Empregos em risco

TJ do Rio de Janeiro proíbe O Boticário de rescindir contrato com franqueado

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23 de julho de 2015, 13h01

O desembargador Paulo Sérgio Prestes dos Santos, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, indeferiu o recurso do Grupo Boticário contra a decisão de primeira instância que proibiu a empresa de rescindir a relação comercial com um franqueado de Resende, cidade da região do Vale do Paraíba fluminense. A empresa alegou que a rescisão se devia a inadimplência. Mas com base no princípio social do contrato, o juiz do caso ponderou que a companhia tinha o dever de cooperar. A determinação é da última segunda-feira (20/7).

Segundo Bruno Costa, advogado do escritório Bruno Calfat Advogados e representante legal do franqueado, a relação contratual já dura 30 anos. Ao todo, seu cliente possui seis lojas do O Boticário em Resende e nas cidades contíguas de Itatiaia e Porto Real, além de um ponto de venda direta, que garante renda a cerca de 500 pessoas que atuam como consultores da marca.

O advogado conta que o imbróglio teve início após o franqueado questionar algumas diretrizes comerciais da companhia. Ele recebeu uma notificação do grupo que lhe dava 30 dias para encerrar as atividades das franquias. Indignado, entrou na Justiça a fim de garantir a continuidade do negócio.

O caso foi distribuído à 1ª Vara Cível de Resende, que concedeu a liminar em favor do franqueado no dia 7 de julho. Para o juiz Marvin Ramos Rodrigues Moreira, que assinou a decisão, há periculum in mora, na medida em que o encerramento das atividades pode trazer dificuldades financeiras consideráveis em razão da demissão de funcionários e por impedir os autores de cumprirem seus compromissos fiscais e contratuais — fatos que caracterizam “a lesão grave e de difícil reparação”.

Segundo Bruno Costa, “a decisão se preocupou não apenas com o funcionamento das lojas, mas também com os funcionários e representantes da marca, que sofreriam lesões imediatas”. O problema é que a empresa não cumpriu a determinação. De acordo com ele, inclusive deixou de atender os pedidos do franqueado para reposição dos produtos.

O advogado comunicou o fato a 1ª Vara Cível de Resende, que no último dia 14 proferiu outra decisão, desta vez para aumentar a multa diária de R$ 500 para R$ 5 mil caso o descumprimento continuasse. Ao mesmo tempo, o Boticário interpôs recurso no TJ-RJ.

Problema de inadimplência
No agravo de instrumento que protocolou, a empresa pediu a suspensão da liminar sob o argumento de que sua decisão de rescindir o contrato se devia a inadimplência do franqueado. No recurso, a empresa informou que primeiro enviou uma notificação para requerer o pagamento do valor devido pelo franqueado no prazo de 48 horas, “sob pena de serem tomadas as providências contratuais e legais cabíveis, visto que não poderia aguardar indefinidamente a melhora dos rendimentos da agravada [ou seja, do franqueado]”.

Segundo o Boticário, como o pagamento não ocorreu, enviou nova notificação, desta vez para dar ao franqueado 30 dias para o encerrar as atividades de suas franquias. A empresa defendeu que “a conduta de denunciar o contrato unilateralmente foi regular e de acordo com a cláusula contratual expressa”, pois “nenhum vínculo pode ser eterno, principalmente quando uma das partes já manifestou o interesse em não mais prosseguir com o contrato”.

O desembargador Paulo Sérgio Prestes dos Santos, que relata o caso, não aceitou os argumentos. Ao apreciar o pedido de suspensão da liminar, ele destacou que essa medida pode, segundo o inciso 3º do artigo 527 do Código de Processo Civil, ser deferida sempre quando a decisão agravada trouxer risco de lesão grave e de difícil reparação ao recorrente.

Mas, para o relator, “o deferimento do efeito suspensivo causaria maior lesão aos agravados”.

Dever de cooperar
Segundo o desembargador, o longo tempo de relação contratual entre as partes geraram deveres acessórios, dentre os quais o de cooperação a fim de se “evitar situações danosas para a contratante que se encontra em situação de desvantagem contratual”.

A esse fato devem ser somados, de acordo com o ele, os princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, que norteiam o Código Civil de 2002 e que tem o “intuito de considerar os contratantes como verdadeiros parceiros — devendo eles, portanto, atuarem de forma a garantir a finalidade do negócio entabulado”.

Sem manifestação
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do O Boticário informou que o grupo "cumpre a lei e as decisões judiciais, e não comenta o processo em análise no Poder Judiciário”.

Clique aqui para ler a decisão do TJ-RJ.

Processo 0037547-50.2015.8.19.0000.

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