Controle de constitucionalidade

Financiamento empresarial a campanhas claramente viola Constituição

Autor

  • Ademar Borges de Sousa Filho

    é doutorando em Direito Público pela Uerj e mestre em Direito Constitucional pela UFF. É professor de Direito Constitucional da Uerj. procurador do município de Belo Horizonte advogado e membro do Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais (CBEC).

1 de junho de 2015, 17h44

O Supremo Tribunal Federal iniciou em 2013 o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Conselho Federal da OAB por meio da qual se pretende impedir que pessoas jurídicas façam doações eleitorais e limitar as doações feitas por pessoas físicas.

Cinco votos (ministros Luiz Fux, Marco Aurélio, Dias Toffoli, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski) reconheceram, até o momento, a inconstitucionalidade da autorização legislativa para doações eleitorais feitas por pessoas jurídicas. Um voto (ministro Teori Zavascki) afirmou a constitucionalidade do financiamento empresarial de campanhas eleitorais. E um voto (ministro Luís Roberto Barroso) afirmou a inconstitucionalidade do atual modelo de financiamento empresarial de campanhas eleitorais, remetendo ao Congresso Nacional a possibilidade de instituir um novo parâmetro normativo que, sem afastar o financiamento eleitoral por pessoas jurídicas, preserve o princípio da isonomia no processo eleitoral. O julgamento foi interrompido há mais de um ano por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.

O modelo de financiamento de campanhas eleitorais praticado atualmente no Brasil constitui objeto simultâneo de uma ação direta de inconstitucionalidade em curso no Supremo Tribunal Federal e de diversas proposições legislativas. A complexidade da controvérsia, em grande parte devida à abstração (ou baixa densidade normativa) dos princípios constitucionais em jogo (princípio da isonomia, princípio democrático e princípio republicano), faz com que os diversos intérpretes da Constituição (Judiciário, Congresso Nacional e sociedade civil) discordem das soluções a serem empregadas para o aperfeiçoamento do processo eleitoral e da representação política.

A transposição do debate parlamentar – mais recentemente materializado pela aprovação, pela Câmara dos Deputados, da Proposta de Emenda à Constituição 182 de 2007, por meio da qual se pretende constitucionalizar a doação empresarial para campanhas eleitorais – para o Supremo Tribunal Federal, por meio do ajuizamento pela OAB da ação direta de inconstitucionalidade, demonstra, uma vez mais, a atualidade da percepção de que o Judiciário tem desempenhado papel fundamental na discussão dos grandes temas nacionais[1].

Na linguagem norte-americana, mais recentemente incorporada ao dicionário jurídico nacional, dir-se-ia que a intervenção do STF em tema de altíssima repercussão política como a do financiamento das campanhas eleitorais representaria um reforço a uma posição ativista da Corte constitucional.

O termo ativismo judicial tem sido usado ao longo dos últimos anos com significados tão diversos que levou alguns importantes constitucionalistas brasileiros – como os ministros Luís Roberto Barroso e Carlos Ayres Britto – a abandonarem a expressão. A grande diversidade de sentidos atribuídos à expressão ativismo judicial contribui para o processo de perda da sua identidade conceitual: a significar tudo passa a não dizer nada[2].

Propomos reconduzir o debate de modo mais estrito à confrontação direta entre as normas legais impugnadas na ação direta de inconstitucionalidade e o parâmetro de controle. Embora reconhecendo que a intervenção do Supremo possa ser caracterizada como ativista – partindo de um conceito neutro de ativismo judicial –, não parece ser sustentável a objeção lançada contra a posição sustentada pela corrente majoritária no sentido de que a solução por eles alvitrada – ao afirmar a inconstitucionalidade do atual modelo de financiamento empresarial de campanhas – assentaria exclusivamente em princípios dotados de alto grau de abstração[3].

A recente contribuição de Carlos Alexandre de Azevedo Campos, depois de identificar como núcleo comportamental do ativismo judicial a expansão de poder decisório que juízes e cortes promovem sobre os demais atores relevantes de uma dada organização sócio política e constitucionalmente estabelecida[4], defende a atribuição de um sentido neutro para o ativismo judicial quanto à correção de mérito das decisões proferidas nesse contexto:

A correção de mérito, portanto, sequer assegura a legitimidade das decisões ativistas. A interpretação correta da constituição como elemento indispensável do acerto de mérito de uma decisão é uma coisa, enquanto a interpretação correta da constituição sobre quem tem o poder de tomar essa decisão é outra. É esta ultima que diz sobre o ativismo judicial. Definitivamente, postura institucional e correção de mérito das decisões judiciais são coisas distintas, e o ativismo judicial refere – se apenas à primeira o que, aliás, é a única perspectiva que corresponde fielmente ao sentido original de “ativismo judicial” formulado por Schlesinger: “uma expressão da discussão acerca do papel do Judiciário, e da Suprema Corte em particular, no sistema político norte americano” (Capítulo I, item 2, supra).

Além de nada dizer sobre a correção das decisões no mérito, o ativismo judicial nada diz sobre a legitimidade ou a ilegitimidade a priori das decisões judiciais. A conclusão de que um decisão judicial é ativista não significa adiantar o resultado da avaliação de sua ilegitimidade. Ativismo judicial não é sinônimo de ilegitimidade, e essa correlação simplesmente não pode ser feita de modo apriorístico e em nível puramente conceitual. Pensar de modo diverso daria razão àqueles que afirmam a absoluta inutilidade do termo: bastaria então substituí-lo por ilegitimidade.[5]

A percuciente proposta formulada por Campos afasta a perspectiva consistente em afirmar aprioristicamente que uma decisão judicial ativista é legítima ou ilegítima, “pois isso dependerá, em cada caso concreto, da conformidade do exercício do poder judicial com os limites institucionais mais ou menos claros impostos pela respectiva constituição de regência e pelas diferentes variáveis políticas e sociais presentes”[6].

De fato, é de pouca – ou nenhuma – valia atribuir a pecha de ativistas às decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal, sem que se realize um esforço dogmático voltado à demonstração da correção normativa da solução alvitrada pelo Tribunal em face da Constituição[7].

A postura ativista adotada nos últimos anos pelo STF, sob o prisma metodológico, manifesta-se em grande medida por meio de decisões reveladoras de (i) expansão normativa de princípios para regular condutas concretas e restringir a liberdade de conformação normativa do legislador ou de (ii) criação de novas regras constitucionais extraídas da inteireza da constituição.

A interpretação de princípios constitucionais dotados de baixa densidade normativa tem conduzido o Supremo a inovar na ordem jurídica constitucional e legal por meio da introdução de novas disciplinas normativas. Ao descrever como feição metodológica do ativismo judicial a adoção de comportamento decisório típico de legislador positivo, Carlos Alexandre de Azevedo Campos conclui que

[s]erá então ativista, porque naturalmente dotada de auto teor de criatividade normativa, toda decisão judicial expansiva dos significados de princípios constitucionais abstratos e imprecisos a ponto de regular diretamente condutas concretas, excluir o espaço de liberdade de conformação do legislador democrático, criar novas regras constitucionais e direitos fundamentais implícitos, não obstante esses princípios revelarem tão só os fins constitucionais relevantes a serem concretizados e não os meios concretos a serem empregados.[8] O juiz constitucional ativista substitui o legislador na tarefa de definir esses meios, complementando e exaurindo ele mesmo a linha de valoração iniciada pelo constituinte originário.[9]


 

O nível de criatividade da decisão judicial – mais até do que a sua feição formal de anulação de normas existentes (legislador negativo) ou de inserção de novos segmentos normativos (legislador positivo) – tem sido considerado fator relevante da discussão sobre a legitimidade da intervenção promovida pelo Supremo no julgamento de controvérsias constitucionais.

 

A extração de efeitos concretos a partir de princípios dotados de baixíssima densidade normativa pode ser alvo de críticas baseadas na conhecida dificuldade contramajoritária da jurisdição constitucional. Diante da possibilidade de interpretações diversas a propósito do sentido de princípios constitucionais vagos, poder-se-ia cogita de que caberia preferencialmente ao Congresso Nacional, e não ao Judiciário, a atribuição de um sentido dotado de maior densidade normativa.

A representação subscrita pelos ilustres professores Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto à OAB defendeu a tese de que o atual modelo de financiamento das campanhas eleitorais, ao ensejar uma nefasta influência do poder econômico no resultado dos pleitos, afrontaria o princípio da igualdade (art. 5o, caput), o princípio democrático (art. 1o, caput, e art. 14), o princípio republicano (art. 1o) e o princípio da proporcionalidade.

A ação direta de inconstitucionalidade apresentada pelo Conselho Federal da OAB reproduziu os mesmos termos da representação. Os argumentos esgrimidos com grande percuciência pelos subscritores da ação direta de inconstitucionalidade e da representação que lhe subsidiou constituem a base fundamental, de resto suficiente, para a declaração de inconstitucionalidade da disciplina normativa vigente.

Entretanto, como o controle concentrado de constitucionalidade possibilita o exame da compatibilidade das normas impugnadas com todas as normas constitucionais – causa de pedir aberta –, pode-se agregar aos argumentos já apresentados com a inicial da ação direta um fundamento adicional: o financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas afronta o § 9º do art. 14 da Constituição – “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta” – precisamente por fomentar, ao invés de impedir, a influência do poder econômico nas eleições.

A norma constitucional inscrita no § 9º do art. 14 da Constituição revela que a influência do poder econômico constitui, por opção do constituinte, fator apto a abalar a normalidade e legitimidade das eleições. A alta densidade normativa do dispositivo parece não deixar espaço para dúvidas: a Constituição sinaliza o fim (proteger a normalidade e legitimidade das eleições) e estabelece o meio (impedir a influência do poder econômico). Há uma prévia opção constitucional, portanto, no sentido de considerar como fator de desestabilização das regularidade das eleições a influência do poder econômico.

Note-se, a propósito, a distinção entre o abuso do poder econômico – exigido para a impugnação do mandado eletivo em curso perante a Justiça Eleitoral (§ 10 do art. 14 da Constituição) – e influência do poder econômico. É claro que a influência do poder econômico pode ou não caracterizar abuso do poder econômico: aquela a significar a interferência em sentido amplo do poder econômico e este caracterizado pelo exercício do poder econômico de modo a violar a intenção normativa que fundamenta a livre iniciativa.

A Constituição não se contenta, portanto, com a vedação ao abuso do poder econômico, mas estabelece claramente a obrigação do legislador complementar de impedir a influência do poder econômico nas eleições. Passado em revisão o parâmetro de controle incidente sobre a controvérsia, conclui-se que a Constituição não se satisfaz com a proscrição do excesso ou do superdimensionamento da força econômica no processo eleitoral. Vai além e exige do legislador complementar a neutralização do poder econômico nas eleições.

O financiamento empresarial de campanhas eleitorais, além de violar os diversos princípios constitucionais (princípio da isonomia, princípio democrático, princípio republicano e princípio da proporcionalidade), afronta regra constitucional específica que impõe a vedação à influência do poder econômico como meio necessário para a garantia da normalidade e da legitimidade das eleições.

Os princípios constitucionais, mesmo dotados de baixa densidade normativa, podem funcionar autonomamente como fundamentos para a declaração de inconstitucionalidade de leis infraconstitucionais. Entretanto, a inserção do § 9º do art. 14 da Constituição – norma caracterizada como típica regra jurídica e dotada de maior densidade normativa – como parâmetro de controle da constitucionalidade da lei que autoriza o financiamento empresarial de campanhas eleitorais alivia a pressão sofrida pelo Supremo Tribunal Federal em razão da possível tomada de decisão de grande relevância política a partir exclusivamente de princípios constitucionais vagos.

Afasta-se, com isso, a alegação de que o Supremo estaria, diante da amplitude semântica dos princípios constitucionais em jogo, impondo empeços artificiais às alternativas que a Constituição teria oferecido ao legislador para promoção de ajustes normativos no sistema de financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais. Um modelo normativo de financiamento dos pleitos eleitorais que fomente a influência do poder econômico é contrário à Constituição e como tal deve ser reconhecido.

É certo que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADPF 144/DF, firmou, contra os votos de um dos subscritores deste artigo e do ministro Joaquim Barbosa, o entendimento de que a regra inscrita na primeira parte do § 9º do art. 14 da Constituição – “lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato” – não é autoaplicável.

Desse modo, a definição de novos casos de inelegibilidade e a estipulação dos prazos de sua cessação – a fim de proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato – dependem da edição de lei complementar. Não há, entretanto, pronunciamento do STF estabelecendo que a segunda parte do mesmo dispositivo – proteção da “normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico” – dependa, para a produção plena de seus efeitos, da edição de lei complementar.

Nada obstante, e ainda que se rejeite a auto-aplicabilidade de todo o disposto constitucional (§ 9º do art. 14 da Constituição), não se pode negar que a lei aprovada em desconformidade com o objetivo nele consubstanciado – neutralização da influência do poder econômico nas eleições – deve ser declarada inconstitucional.

A produção da máxima eficácia do § 9º do art. 14 da Constituição (eficácia positiva), de modo a tornar viável a imediata exigência (inclusive judicialmente) da neutralização da influência do poder econômico nas eleições, pode até demandar a edição de lei complementar. Isso não impede, contudo, que uma lei aprovada em desconformidade com o conteúdo normativo desse dispositivo constitucional (eficácia negativa) seja declarada inconstitucional.

Compõe o conhecimento convencional do Direito Constitucional o dogma segundo o qual toda norma constitucional, mesmo as ditas programáticas, ostenta positividade jurídica imediata que se manifesta como limite negativo, que impõe, nas palavras de Canotilho, “eventual censura, sob a forma de inconstitucionalidade, em relação aos atos que as contrariam”[10].


 

Qualquer norma constitucional, ainda que desprovida de plena eficácia jurídica, segundo Luís Roberto Barroso, gera efeito imediato consistente em carrear um juízo de inconstitucionalidade para os atos normativos editados posteriormente, se com ela incompatível[11].

Nenhuma norma constitucional é desprovida de alguma eficácia. As normas constitucionais que exigem complementação legislativa para produzir efeitos plenos são classificadas como de eficácia limitada (José Afonso da Silva). Essa eficácia parcial, porque não plena, tem um sentido negativo do qual resulta a possibilidade de revogar regras preexistentes ou anular as posteriores que contrariem a norma constitucional de eficácia limitada. Essa mínimo de eficácia do § 9º do art. 14 da Constituição (eficácia negativa ou paralisante) impede a produção de efeitos por normas infraconstitucionais contrárias ao objetivo constitucional de impedir a influencia do poder econômico nas eleições.

Se o intérprete pode limitar a eficácia positiva do § 9º do art. 14 da Constituição, exigindo-lhe intermediação legislativa, o mesmo não se pode dizer a respeito da sua eficácia negativa. Esta é, sem dúvida, imediata. A ativação da eficácia negativa da norma constitucional é suficiente para a declaração de inconstitucionalidade da legislação infraconstitucional que permite a doação empresarial para campanhas eleitorais.

 


[1] A Constituição brasileira em vigor, por um lado, é farta em preceitos de feição substancial; e por outro, oferece amplas de possibilidades de exercício da jurisdição constitucional a partir desse referencial normativo substantivo. Desse contexto, ao qual se pode somar uma perceptível tendência de canalização de demandas até então depositadas integralmente nos procedimentos políticos para os procedimentos judiciais, não se poderia esperar outra coisa senão a expressiva judicialização da política atualmente experimentada entre nós. (Cf., a esse respeito, VIANNA, Luiz Werneck; CARVALHO, Maria Alice Rezende de; MELO, Manuel Palácios Cunha; BURGOS, Marcelo Baumann. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Renan, 1999.)

[2] Marcelo Casseb Continentino expõe uma série de críticas ao uso da expressão ativismo judicial no cenário brasileiro que podem ser assim sintetizadas: (i) o conceito de ativismo judicial, em geral, é revestido no Brasil de uma conotação negativa, que expressa extrapolação das funções inerentes ao Poder Judiciário; (ii) aqui reside o primeiro problema, pois o legítimo exercício das funções judiciais é tudo menos objeto de consenso; (iii) o conceito de ativismo judicial, de maneira geral, tem sido vítima de um uso retórico e simplista, não se revelando minimamente eficaz para uma crítica sólida e consistente da jurisprudência brasileira; (iv) dito de outro modo, o quadro revela uma generalizada crítica superficial e não fundamentada de decisões judiciais e, em particular, do Supremo Tribunal Federal, o que, no fundo, revela uma mera ideologização da visão de nossa prática judicial e do seu discurso crítico. (Cf. CONTINENTINO, Marcelo Casseb. Ativismo judicial: proposta para uma discussão conceitural. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 49, n. 193, p. 145, jan./mar. 2012.)

[3] Essa visão foi defendida pelo Ministro Teori Zavascki em voto vencido proferido no julgamento da ADI 4650: “A segunda constatação – essa no estrito domínio normativo e, portanto, mais sensível ao juízo a ser feito na presente ação – é a de que a Constituição Federal não traz disciplina específica a respeito da matéria. Essa constatação resulta claramente estampada na própria petição inicial, que, para sustentar a inconstitucionalidade dos preceitos normativos atacados, invocou ofensa a principio constitucionais de conteúdo marcadamente aberto e indeterminado: o princípio democrático, o princípio republicano, o princípio da igualdade”.

[4] A propósito, Carlos Alexandre de Azevedo Campos afirma: “A primeira e fundamental lição diz como a verificação do que Ernest Young chamou de “linha comum” de comportamento que caracteriza as diferentes decisões ativistas: o aumento da relevância da posição político –institucional de juízes e cortes sobre os outros atores e instituições relevantes de uma dada ordem constitucional. Comum a todos os exemplos de cortes ativistas retratadas anteriormente e às suas diversas formas de manifestação de ativismo judicial, está sempre o exercício expansivo e vigoroso, estratégico ou não, de autoridade político – normativa no controle dos atos e das omissões dos demais poderes, seja impondo – lhes obrigações, anulando as decisões, ou atuando em espaços tradicionalmente ocupados por aqueles. O núcleo comportamental do ativismo judicial é a expansão de poder decisório que juízes e cortes promovem sobre os demais atores relevantes de uma dada organização sócio política e constitucionalmente estabelecida.” (Campos, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro : Forense, 2014, p. 151-152). Em síntese, afirma o mesmo autor, [d]efino o ativismo judicial como o exercício expansivo, não necessariamente ilegítimo, de poderes político-normativos por parte de juízes e cortes em face dos demais atores políticos, que: (a) deve ser identificado e avaliado segundo os desenhos institucionais estabelecidos pelas constituições e leis locais; (b) responde aos mais variados fatores institucionais, políticos, sociais e jurídico-culturais presentes em contextos particulares e em momentos históricos distintos; (c) se manifesta por meio de múltiplas dimensões de práticas decisórias.” (Campos, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro : Forense, 2014, p. 164).

[5] Campos, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro : Forense, 2014, p. 157-158.

[6] Campos, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro : Forense, 2014, p. 159.

[7] Por isso que Continentino propõe como o mais importante critério de observação das decisões judicial à luz desse parâmetro semântico do ativismo judicial a noção de integridade (Dworkin) ou coerência (Fallon Jr) do direito: “Pensar o direito a partir dessa concepção nos faz compreender que juízes e intérpretes têm o papel de perpetuar o projeto constitucional como se fossem parceiros de uma empresa comum. O direito, na metáfora de Dworkin, é imaginao como um “romance em cadeia”, cujos capítulos devem ser coerentemente escritos por cada uma das gerações e membros integrantes da comunidade político-jurídica sem que se deixe perder o fio, o elo da história. Com isso, os precedentes judicias assumem valor ímpar, pois apontam para a exigência, sobretudo dirigida aos juízes e tribunais, de construção de uma jurisprudência coerente. Por mais abstratos que sejam os princípios constitucionais, não é dado ao intérprete, ao julgar um caso concreto, desconsiderar toda a construção constitucional edificada sobre a interpretação de um princípio constitucional” (CONTINENTINO, Marcelo Casseb. Ativismo judicial: proposta para uma discussão conceitural. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 49, n. 193, p. 146, jan./mar. 2012). Cláudio Pereira e Daniel Sarmento acentuam que a concepção do Direito como “integridade”, tal como proposta por Dworkin, incita à procura de uma resposta correta para cada caso difícil como uma espécie de “ideal regulativo”, de modo que a solução deve ser buscada pelo juiz por meio de um procedimento hermenêutico que leve em consideração elementos como o texto dos preceitos incidentes, a sua história e os precedentes, mas que procure, sem ignorar esses dados, tornar o Direito o melhor que ele pode ser, no sentido da promoção da justiça. (Cf. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel. Direito Constitucional – Teoria, História e Métodos de Trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 430.)

[8] Sobre os riscos dessa pratica, cf. SARMENTO, DANIEL. O neoconstitucionalismo no brasil: riscos e possibibilidades. In: LEITE, George Salomão; SARLETE, Ingo Wolf Gang (org.). Direitos Fundamentais e Estado Constitucional. Estudos em homenagem AJ.J. Gomes Canotilho. Op. Cit., p. 40-41.

[9] Campos, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 279.

[10] GOMES CANOTILHO, J.J. Direito Constitucional, 5a ed., 1991, p. 190.

[11] BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, 2. ed., Renovar, 1993, p. 112.

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    é doutorando em Direito Público pela Uerj e mestre em Direito Constitucional pela UFF. É professor de Direito Constitucional da Uerj. procurador do município de Belo Horizonte, advogado e membro do Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais (CBEC).

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