Reflexões Trabalhistas

Sindicatos devem receber contribuição de todos os membros da categoria

Autor

  • Raimundo Simão de Melo

    é consultor Jurídico advogado procurador regional do Trabalho aposentado doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP professor titular do Centro Universitário do Distrito Federal-UDF/mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho e autor de livros jurídicos.

23 de janeiro de 2015, 11h35

Spacca
Os sindicatos são instituições sociais importantes num Estado Democrático de Direito e nas relações de trabalho e, para bem cumprir o seu papel, precisam de dinheiro para financiar as lutas e organizar os trabalhadores. Esse dinheiro deve sair do bolso de todos os membros da categoria, por meio de decisões legítimas e democráticas das assembleias.

Mas não é esse, até o momento, o entendimento consubstanciado no Precedente Normativo 119 do Tribunal Superior do Trabalho, que assim dispõe:

A Constituição da República, em seus artigos 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados.

Nunca defendi o PN 119 e, quando membro do Ministério Público do Trabalho, fui um dos protagonistas e defensores da Orientação 3 da Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical (Conalis), nos seguintes termos:

É possível a cobrança de contribuição assistencial/negocial dos trabalhadores, filiados ou não, aprovada em assembleia geral convocada para este fim, com ampla divulgação, garantida a participação de sócios e não sócios, realizada em local e horário que facilitem a presença dos trabalhadores, desde que assegurado o direito de oposição, manifestado perante o sindicato por qualquer meio eficaz de comunicação, observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, inclusive quanto ao prazo para o exercício da oposição e ao valor da contribuição.

A orientação do MPT, para o momento, foi ponderada e acertada, embora, pessoalmente sempre entendi que qualquer oposição às decisões tomadas nas assembleias sindicais, inclusive sobre o custeio sindical, deve ser apresentada nela, onde e quando se decide sobre os benefícios reivindicados para toda a categoria, como também a forma de custeio da campanha salarial e outras questões internas. Isso que é constitucional, porque é direito de todos, inclusive dos trabalhadores, reunirem-se pacificamente em assembleias para decidirem as questões que envolvam a categoria (Constituição Federal, artigos 5°, XVI e 7°, XXVI). Se as assembleias valem para aprovar as reivindicações e os acordos coletivos de trabalho e para autorizar os sindicatos a negociarem, por que só não valem para a aprovação do custeio sindical? Convenhamos, isso não tem  a menor lógica e não se sustenta juridicamente.

Desta forma, a contribuição assistencial é instituto que não contém eiva de inconstitucionalidade ou ilegalidade, ao contrário do que consta no PN 119 do TST, porque, ademais, é de se ressaltar que todas conquistas da decisão normativa ou da negociação coletiva beneficiam todos os integrantes da categoria profissional, não se configurando qualquer hostilidade ao princípio da legalidade ou da livre associação o estabelecimento da forma de custeio dos sindicatos por todos aqueles que pertencem às categorias.

A aplicação do aludido PN, ao contrário, demonstrou, na prática, o que muitos nunca quiserem aceitar, a sua inconstitucionalidade, porque ao contrário da assertiva de que cobrar referida taxa dos não sócios era uma forma de obrigá-los a serem sócios do sindicato, o que está acontecendo é que muitos trabalhadores estão dando baixa no sindicato porque são eles, na forma da orientação do PN 119, que têm que arcar com o sustento do sindicato e, os outros, não sócios, que não pagam nada, recebem os mesmos benefícios! Então, perguntam os trabalhadores filiados aos sindicatos: para que ser sócios, se todos recebem os mesmos direitos conquistados pelo sindicato sem nada pagar?

Por isso, em entrevista, o presidente do TST, ministro Antônio de Barros Levenhagen, defendeu que os sindicatos têm o direito de receber uma taxa do salário do trabalhador, mesmo que ele não seja filiado, para arcar com as despesas da entidade de classe, colocando em votação proposta de alteração do PN 119 e o cancelamento da Orientação Jurisprudencial 17 da Seção de Dissídios Coletivos, que tratam da contribuição para entidades sindicais. A proposta foi aceita por 12 votos contra 11. O Regimento Interno do TST, porém, exige, para a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula ou de precedente normativo, a aprovação da maioria absoluta, ou seja, 14 votos.

Como se vê, a maioria dos ministros responsáveis pela elaboração e reforma da jurisprudência do TST passou a entender que a orientação do PN 119, como está, não mais se sustenta no cenário jurídico-constitucional brasileiro, porque, como penso, ofende a Constituição Federal em vários dispositivos, especialmente o inciso I do artigo 8°, que veda a intervenção e interferência indevida do Estado na organização sindical, que é o que está acontecendo, quando o Estado não aceita as decisões soberanas das assembleias sindicais, ou as aceitam apenas em parte.

Espera-se que em breve a questão volte à apreciação pelo TST e que seja encontrada uma solução consensuada para a questão do custeio sindical entre o movimento sindical e o Estado brasileiro (Ministério Público do Trabalho e Justiça do Trabalho), pelo menos por ora, porque a questão precisa ser resolvida de forma definitiva por uma lei aprovada pelo Congresso Nacional.

Autores

  • Brave

    é consultor jurídico e advogado. Procurador Regional do Trabalho aposentado. Doutor e Mestre em Direito das relações sociais pela PUC/SP. Professor de Direito e de Processo do Trabalho. Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Autor de livros jurídicos, entre outros Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador.

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