Equiparação constitucional

Supremo começa a discutir se tráfico privilegiado é crime hediondo

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24 de junho de 2015, 17h42

O Supremo Tribunal Federal começou a discutir nesta quarta-feira (24/6) se tráfico de drogas privilegiado é crime hediondo ou não. O julgamento já conta com quatro votos a favor da hediondez e dois contra, mas foi interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.

A jurisprudência chama de tráfico privilegiado o crime sob as condições do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas. O dispositivo diz que a pena por tráfico de drogas deve reduzida de um sexto a dois terços se for cometido por réu primário, de bons antecedentes, que não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa.

E a jurisprudência do Supremo é de que o crime de tráfico de drogas é equiparado aos hediondos pela Constituição Federal. Isso porque o inciso XLIII do artigo 5º da Constituição diz que “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos”.

O debate estava inserido em um Habeas Corpus que foi afetado ao Plenário por conta da controvérsia de fundo. A pauta desta quarta foi composta apenas de casos com discussões processuais penais que representem divergência de entendimentos entre as turmas.

Até agora, tem sido vencedor o entendimento do ministro Teori Zavascki. Em seu voto, ele analisou que o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas se refere à conduta e “não tem a ver com a situação pessoal do agente”.

“Não posso conceber que um crime seja hediondo no caso de o agente ter maus antecedentes e não seja porque ele tem bons antecedentes. Essa distinção não é suficiente para estabelecermos uma concessão que a Constituição não estabelece”, afirmou Teori.

Nelson Jr./SCO/STF
Cármen Lúcia aponta que penas mais graves não podem ser aplicadas a réu primário e de bons antecedentes.
Nelson Jr./SCO/STF

A relatora do HC sobre tráfico privilegiado é a ministra Cármen Lúcia. Ela votou para que o crime de tráfico, quando cometido com as caraterísticas descritas no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, não possa ser considerado crime hediondo.

Para a ministra, não se podem aplicar a réu primário, de bons antecedentes e que não integra organização criminosa todas as consequências penais aplicadas a crimes hediondos. Para esse tipo de delito, tanto a progressão de regime quanto a concessão de liberdade condicional demoram mais, já que têm prazos mais longos.

Hierpencarceramento
O ministro Luis Roberto Barroso concordou com a relatora. Segundo ele, o Supremo tem adotado, ao longo dos anos, uma jurisprudência que tende a atenuar a equiparação do crime de tráfico à condição de crime hediondo.

Fellipe Sampaio/SCO/STF
Ao votar, Barroso apontou o fracasso da guerra às drogas mediante a exacerbação do Direito Penal.
Fellipe Sampaio/SCO/STF

Barroso apontou, por exemplo, a decisão do STF que considerou inconstitucional o cumprimento da pena em regime inicial fechado. E também a declaração de inconstitucionalidade do impedimento à liberdade condicional e da aplicação de pena restritiva a quem comete crime hediondo.

O ministro também apontou para as questões complexas envolvidas na discussão. A primeira é “o fracasso da guerra às drogas mediante a exacerbação do Direito Penal”. A segunda, “a situação do hiperencarceramento que aflige a todos nós”.

“O crime de tráfico privilegiado comporta uma pena de bem menos que quatro anos. Se aplicadas todas as diminuidoras de pena, ela cai para um ano e oito meses. E se o ordenamento jurídico apena a conduta com um ano e oito meses de prisão, evidentemente não a está tratando como uma conduta que possa receber o tratamento de crime hediondo”, afirmou o ministro.

Só Barroso e Cármen votaram contra a hediondez do tráfico privilegiado. Além de Teori, os ministros Luiz Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Fux divergiram da relatora.

A divergência foi aberta pelo ministro Fachin. Segundo ele, a minorante da Lei de Drogas foi estabelecida "não porque o legislador entendeu que a conduta seja menos grave, mas por razões de política criminal".

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