Vigilante sem vigia

Mudança no CNMP mostra opção por reduzir controle sobre grampos

Autor

7 de maio de 2015, 16h50

Ao decidir que o Ministério Público pode ter um sistema de grampos independente da polícia, o Conselho Nacional do MP deixou de fora propostas para que o uso dessas ferramentas passasse por medidas específicas de controle. Enquanto o relator original do tema sugeriu uma lista de procedimentos, venceu um voto que considera as exigências desnecessárias.

A decisão foi tomada no dia 28 de abril, e o acórdão foi publicado na última quarta-feira (6/5). O CNMP analisou um pedido apresentado em 2012 pela Ordem dos Advogados do Brasil, que cobrou auditorias em sistemas que têm sido adquiridos por órgãos do Ministério Público Estadual e Federal.

Esses sistemas armazenam interceptações telefônicas e cruzam os dados colhidos. Não executam os grampos diretamente, pois dependem de operadoras de telefonia com decisão judicial. Ao menos 21 unidades pelo país adotam algum dos disponíveis hoje no mercado, o que é motivo de críticas da OAB e da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol). Uma das preocupações é com o respeito ao sigilo de comunicações de investigados.

O relator original era o então conselheiro Fabiano Silveira, hoje membro do Conselho Nacional de Justiça. Em 2013, ele apresentou voto determinando que todos os MPs com o sistema passassem por inspeções ordinárias das corregedorias locais em 90 dias e informassem os grampos em andamento, podendo ser responsabilizados caso deixassem de prestar informações. Também previa obrigar que as unidades explicassem quais de suas investigações eram exclusivas e quais eram executadas pela Polícia Judiciária.

Gláucio Dettmar/Agência CNJ
Para Fabiano Silveira, seria oportuno regulamentar o acesso às interceptações.
Gláucio Dettmar/Agência CNJ

Para Silveira, “seria oportuno e conveniente regulamentar o acesso, a operação e procedimentos específicos de segurança e sigilo, como, por exemplo, permissão de acesso e obtenção de senhas, confecção de relatórios, transição das equipes, arquivamento de documentação, controle sobre o ambiente físico em que o equipamento está instalado, rotinas de suporte técnico, contatos com a empresa contratada etc”.

Ele disse que alguns modelos escolhidos, como o Guardião e o Sombra, têm custos “consideravelmente elevados” — a manutenção do primeiro, por exemplo, era em média de R$ 100 mil por ano na época. Por isso, sugeria avaliações rigorosas de custo-benefício.

Silveira apontava ainda que a maioria dos MPs tinha ajuda de policiais para monitorar interceptações. “Se a investigação exclusiva ocorre por alegada deficiência dos serviços prestados pela Polícia Judiciária ou até mesmo por dita fragilidade institucional por sua exposição ao poder político, estranho admitir que o órgão ministerial recorra justamente a quadros das polícias civil e militar para desempenhar as funções reivindicadas pela instituição”, afirmou. Ele recomendou que fossem escalados apenas servidores efetivos do MP na função.

Nova versão
Ao menos quatro conselheiros pediram vista do processo em 2013, e dois deles tiraram algumas das providências sugeridas pelo relator. Já o corregedor nacional do Ministério Público, conselheiro Alessandro Tramujas Assad, votou por afastar as exigências, considerando que já existem formas de controle suficientes.

Conselho Nacional do Ministério Público
Para Alessandro Assad, regularidade das interceptações já é controlada pelo juiz.
Conselho Nacional do Ministério Público

Segundo ele, a regularidade das interceptações pode ser controlada na esfera judicial, pelo juiz que analisa o pedido, pela defesa de investigados e por tribunais recursais. “Na esfera administrativa, tanto o Conselho Nacional de Justiça como o Conselho Nacional do Ministério Público definiram diretrizes a serem observadas nos atos procedimentais das interceptações”, escreveu Assad.

O corregedor disse que a rotina de inspeções “hoje já faz parte das atividades desenvolvidas pela Corregedoria Nacional” e pelas corregedorias-gerais. Afirma ainda que não existe nenhuma representação noticiando o abuso ou ilegalidade na atuação de membros do MP.

A falta de evidências de problemas também é o argumento adotado para afastar procedimentos administrativos ou disciplinares contra unidades que deixem de prestar informações sobre os equipamentos. E suspender a participação de policiais, diz Assad, “não parece a solução mais acertada diante da autonomia administrativa de cada unidade, das realidades existentes em cada Ministério Público, bem como da tradição de cooperação” e os impactos financeiros da medida.

O entendimento do corregedor venceu no Plenário por maioria de votos. Os conselheiros concluíram que unidades do MP devem ter atos normativos internos para disciplinar o acesso e os procedimentos específicos de segurança e sigilo. O Conselho Federal da OAB estuda tomar medidas judiciais contra o uso dos sistemas.

Clique aqui para ler o acórdão do CNMP.

Clique aqui para ler o voto do conselheiro Fabiano Silveira.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!