, a busca pela uniformização da jurisprudência e a vinculação de decisões, previstos no novo CPC, foram elogiadas pelos ministros.

Habeas Corpus
Ao vincular decisões, o novo CPC deverá, na visão dos ministros, reduzir a atual demanda de julgamentos de Habeas Corpus nos superiores tribunais — severamente criticada nas falas aos advogados.

Gilmar Ferreira
Instâncias inferiores tornaram-se  passagem para o STJ, critica Mussi.
Gilmar Ferreira

O presidente da 5ª Turma do STJ, ministro Jorge Mussi, listou HCs impetrados em sua sessão e destacou que muitos deles tratam de casos de furtos de baixo valor sem notícia de prejuízo da vítima que deveriam ser resolvidos nas instâncias inferiores. “As decisões de primeiro e segundo grau têm se tornado meros carimbos de passagem. Eles estão desaguando nos STJ e Supremo Tribunal Federal”, disse Mussi.

Para ele, é papel também do advogado analisar se a causa deve ser levada ao tribunal superior. “Advogado exerce antes de tudo o papel de conselheiros das partes. Eles são os primeiros juízes da causa.”

Segundo o ministro João Otávio de Noronha, a entrada de tantos Habeas Corpus aos tribunais superiores é uma questão cultural. O novo CPC, segundo ele, auxiliará a mudança do comportamento do judiciário com a vinculação das decisões dos tribunais de instâncias inferiores ao superiores. “Vamos disciplinar a jurisdição brasileira e a atuação dos advogados, mostrando que não haverá chance de mudança da sentença nas instâncias superiores.”

Na visão do advogado Sérgio Rosenthal, ex-presidente da Aasp porém, o grande número de HCs que chegam ao STJ se deve ao mal julgamento dos juízes de primeiro e segundo graus.

“Respondendo por que nós temos tantos HCs nos tribunais superiores. Porque em primeiro grau se julga muito mal e porque em segundo grau, muitas vezes, se julga muito mal também. Teorias são mal interpretadas, diretrizes não são seguidas. Direitos são violados sempre sob a justificativa de que juízes são independentes e que o juiz então não é obrigado a decidir de acordo o nosso STJ e STF”, diz Rosenthal.

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Garantias fundamentais não são respeitadas em tribunais, diz Sica.

O presidente da Aasp, Leonardo Sica, avalia que o encontro entre ministros e advogados no seminário permitiu que ambas as partes pudessem expor as dificuldades e demandas dos seus setores do trabalho do Judiciário.

“Os ministros deixaram claro que existe uma preocupação muito grande em relação à carga de trabalho que está em vias de inviabilizar a jurisdição do tribunal. Do outro lado, a mensagem que queremos passar para os ministros é que entendemos isso, mas não abrimos mão de o tribunal agir em defesa da tutela de direitos e garantias fundamentais que infelizmente não são respeitadas nas jurisdições inferiores. Às vezes, parece que há uma discussão sobre o julgar tudo ou julgar nada, mas a questão é julgar bem”, disse Sica.

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