Jurisprudência Fiscal

A cessão onerosa de fundo de comércio e outras questões tributárias

Autores

  • Mary Elbe Queiroz

    é advogada tributarista sócia da Queiroz Advogados Associados pós–doutora em Direito Tributário (Universidade de Lisboa – Portugal) Doutora em Direito Tributário (PUC-SP) mestre em Direito Público (UFPE) professora e presidente do Conselho Jurídico do Ibrei.

  • Antonio Elmo Queiroz

    é advogado sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.

18 de junho de 2015, 8h00

Spacca
Mary Elbe Queiroz e Elmo Queiroz [Spacca]Em um processo administrativo fiscal federal, restou controvertida a natureza de ativo intangível de uma carteira de clientes de uma empresa varejista, tendo em vista ter havido uma cessão onerosa para terceiro explorar tal carteira, podendo oferecer seus produtos para a clientela da varejista.

A primeira instância de julgamento administrativo interpretou de outra forma a operação, já que com partes vinculadas, enxergando que o pagamento pela cessão seria na verdade uma antecipação de receita, e que portanto não se tratava de “cessão da carteira de clientes do “XX”, mas sim tão somente do direito de oferecer a esses clientes operações financeiras, correspondendo à receita operacional obtida no prazo do contrato (10 anos), em razão da atuação da rede varejista na captação dos clientes. Assim, não procede a alegação de não incidência do PIS e da Cofins sobre essa receita”.

Porém, Turma do Carf considerou que o pagamento pela cessão da carteira de clientes não desnaturou a natureza de bem intangível, integrante do fundo de comércio, portanto não podendo haver tributação de Pis/Cofins; assim ementado e fundamentado:

Acórdão 1201-001.070 (publicado em 18.05.2015)
CESSÃO DE DIREITOS DE EXPLORAÇÃO DE FORMA EXCLUSIVA DE CARTEIRA DE CLIENTES

A cessão da exploração de forma exclusiva quanto à carteira de clientes acrescenta mais valia, e como tal deve ser considerado integrante do fundo de comércio.

Deve ser contabilizado inicialmente no ativo permanente diferido, e a crédito de conta do passivo exigível a longo prazo, não se sujeitando, portanto, à incidência do Pis e da Cofins, nos termos do artigo 1°, parágrafo 3°, inciso II, e artigo 15, inciso I, da Lei n° 10.833/03.

Voto (…)

Ao analisarmos os enunciados trazidos pela recorrente, podemos destacar que a discussão se restringe à natureza jurídica do direito de exclusividade quanto à exploração de carteiras de clientes do “XX”, se esse ativo intangível integra ou não o fundo de comércio, e como conseqüência disso, quando da cessão a terceiros, se os valores recebidos por sob essa rubrica teria o tratamento tributário de ativo permanente, que não se submeteria à incidência do Pis e Cofins nos termos do artigo 1° , parágrafo 3° , inciso II, e artigo 15, inciso I, da Lei n° 10.833/03, que trata da não incidência.

Sob a matéria, segundo as regras contábeis, Pronunciamento do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC n° 4), a natureza jurídica da lista de clientes cedida nos autos, entenda-se a carteira de clientes, poderá receber a rubrica de ativos intangíveis, considerando o contexto. (…)

No caso dos autos, o ativo intangível foi cedido, seu custo foi mensurado, apresenta provável benefício econômico futuro esperado pela entidade adquirente desse bem e seu custo foi mensurado.

Nestes termos, não há dúvidas da natureza jurídica da carteira de clientes do “XX” como ativo intangível para a empresa detentora. (…)

O que nos resta analisar agora é se a referida rubrica permanece como ativo intangível no caso da cessão a terceiros.

Ao analisarmos o que fora cedido a terceiros nos autos, observa-se que integra a operação de cessão dos direitos de exploração da clientela uma referência física, as lojas do “XX” espalhadas pelo Brasil.

Com base nesse ponto de vista, entendo que a cessão da exploração de forma exclusiva quanto à carteira de clientes acrescenta mais valia, e como tal deve ser considerado integrante do fundo de comércio.

Com isso, deve ser contabilizado inicialmente no ativo permanente diferido, e a crédito de conta do passivo exigível a longo prazo, não se sujeitando, portanto, à incidência do Pis e da Cofins, nos termos do artigo 1°, parágrafo 3°, inciso II, e artigo 15, inciso I, da Lei n° 10.833/03.


MPF em foco
Nos julgamentos administrativos federais, firmou-se o entendimento de que uma irregularidade na prorrogação do ato que instaura a fiscalização, que é o Mandado de Procedimento Fiscal (antigo MPF atual TDPF pela Portaria RFB 1.687/14), não acarreta a nulidade de um lançamento tributário; pois “a falta de prorrogação do MPF no prazo correto, por si só, não configura cerceamento do direito de defesa e não se equipara à ausência de MPF” (Acórdão 9101-002.132, publicado em 14.05.2015).

Porém, um contribuinte discutiu a questão judicialmente, alegando ter sido autuado por autoridade fiscal sem competência para o procedimento, já que não houve prorrogação do MPF em tempo hábil.

Apreciando a questão, Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região decretou a nulidade do procedimento fiscal que veiculou o auto de infração do contribuinte, apontando que não ficou comprovado que a prorrogação ocorreu tempestivamente; assim ementado:

Apelação Cível 0003308-48.2011.4.01.3507 (publicado em 22.05.2015)
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE PROCEDIMENTO FISCAL. PRORROGAÇÃO IRREGULAR. MANUTENÇÃO DO AUDITOR FISCAL ORIGINÁRIO. ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, DA PORTARIA SRF Nº 3.007/2001.   

1. Na hipótese vertente, o Mandado de Procedimento Fiscal – MPF tem por data inicial o dia 26/02/2009 e deveria ter sido concluído no prazo de sessenta dias, conforme determinava a Portaria SRF nº 3.007/2001 (art. 12) e determina atualmente a Portaria RFB nº 1.687/2014 (art. 11), pois se cuida de Procedimento Fiscal de Diligência (coleta de informações). Assim, o prazo de validade do MPF se encerrou no dia 27/04/2009.

2. A Fazenda Nacional alega que “tanto houve a prorrogação regular do MPF que em 30/06/2009 a DRF-Goiânia expediu o Termo de Intimação nº 02 (recebido pelo contribuinte em 06/07/2009) solicitando novos documentos do contribuinte”.

3. Ora, em 30/06/2009 o prazo de validade do MPF já estava extinto, como visto acima, e a Fazenda Nacional, por sua vez, nem sequer informa o dia em que houve a efetiva prorrogação do ato fiscalizatório. Na verdade, cabia à Fazenda Nacional demonstrar a data em que houve a prorrogação do Mandado de Procedimento Fiscal (art. 333, II, do Código de Processo Civil). (…)

6. Entretanto, a Fazenda Nacional nem sequer alude à existência daquele registro eletrônico para demonstrar a regular prorrogação do MPF com a manutenção do auditor fiscal originário. Houve, portanto, violação ao art. 16, parágrafo único, da extinta Portaria SRF nº 3.007/2001. (…)

8. Apelação provida. Sentença reformada. Pedido julgado procedente.


Decisões variadas
a) No Acórdão 3102-002.402 (publicado em 03.06.2015), Turma do Carf, analisando aspecto relevante para o deslinde da causa, que era até do conhecimento prático do julgador mas que não foi registrado pela fiscalização, considerou inviável manter a autuação pois seria inovação; assim ementado: “o julgamento do auto de infração controvertido deve observar os limites da lide. A acusação veiculada pelo Fisco no relatório de auditoria que narra os fatos identificados durante o procedimento e as infrações cometidas pela parte delimitam o julgamento. Se a Fiscalização, embora ciente do fato, não o considerou irregular, não cabe ao julgador torná-lo, e decidir com base nesse entendimento”.

b) No Acórdão 1402-001.944 (publicado em 26.05.2015), Turma do Carf julgou intempestivo recurso já que, mesmo tendo o contribuinte aderido ao Domicílio Tributário Eletrônico (DTE), houve intimação postal com perda de prazo, o que é válido pois a legislação afasta a obrigatoriedade da intimação eletrônica para intimar; assim ementado: “não existe ordem de preferência entre as intimações pessoal, postal e eletrônica”.

Autores

  • Brave

    é advogada e professora, pós-doutora em Direito Tributário pela Universidade de Lisboa, e doutora pela PUC-SP; mestre em Direito Público pela UFPE; presidente do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil; presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários; membro imortal da Academia Brasileira de Ciências Econômicas, Políticas e Sociais; membro do Conselho Jurídico da Fiesp (Conjur); sócia do escritório Queiroz Advogados Associados e Palestrante da FocoFiscal.

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    é advogado, sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.

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