Interesse público

Lei ordinária pode criar fundo para dinheiro de multas de trânsito

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20 de janeiro de 2015, 16h38

Leis ordinárias têm poder para criar um fundo de recolhimento de valores arrecadados através de multas de trânsito, bem como para estabelecer suas regras. Se tal lei não é respeitada, cabe ao Ministério Público Federal ajuizar Ação Civil Pública para que a cidade e a empresa de desenvolvimento urbano do município sejam obrigados seguir as regras.

Assim decidiu, por unanimidade, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao dar provimento a uma Ação Civil Pública do MPF, determinando que a Empresa de Desenvolvimento Urbano e Habitacional (Emdurb) de Marília (interior de São Paulo) e a prefeitura do município repassem, todos os meses, 5% dos valores arrecadados com as multas de trânsito aplicadas pelo cidade e pela Emdurb ao Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset). A decisão manda, ainda, que repassem no prazo de 90 dias os valores relativos às competências não transferidas ao Funset, devidamente corrigidas e com acréscimo de encargos legais.

O município de Marília havia apelado da decisão ao TRF-3 alegando a inconstitucionalidade do Funset, pois o fundo fora criado por lei ordinária e não por lei complementar, conforme dispõe o artigo 165, parágrafo 9º da Constituição Federal. O governo afirmou também que a Lei Municipal 4.453/98 determina a competência de multar e arrecadar à Emdurb, impossibilitando sua responsabilidade solidária na obrigação de fazer.

A Emdurb, por sua vez, alega a ilegitimidade ativa do MPF, por não existir, segundo a entidade, interesse público difuso que justifique a Ação Civil Pública; alegou, ainda, a inconstitucionalidade da Funset e questionou a revisão da multa aplicada em primeira instância.

A desembargadora federal Monica Nobre, relatora do acórdão, explicou que não se trata simplesmente de cobrar valores que não foram repassados ao Funset, mas de garantir programas de educação e segurança do trânsito. Trata-se de questão relativa à garantia de direitos fundamentais que pertencem a toda coletividade, inscritos nos artigos 5º e 6º da Constituição Federal.

Além disso, o Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 1º, parágrafo 2º, estabelece que "o trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito".

Leis e complementos
A desembargadora explicou ainda que o artigo 165, parágrafo 9º, II, da Constituição Federal, diz que à lei complementar cabe estabelecer as condições para a instituição e funcionamento dos fundos, a serem observadas na elaboração de lei ordinária que instituir o fundo e regular o seu funcionamento.

O dispositivo constitucional mostra, segundo Mônica, que compete à lei complementar "estabelecer normas de gestão financeira e patrimonial da administração direta e indireta bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos".

A exigência constitucional é que lei complementar estabeleça as condições para a criação de fundos e não a criação do fundo propriamente dito. Assim, “como não existe lei complementar que estabeleça as condições gerais para o funcionamento e financiamento de fundos públicos, nada obsta que lei ordinária crie novos fundos públicos desde que obedeça a legislação em vigor”.

Neste sentido, tratando-se da defesa de direitos que pertencem a toda coletividade, a decisão da 4ª Turma coloca que está clara a legitimidade ativa ad causam do MPF.

A decisão coloca ainda que a execução de determinada atividade ou serviço público pelo agente delegado deve se dar conforme as normas do Estado e sob a permanente fiscalização do Poder Delegante. Logo, a responsabilidade do município de Marília, neste caso, é solidária. Com informações da assessoria de imprensa do TRF-3.

Apelação Cível 0004680-04.2003.4.03.6111

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