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Rede social deve responder objetivamente por teor ofensivo, diz professor

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12 de julho de 2015, 16h13

Não faz sentido que sites e portais de notícias sejam responsabilizados objetivamente por declarações ofensivas feitos de entrevistados e comentaristas de internet enquanto redes sociais podem ser absolvidas por conteúdo inadequado, tanto por retirarem-no em tempo hábil quanto pela alegação de que não têm como monitorar todas as postagens de usuários. Essa é a opinião do professor Rafael Peteffi da Silva, responsável pela área de Direito Civil na Universidade Federal de Santa Catarina.

“Entendo que um grande debate crítico deveria ser realizado a esse respeito, pois tenho dificuldade em admitir que órgãos de imprensa, absolutamente fundamentais em um Estado Democrático de Direito, com programas ‘ao vivo’ ou chats em tempo real, respondam pelo risco de não possuírem um controle editorial, enquanto gigantescas empresas administradoras de redes sociais não sejam responsáveis pela falta de controle dos conteúdos postados, nem mesmo para o caso de perfil falso, cuja criação poderia ser facilmente controlada de maneira mais eficiente”, analisa Silva.

O problema reside na aplicação da responsabilidade objetiva, pilar do Código de Defesa do Consumidor. Usando esse comando legal, o Superior Tribunal de Justiça já condenou um canal de televisão por declarações de um entrevistado feitas ao vivo (REsp 331.182). Em outro caso, a corte responsabilizou um portal de internet por comentários ofensivos postados em tempo real (REsp 1.352.053).

Nas duas situações, os ministros entenderam que o controle editorial do conteúdo está relacionado à atividade jornalística. Por isso, se algo veiculado ofender alguém, a empresa deve responder pelos danos.

Essa interpretação, no entanto, não tem sido usada quando o réu é uma rede social. Em processos desse tipo, os magistrados têm seguido a solução do notice and take down, segundo a qual o site não pode ser responsabilizado por conteúdos ofensivos se retirá-lo do ar em tempo hábil. A jurisprudência tem entendido não ser possível exigir que Facebook, Twitter ou Instagram controlem as milhões de postagens de usuários. O método foi consagrado pelo Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014).

Silva aponta que o STJ já reconheceu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações entre redes sociais e seus usuários, pois os sites ganham com o uso dos dados dos internautas, mesmo que os serviços não sejam pagos. Se essa é uma relação de consumo, afirma, não dá para relativizar a responsabilidade objetiva.

“Esse raciocínio não está de acordo com a tradição jurídica brasileira e estrangeira em relação à análise de fenômenos regidos pela lógica da responsabilidade objetiva: ou o dano causado está fora do risco da atividade ou a empresa deve indenizar, pouco importando se ela tinha condições técnicas para efetuar o controle.”

O professor ainda ironiza as palavras usadas para justificar o afastamento da responsabilidade objetiva apenas para redes sociais, e não para jornais e canais de televisão: “Interessantíssima é a ‘dança dos termos’ aqui encontrada: substitui-se o ‘devido controle editorial’ imposto aos órgãos de imprensa por um alegado impedimento de ‘censura prévia’, como se a livre realização de postagens nas redes sociais representasse verdadeiro pilar civilizatório em nossa sociedade, muito mais importante que a circulação livre de entrevistas ‘ao vivo’.

Avanços e retrocessos
De acordo com Silva, o Marco Civil da Internet tem pontos positivos e negativos com relação ao Direito do Consumidor. Ele aponta que algumas hipóteses de penalização dos provedores, elencadas no artigo 12 da lei, representam um avanço. Contudo, o professor avalia que houve um “grande retrocesso” na responsabilidade por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.

O civilista critica especialmente o dispositivo que só responsabiliza o provedor de aplicações de internet se desobedecer ordens judiciais (artigo 19 do texto). Para ele, era mais eficaz tese do STJ que considerava a omissão de empresas quando notificadas extrajudicialmente.

“A nova legislação piora muito a situação do consumidor, obrigando-o a enfrentar os trâmites judicias, que podem gerar prejuízos que se propagarão por considerável lapso temporal. Basta imaginar um cidadão comum, que levará algum tempo para constituir um advogado, cujo trabalho necessita de tempo razoável para ser executado, sem falar na morosidade do Poder Judiciário. Nessas situações, a vítima poderá sofrer o dano por muito tempo”, aponta Silva.

Além disso, ele ataca um “traço puritano injustificável” do legislador na elaboração do Marco Civil por prever a punição dos provedores que deixarem de excluir imagens ou vídeos de nudez ou sexo após terem sido notificados a fazê-lo, sem nada obrigar sobre a manutenção de ofensas graves à honra e à reputação de alguém. “Isso me parece tão grave quanto a publicação de imagens proibidas.”

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