Consultor Jurídico

Crises e oportunidades de crescimento nas relações trabalhistas

12 de junho de 2015, 15h40

Por Paulo Sergio João

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Spacca
Os momentos de crise econômica usualmente acirram as disputas trabalhistas por razões perfeitamente compreensíveis: do lado dos empregadores, a incerteza do crescimento e a necessidade de contenção de despesas para preservar a competitividade; do lado dos trabalhadores, a incerteza na manutenção dos empregos e o terreno pouco fértil para adoção de novas melhorias nas relações de trabalho. E os dois lados estão ameaçados pelas medidas econômicas para combater a crise do Estado.

Neste cenário, em lugar de preparar o futuro, todos buscam a solução imediatista com destaque para a intransigência. A questão que se coloca de imediato é de saber se nos momentos de crescimento e de pujança as negociações souberam se preparar de modo claro e maduro para o futuro a fim de enfrentar eventuais crises.  A resposta é de simples constatação: não houve preparação.

Fora do período de crise não há notícias de negociações coletivas preventivas e eventuais dificuldades poderiam ser amparadas por meio de negociação coletiva, observando as hipóteses legais inseridas por medidas provisórias no ordenamento jurídico no final do governo FHC: suspensão do contrato de trabalho e contrato de trabalho a tempo parcial (MP 2.164-41, de 24/08/2001, DOU 27/08/2001). 

No atual período da crise instalada, com grande imprevisibilidade de término, os instrumentos legais já se mostraram insuficientes de parte a parte.

Os trabalhadores atribuem os riscos da atividade econômica aos empresários, deixando de considerar que as dificuldades não são pontuais, relativamente a um negócio ou outro, mas são gerais e setoriais e que impedem a utilização do argumento de risco econômico exclusivo.

As empresas, de seu lado, precisam manter o mesmo ritmo de produção, descapitalizando-se do investimento em formação profissional e técnica por meio de planos de demissão voluntária ou não.

A visita aos sítios dos Tribunais Trabalhistas demonstra uma fragilidade perversa das relações coletivas de trabalho: a incapacidade de se conciliar de forma autônoma, buscando a melhor solução nos locais de trabalho e preparando-se para o futuro. A Justiça do Trabalho atua na mediação de conflitos coletivos de trabalho e até submetem os desentendimentos (que não são jurídicos em sua maioria) a julgamento, aumentando a separação dos que deveriam estar interessados na solução adequada do conflito. Toda decisão judicial em dissídio coletivo resolve o processo mas não o conflito.

Os momentos de crise poderiam representar um avanço nas relações trabalhistas, com soluções harmônicas e com previsibilidade de vigência mais duradoura.

No final da II Guerra Mundial as negociações tripartites entre Estados, representantes de empregadores e de trabalhadores, estimularam significativo avanço nas conquistas trabalhistas na Europa, dando às empresas oportunidade de crescimento equilibrado e aos trabalhadores nível de participação no desenvolvimento econômico com responsabilidade.

Não estamos em final de guerra, mas é flagrante a necessidade de transformação das relações trabalhistas e sua forma de representação e modelo de negociação coletiva. Ou, dito de outra forma, o paradigma histórico precisa ser alterado porque não atende mais às necessidades sociais e econômicas da sociedade.

Dentro desse processo de transformação constante das relações trabalhistas e da necessidade de maior integração dos trabalhadores, chama a atenção, a proposta do governo francês para a representação dos trabalhadores (projet de loi relatif ao dialogue social e à l’emploi) que inclui a criação de comissões regionais paritárias para empresas com menos de 11 empregados e reduz o número de temas objeto de entendimentos entre empresa e empregados, de 17 para 03: orientação estratégica da empresa e suas consequências; situação econômica da empresa e política social. Em relação à obrigação de negociar, também há sensível alteração encaminhada na proposta, com a negociação em 3 blocos: (i) remuneração, tempo de trabalho e participação e (ii) resultado e qualidade de vida, com negociação todos os anos e (iii) gestão de empregos e de evolução profissional. Estas medidas são acompanhadas de outras que procuram ampliar a forma de proteção social dos trabalhadores de baixa renda.

É fato que nosso país tem peculiaridades que sempre são invocadas para justificar o modelo trabalhista em que nos encontramos. Todavia, vale a reflexão de que a revisão de comportamento é necessária a fim de que a superação das dificuldades de hoje possa construir um futuro de convivência harmônica.