Mudança de mentalidade

Com um ano, Lei Anticorrupção tem saldo positivo, mas traz incertezas

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29 de janeiro de 2015, 19h58

A Lei 12.846/2013, também chamada de Lei Anticorrupção, completa um ano nesta quinta-feira (29/1) e, apesar de dividir as opiniões dos especialistas, tem sido vista em geral como algo significativo, especialmente quando se considera os inúmeros casos de fraude e corrupção com os quais o Brasil precisou lidar em toda sua história. A norma leva em conta que, para mudar a mentalidade que criou chavões como “não há política sem corrupção”, “não se faz obra sem superfaturamento” e “não existe empresa sem caixa-dois”, é preciso transparência.

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De acordo com o advogado Giovanni Falcetta (foto), responsável pela área de compliance do Aidar SBZ Advogados, e que trabalha há oito anos especificamente nessa área, nunca se discutiu tanto as práticas de corrupção no país. Para a lei "pegar", explica, são preciso quatro passos: “Primeiro, que ela entre em vigor. Segundo, precisamos de um ato que tenha ocorrido. Terceiro, uma investigação sobre esse ato. Quarto, o resultado." Ou seja, uma lei desse tipo tem o seu tempo de maturação.

Para o especialista, a norma traz uma mudança no hábito brasileiro de reagir, em vez de prevenir. “O movimento que vimos no ano passado de empresas querendo se preparar foi muito grande. O que está acontecendo é que as companhias têm visto como os outros tiveram que reagir e se preparar para as medidas anticorrupção e agora pensam na prevenção", diz Falcetta, citando a operação "lava jato" como uma das lições que os empresários tiveram que aprender. 

Adriana Dantas, sócia da área de Ética Corporativa do Barbosa, Müssnich & Aragão, concorda: “A lei veio mesmo com o objetivo de impulsionar uma mudança de cultura de negócios no Brasil e, nesse sentido, ela é bem sucedida. Tivemos no passado empresas já se movimentando para montar uma área de compliance. Mas o número de companhias fazendo isso cresceu muito, especialmente depois da lava jato. É a prova de que vivemos uma nova conjuntura”, pontuou.

Já a criminalista e professora da Fundação Getulio Vargas Heloisa Estellita afirma que a lei, apesar de recente, precisa ser reformada. “Acho uma quebra seríssima do devido processo legal substancial a responsabilidade objetiva em matéria de aplicação de sanção por prática de ato ilícito."

Segundo ela, é possível ter graus diferente de exigência de culpa a depender da severidade da sanção: uma culpa mais estrita para a sanção penal, outra menos estrita para a sanção administrativa. No entanto, diz, "abrir mão de qualquer culpa é dizer que a sanção não tem finalidade alguma".

Além disso, ela aponta que as alterações necessárias à lei não podem ser feitas pela via da regulamentação, uma vez que estão estabelecidas na própria norma.

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À espera do decreto
Sobre a regulamentação, prometida pela Controladoria Geral da União, Heloísa (foto) diz que “causa estranheza que até agora não tenha sido emitida".

“Estamos à espera do decreto porque precisamos saber a forma como serão estabelecidos os atenuantes, por exemplo, como serão conduzidos os processos administrativos — o que também não está muito claro ainda —, a aplicação de multas e como será na esfera estadual, já que até agora foram poucos os estados que introduziram a regulamentação da lei. Esperamos a regulamentação para harmonizar essas pontos”, explica Adriana Dantas.

Poucas empresas prevenidas
De acordo com a pesquisa de Avaliação do Nível de Maturidade de Compliance, elaborada pela ICTS, empresa de consultoria, auditoria e serviços em gestão de riscos, entre setembro de 2014 e janeiro de 2015 com 231 empresas que mantém operações no Brasil, 61% das empresas ouvidas não mapearam seus riscos de exposição à Lei Anticorrupção e apenas 12% disseram ter um programa de compliance efetivo, ou seja, as empresas querem se prevenir, mas ainda estão no começo disso. De acordo com Fabio Haddad, gerente executivo da ICTS, a maior demanda por consultas parte das empresas que operam no setor de óleo e gás.

Ainda na pesquisa, 35% das companhias ouvidas disseram praticar o processo de due diligence, que é a avaliação de compliance de seus fornecedores e terceiros. Além disso, 41% das companhias estão sujeitas a outras legislações anticorrupção, como a Foreign Corrupt Practices Act  (FCPA) e a UK Bribery Act, mas apenas metade dessas já faz a due diligence de seus terceiros e 28% não possuem política anticorrupção.

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