Emenda da Bengala

Pedido para ficar no TJ-RJ depois dos 70 anos cria confusão regimental

Autor

12 de maio de 2015, 16h27

Um pedido de um desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para permanecer na corte após os 70 anos criou uma situação inusitada, difícil até mesmo para ser resolvida com base no Regimento Interno do tribunal fluminense. A ação movida por Roberto de Abreu e Silva, que completa 70 anos no próximo domingo (17/5), se baseia na recém-promulgada Emenda Constitucional 88/2015, que ampliou de 70 para 75 anos a idade para a aposentadoria compulsória dos ministros dos tribunais superiores.

Acontece que já correm no TJ-RJ outros mandados de segurança movidos por mais desembargadores para tentar evitar a aposentadoria compulsória. Todos esses pedidos se fundamentam na emenda à constituição do Rio de Janeiro, com o mesmo propósito, aprovada no dia 8 de abril — portanto, antes da promulgação da EC 88/2015, batizada de Emenda da Bengala, pelo Congresso Nacional, no último dia 5 de maio. Aí é que está a raiz do problema.

Mailson Santana
Desembargador Roberto de Abreu Silva completa 70 anos no próximo domingo.
Mailson Santana

A ação do desembargador Roberto de Abreu Silva (foto) foi distribuída inicialmente ao seu colega Reinaldo Pinto Alberto Filho. Mas no último dia 8 de maio, ele declinou da competência para o desembargador Marcus Quaresma, que já relata os outros pedidos movidos pelos membros do TJ-RJ que tentam evitar a aposentadoria compulsória. Só que Quaresma também disse que não pode assumir o novo caso.

De acordo com Quaresma, diferentemente das ações que relata, a demanda movida por Abreu e Silva se baseia na EC 88/2015. Por isso, a prevenção dele para apreciar a nova demanda não se aplica ao caso. O desembargador pediu a redistribuído da ação ao relator originário — ou seja, a Alberto Filho. Mas ele está de licença médica e ficará ausente pelos próximos 18 dias.

Diante da proximidade do aniversário de Abreu e Silva, no próximo domingo, Quaresma colocou a questão para o Órgão Especial resolver. “Chegando ao tribunal, em conversas, os colegas me indicaram a incidência do artigo 27, parágrafo 2º, do nosso Regimento Interno, que permite a redistribuição em caso de medida de urgência, já que não poderemos esperar o desembargador Reinaldo voltar de licença. Eu estou rejeitando essa prevenção e coloco a questão em votação ao Órgão Especial”, afirmou.

Imbróglio regimental
Depois de muita discussão sobre como conduzir a redistribuição, a primeira vice-presidente do TJ-RJ, desembargadora Maria Inês da Penha Gaspar, que presidiu o julgamento, sugeriu que o relator suscitasse um conflito negativo de competência — já que ele rejeitou a relatoria do mandado de segurança assim como fizera Alberto Filho.

Definido o procedimento, o Órgão Especial declarou a incompetência de Quaresma para relatar o pedido de Abreu e Silva e determinou a redistribuição do mandado de segurança. O decano do tribunal, desembargador Luiz Zveiter, chamou a atenção do colegiado para não se "atropelar etapas".

Segundo Zveiter, o processo deveria voltar para Alberto Filho. Feito isso, os advogados poderiam requerer a nomeação de um novo relator, em razão da licença médica do desembargador. O desembargador explicou a necessidade da medida para evitar possíveis pedidos de impugnação por pessoas interessadas na vaga a ser deixada por Abreu e Silva.

Alguns desembargadores classificaram o procedimento como burocrático e, por unanimidade, o Órgão Especial determinou a livre distribuição do novo relator. O mandado de segurança deverá ser redistribuído já nesta terça-feira (12/5). O novo relator terá até sexta para decidir se Abreu e Silva continuará no cargo de desembargador do TJ-RJ, mesmo após completar 70 anos.

Tudo parado
Soma-se ao problema da relatoria, o fato de que a emenda estadual foi suspensa pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal. O presidente do TJ-RJ, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, já havia informado que não seguiria o previsto na Emenda Constitucional estadual e continuaria a aposentar os desembargadores que completarem 70 anos. A posição fez com que magistrados recorressem ao STF com pedidos de liminares. 

A decisão de Fux ainda suspende a tramitação de todos os processos que envolvam a aplicação dos dispositivos da emenda constitucional e declara sem efeito os pronunciamentos judiciais ou administrativos que, com fundamento neles, tenha assegurado a qualquer agente público estadual o exercício das funções relativas a cargo efetivo após ter completado 70 anos.

O TJ-RJ não será o primeiro tribunal do país a decidir se estende os efeitos da EC 88/2015, que trata apenas dos membros de tribunais superiores, a seus membros. No Tribunal de Justiça de Pernambuco, uma liminar do dia 8 de maio impediu a aposentadoria do desembargador Nivaldo Mulatinho de Medeiros Correia Filho. O entendimento foi que o caráter nacional do Poder Judiciário impede o tratamento desigual entre os membros da magistratura nacional. 

Processo: 0022332-34.2015.8.19.0000.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!